quinta-feira, janeiro 21, 2010

REGINA ALVAREZ

Caminho sem volta

O GLOBO - 21/01/10


A crise em curso na Argentina, com a presidente Cristina Kirchner em queda-de-braço com o presidente do Banco Central, permite um paralelo com o Brasil, já que o tema autonomia do BC, pelo que tudo indica, vai entrar no debate eleitoral. Na Argentina, a independência do BC está na lei, mas a postura do casal K inviabilizou, na prática, a permanência de Martín Redrado no cargo

Depois de demiti-lo por decreto e ser desautorizada pela Justiça, Cristina recuou e decidiu pedir ao Congresso autorização para despachá-lo. A oposição se mobiliza para mantê-lo no cargo. A Justiça ainda dará um veredito final sobre o conflito, mas sem apoio do governo e de sua própria equipe é improvável que Redrado consiga concluir o mandato. Ainda faltam oito meses.

No Brasil, temos uma situação oposta. A autonomia do BC é apenas operacional, mas funciona. Ao longo dos últimos anos, a instituição agiu com independência, ganhou credibilidade e conquistou a confiança dos mercados e da sociedade.

O economista Fábio Giambiagi — que é descendente de argentinos e acompanha de perto a crise do nosso vizinho — diz que reviu um pouco os seus conceitos sobre a autonomia do BC à luz do que acontece na Argentina.

— O problema é cultural.

A autonomia formal tem que chegar quando não é mais necessária, pois depende menos da lei e mais de uma relação madura entre os vários agentes — afirma Giambiagi.

O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega tem visão semelhante.

— As experiências mostram que a autonomia do BC só funciona quando há o amadurecimento das lideranças políticas — diz.

Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, pensa um pouco diferente. Acha que a lei é importante, desde que seja cumprida. E que na Argentina a autonomia garantida em lei colocou em pauta uma discussão que não ocorreria de outra forma, o uso das reservas para cobrir um rombo fiscal.

Luis Otávio Leal, economistachefe do Banco ABC Brasil, considera que o episódio argentino ressalta a importância da independência legal de um Banco Central.

Mas todos concordam que, no Brasil, o BC está num estágio à frente e caminha para a autonomia de direito, mesmo que isso não aconteça no curto prazo.

— O BC independente é um processo, não é um modernismo adotado pelos países mais desenvolvidos — observa Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC.

O resultado das eleições pode mudar essa trajetória? Os analistas acreditam que não.

— Os candidatos sabem da importância da estabilidade e que o Banco Central gerou este controle das expectativas — destaca o ex-diretor do BC.

É certo que esse tema deve ser usado no calor da campanha. Esta semana, o noticiário já mostrou um pouco do clima neste sentido e daqui para frente o vale-tudo só tende a piorar.

Mas o mercado parece não se preocupar muito com essa guerra de declarações.

Nada indica que haverá um retrocesso. O avanço que conquistamos nessa área é um caminho sem volta

Na real

Os números da arrecadação de 2009, que serão divulgados hoje, mostram que em dezembro as receitas ficaram muito aquém do desempenho de novembro, turbinado pelos depósitos judiciais. Pelos registros do sistema Angela, usado pela Receita e que o Congresso tem acesso, a arrecadação tributária federal, excluída a Previdência, cresceu apenas 1,3%, em termos reais, entre dezembro de 2008 e de 2009. Em novembro, a variação fora de 19%. Entre novembro e dezembro de 2009, a receita caiu 10,3%, já descontada a inflação. O sistema Angela tem uma variação em torno de 1,5% em relação aos números oficiais da arrecadação, por questão de metodologia

Falta trilho

A Associação dos Transportadores Ferroviários (ANTF) prevê recorde no volume de cargas transportadas em 2010: mais de 500 milhões de toneladas. A retomada do crescimento econômico vai aumentar principalmente o transporte de minério de ferro, soja e açúcar.

Apesar do recorde, a malha ferroviária do país permanece curta, de acordo com o diretor-executivo da ANTF, Rodrigo Vilaça, com 29 mil quilômetros de extensão: — Nossa economia demanda uma malha de 52 mil quilômetros de trilhos. A estimativa do governo é chegar a 40 mil só em 2020.

Para se ter uma ideia de como o aumento é pequeno para 10 anos, a China cresce suas ferrovias num ritmo de 10 mil quilômetros anuais. O país já possui a segunda maior malha do mundo, com 86 mil quilômetros, atrás dos EUA, com 282 mil.

ONDA VERDE: O CEO’S Family Workshop neutralizará as emissões de CO2 do evento com o plantio de árvores. O encontro reunirá 200 executivos e suas famílias em Mogi da Cruzes (SP), no próximo fim de semana

COM ALVARO GRIBEL

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