Lula, dono do Brasil. Qual Brasil? Elio Gaspari O Globo - 14/04/2010 O Lançamento da candidatura de José Serra com uma proposta de superação das divisões políticas nacionais, porque "o Brasil não tem dono" e "pode mais", obriga o comissariado petista a refletir sobre sua plataforma eleitoral. A ideia de uma campanha que contrapõe Lula a Fernando Henrique Cardoso pode ser boa, mas falta combinar com os russos. Os tucanos chegaram com outro jogo. Melhor assim, pois fazer de 2010 um videoteipe de 2002 seria no mínimo uma discussão pouco inteligente. Serra propõe a unidade do país e terá os próximos meses para botar substância nessa proposta. Por enquanto, dispõe da colaboração de Nosso Guia, com suas declarações desrespeitosas ao Poder Judiciário e ao aparelho de fiscalização do Estado. Mais: Lula comporta-se como dono do país quando se mostra confortável na condição de padrinho, animador e empresário de Dilma Rousseff. Lula diz que "não podemos ficar subordinados, a cada eleição, ao juiz que diz o que a gente pode ou não fazer". Tudo bem, vamos ficar subordinados a quem? Nosso Guia defende a mudança da legislação eleitoral, por meio de uma reforma política. Qual? Não diz. Por duas vezes o PT (com socorro do tucanato) tentou aprovar uma reforma que não mexia nas limitações da propaganda eleitoral. Deram prioridade ao voto de lista, que fortalece os aparelhos partidários e confisca dos cidadãos o direito de votar nominalmente em seus candidatos à Câmara dos Deputados. Sente-se na campanha petista um certo desconforto com as instituições. Multado pela Justiça Eleitoral, o Grande Mestre deu-se a gracinhas que levariam à cadeia um motorista que debochasse do guarda de trânsito. A ideia de mais um mandato petista para permitir que o comissariado imponha uma mudança de qualidade às instituições republicanas será divisiva, estimulará radicalismos minoritários e, na melhor das hipóteses, obrigará o PT a escrever uma nova "Carta aos Brasileiros". Nela, pedirá aos eleitores de 2010 que esqueçam suas extravagâncias políticas, assim como em 2002 pediu perdão por suas extravagâncias econômicas. As campanhas eleitorais moldam os candidatos e Dilma Rousseff ainda não se adaptou ao contraditório do cotidiano da contenda. Disse que "nunca abandonei o barco" e, quando foi confrontada com a impropriedade da soberba, acrescentou que só "a má-fé" poderia levar à conclusão de que se referia aos exilados da ditadura, como Serra. Não quis pagar o preço da insinuação e dobrou a aposta, insultando quem a cobrou. Nesse ritmo, perde o controle do verbo em questão de meses. Em política, um candidato tem que dizer quem é. Se não o fizer, será aquilo que os adversários querem que seja. Serra deu uma vaga ideia do que pretende ser. Dilma, nem isso. Erro Estava errada a informação aqui publicada há uma semana, segundo a qual as memórias do escravo Mahommah Baquaqua, que em 1847 fugiu de um navio brasileiro no porto de Nova York, nunca foram editadas no Brasil. Eduardo Coelho, do Arquivo-Museu da Literatura Brasileira da Casa de Rui Barbosa, corrige: elas já foram editadas na Revista Brasileira de História, com apresentação da professora Silvia Hunold Lara e tradução de Sonia Nussenzweig. O texto está disponível, como apêndice, no livro "Questão de Pele", de 2009. |
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