sexta-feira, abril 16, 2010

RUY CASTRO

Caça aos votos

Ruy Castro 
Folha de S. Paulo - 16/04/2010
 
RIO DE JANEIRO - Virgem em pelejas eleitorais -nunca disputou sequer o cargo de monitora da sua turma de bandeirantes- e já candidata à Presidência, Dilma Rousseff precisará se adaptar depressa aos rituais de campanha, os quais costumam exigir muita paciência, grande resistência física e mental e nervos e estômago de aço.
Em suas excursões à caça de votos nos mais remotos burgos, da Cisplatina ao Guaporé, Dilma terá de enfrentar a culinária local com a mesma bravura com que dispara contra seus desafetos políticos. Isso implicará almoçar cerca de cinco vezes por dia, em todas limpando o prato e estalando a língua, para não fazer uma desfeita aos caciques políticos desses arraiais.
Não são simples almoços, mas banquetes, e nenhuma das refeições é exatamente light. Nas profundas do Brasil, as pessoas ainda não foram picadas pela "mauvaise conscience" alimentar e se atiram com gosto ao sal, às banhas e às entranhas -em certas regiões, buchada de bode é comida para convalescentes. Donde Dilma já pode ir preparando o antiácido, a balança e a contagem do colesterol.
Dilma terá de se habituar a apertar as mãos encharcadas do povo brasileiro (sem enxugar as suas nem mesmo em discretos lencinhos) e a beijar bebês de nariz escorrendo (beijar o bebê de Madonna foi fácil) e sujeitar-se a repentinos esguichos (nem todos os bebês brasileiros vêm equipados com fraldas). E submeter-se a abraços um pouco mais sôfregos por parte de cabos eleitorais dispostos a posar de íntimos para seus eleitores.
Mais que tudo, Dilma terá de demonstrar sincero interesse pelo que os próceres de cada curral lhe disserem -cada um tem seus problemas, e cada curral, suas exigências. Enfim, terá de aprender uma ciência e arte que ainda não domina: a de ouvir em vez de só falar.

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