terça-feira, fevereiro 09, 2010

CELSO MING

Chega pra lá


O Estado de S. Paulo - 09/02/2010

Ontem, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Tim Geithner, desautorizou uma das mais importantes agências de classificação de risco, a Moody"s, ao afirmar, em entrevista à rede de TV norte-americana ABC, que jamais os títulos de dívida do Tesouro do país (T-bonds, também conhecidos por treasuries) perderão o rating AAA (cotação máxima).

Até aí já havia rolado uma longa história. Quinta-feira, em relatório, a Moody"s avisou que os T-bonds corriam o risco de serem desclassificados em consequência da forte deterioração fiscal dos Estados Unidos.

A Moody"s é uma dessas agências que se encarregam de examinar a qualidade de um título. Seu objetivo é avaliar as condições que tem uma dívida de ser paga pelo devedor no dia do vencimento, de acordo com os termos de contrato.

É perfeitamente compreensível que a mais importante condição que um devedor tem de honrar seus compromissos de dívida seja a saúde de suas finanças. No caso de um país, essa condição é determinada pela robustez fiscal. De acordo com a Moody"s, a relação entre a dívida do Tesouro norte-americano e a receita do governo federal recuará de 429% no ano fiscal de 2010 para 394% em 2020, nível excessivamente elevado que não dá mostras de melhora confiável.

As principais agências de classificação de risco, entre as quais está a Moody"s, têm sido fortemente criticadas por graves vícios de procedimento e por uma série de avaliações desastrosas.

O vício de procedimento é o de que as avaliações dessas agências são pagas por quem as encomenda, ou seja, os próprios interessados na qualidade dos títulos. As coisas são assim desde que esse serviço começou a ser feito e não se vê nenhuma iniciativa para mudá-las.

As avaliações desastrosas ficaram escancaradas a partir de setembro de 2008, quando as autoridades e os próprios bancos passaram a dar tratamento de ativos podres a títulos de dívida cuja excelência havia sido reconhecida até dias antes por essas agências.

Quando vem a público e afirma com todas as letras que o rating dos T-bonds, títulos que o mercado considera como referência (benchmark), pode ser rebaixado por causa das dúvidas sobre a capacidade de solvência dos Estados Unidos, a Moody"s parece empenhada em recuperar a credibilidade que ficou abalada. Rebaixar o T-bond significa reconhecer que centenas de outros títulos públicos e privados, como os da dívida da Alemanha, da Suíça, do Canadá ou da Microsoft (cuja confiança não foi até agora questionada), podem ter qualidade melhor do que a atual referência global.

Mas, se o secretário do Tesouro norte-americano avisa que o alerta da Moody"s é descabido e que jamais os treasuries perderão o selo AAA, mais uma vez as avaliações da Moody"s são duramente questionadas.

E Geithner não deixa de ter a lógica a seu lado porque, apesar da dívida gigantesca e do rombo orçamentário colossal, os Estados Unidos detêm a prerrogativa de emitir a quase única moeda internacional de reserva.

Quer dizer, se houver uma rejeição dos treasuries pelos credores, em última instância os Estados Unidos os resgatarão com emissão de dólares.


Confira

Não se metam - Os representantes de países da União Europeia dentro do G-7 rejeitaram os financiamentos e as regras do Fundo Monetário Internacional (FMI) para resolver o problema da Grécia.

O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäeuble, foi claro: "Esse não é assunto para o FMI."

É uma atitude que parece demonstrar que uma solução está a caminho do interior da União Europeia - apesar das proibições de transferência interna de recursos determinadas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). Falta saber o que virá agora.

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