sábado, janeiro 30, 2010

NAS ENTRELINHAS

A onda de Dilma

Denise Rothenburg

CORREIO BRAZILIENSE

Numa regra de três simples, Lula está para Dilma como José Dirceu esteve para Lula em 2002. Será o estrategista e o coordenador da campanha


A ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, começa a se sentir mais à vontade no papel de pré-candidata do PT à sucessão de Lula. E essa mudança de comportamento não se deu apenas em relação às declarações e ao discurso de ontem, durante a inauguração de um gasoduto em Jacutinga, no extremo sul de Minas Gerais. Depois do evento, em entrevista, ela soltou a voz: disse que se “gostaria muito” de ser escolhida como a sucessora de Lula. Até aqui, Dilma sempre dizia que era cedo para tratar de eleição.

O fato de Dilma ter falado abertamente da sua vontade de suceder Lula só veio reforçar o que ela tem feito ao longo dos últimos dias. Quando não está em viagem ao lado do presidente Lula, a ministra já passa boa parte do tempo cuidando da transição de sua equipe na Casa Civil para o grupo de campanha. Uma das maiores preocupações é de que os serviços de acompanhamento dos programas do atual governo não sejam interrompidos quando parte de seus assessores deixarem seus postos para integrar o staff de campanha.

Já está certo que ela irá levar Giles Carniconde Azevedo, o secretário-executivo adjunto da Casa Civil. Ele ficou no comando quando Dilma estava de férias no final do ano passado. Agora, irá para compor o grupo de campanha que cuidará do projeto de governo. As questões administrativas da Casa Civil estão cada vez mais nas mãos da secretária-executiva, Erenice Guerra, advogada que acompanha Dilma desde os tempos do Ministério de Minas e Energia e tem toda a memória dos trabalhos da Casa Civil.

Quanto à equipe de campanha, a intenção dos petistas hoje é dispensar um comando político amplo na equipe que ficará com a ministra, o que foge à regra das campanhas presidenciais anteriores do PT, sempre repleta de partidários e aliados no primeiro plano. Dilma contará com a presença do deputado Antonio Palocci (PT-SP) e do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, pelo menos uma vez por semana, quando não estiverem cuidando das campanhas em seus respectivos estados. E, é claro, a do presidente do PT, José Eduardo Dutra.

A tarefa de coordenação será exercida basicamente pelo presidente Lula, que hoje já cumpre esse papel. Numa regra de três simples, Lula está para Dilma como José Dirceu esteve para Lula em 2002. Será o estrategista e o coordenador da campanha. Dirceu, em 2002, foi o responsável por vários acordos eleitorais que fizeram o PT ampliar o seu espectro da esquerda e vencer a eleição. É o que Lula tentará fazer com a sua ministra.

Os petistas citam João Santana como “consolidado e sacramentado” na posição de número um do marketing. Ele fez a campanha que garantiu a reeleição do presidente Lula e, desde o ano passado, grava todos os programas pilotos com a ministra. Duda Mendonça — apesar dos encontros com a candidata no mês passado, envio de material para análise e até mesmo a torcida de alguns — está fora desse páreo.

Já estão definidos até mesmo os ministros de Lula que farão a ponte entre governo e a candidata. São eles: Franklin Martins, da Comunicação; Alexandre Padilha, de Relações Institucionais e, ainda, o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho. Os três, aliás, participam inclusive de quase todas as conversas do comando informal da pré-campanha.

A turma do governo encerra esse período pré-carnavalesco tão animada que arrisca até mesmo apostar que, mais na frente, no final de março, Ciro Gomes deixará de ser candidato a presidente da República para ingressar na nau petista que tentará conquistar mais quatro anos no comando do Planalto. Até porque Lula não quer saber de dois candidatos do governo e o nome escolhido foi Dilma. Se Ciro quiser insistir terá que ser por um viés oposicionista e isso, pelo cenário de hoje, ele não fará. Até porque o PSB tem um portifólio de candidatos a governador que esperam contar com o apoio do PT.

A aposta é sinal de que o partido irá cada vez mais pressionar Lula para que tire o oxigênio de Ciro, de forma a encorpar a candidatura da ministra. Não será surpresa se, quando o presidente estiver de volta na segunda-feira, houver apelos do PT para que ele chame o PTB e o PP para uma conversa do tipo olho no olho em relação à candidata do Planalto.

Afinal, por mais que Dilma esteja mais à vontade e aplicada no sentido de mesclar um futuro projeto de governo num discurso de energia — ela ontem, em Jacutinga, falou do PAC-2 e de enchentes — ainda é Lula quem faz os contatos políticos. Enquanto Dilma não substituir de vez o terninho de ministra pela roupa mais leve de candidata, o presidente é quem tem a popularidade — que é o que costuma atrair aliados — para aproximar os partidos da campanha. Está sendo assim com o PMDB, com o PSB. Foi assim também com o PDT. O almoço só ocorreu depois que já estava tudo certo e sacramentado pelo presidente Lula. E assim será até que o jeito mais à vontade que Dilma demonstrou ontem em Jacutinga — e tem demonstrado em encontros mais reservados — seja parte do dia a dia da candidata. Por isso, neste período, embora ela esteja bem mais solta do que há um ano, não dá para Lula descuidar da pressão.

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