RIO DE JANEIRO - Uma cervejaria vai patrocinar o Carnaval carioca de rua deste ano. Na prática, isso consiste em fornecer 4.000 banheiros químicos para os 641 desfiles de 465 blocos já autorizados pela prefeitura, reunindo 2,5 milhões de foliões. Significa um banheiro para cada 622 pessoas. Vai depender do grau do aperto de cada uma.
Mesmo assim, já não era sem tempo. Como as cervejarias são as produtoras da matéria-prima, não era justo que se fartassem à gorda e deixassem para a cidade a absorção do resíduo, os milhões de litros despejados a céu aberto, em canteiros, paredes e pneus. A cervejaria não faz mais que sua obrigação ao reabsorver esses resíduos e promover uma vasta campanha exortando o povo a usar os banheiros.
O patrocinador deverá ainda ajudar a operar o trânsito e monitorar os desfiles com 60 ambulâncias UTI equipadas com médicos e enfermeiros. Também justo, já que 90% dos atendidos por essas ambulâncias serão pessoas intoxicadas pelo produto do patrocinador.
A ideia de um patrocínio particular precisou vencer forte resistência dos blocos. Desde sua introdução pelos portugueses, em 1641, o Carnaval de rua do Rio nunca mudou certas características: não cobra ingresso dos participantes, não exige que comprem mortalhas para distingui-los dos sem mortalha, não os segrega em cercados de corda e dispensa os grandes nomes da música para produzir a animação -são os próprios foliões que a produzem, com seus sambas e marchas. Um patrocinador poderia tentar minar essa espontaneidade.
Por outro lado, o excesso de informalidade, a perdurar por mais tempo, acabaria tornando a folia inviável. A cidade não sobreviveria aos novos blocos que, a cada Carnaval, se formavam às dezenas, estrangulavam o trânsito e a irrigavam sem compaixão.
sábado, janeiro 23, 2010
RUY CASTRO
Ordem na folia
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/01/10
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