quinta-feira, janeiro 07, 2010

MÍRIAM LEITÃO

Sinal de cautela

O GLOBO - 07/01/10


A produção industrial trouxe uma notícia ruim e algumas boas. Caiu a produção de novembro em relação a outubro em 0,2%, quando todo o mercado previa alta de 1%. Mas o que caiu foi o setor de bens de consumo e o que cresceu foi o setor de bens de capital, mostrando um consumo menos aquecido e um investimento maior em ampliação da capacidade.

É o país se preparando para crescer.

Ninguém esperava queda da produção industrial em novembro, principalmente porque mesmo num contexto de crise o indicador cresceu nos dez meses anteriores a novembro, nessa comparação com o mês anterior.

Mas todo mundo esperava que na comparação com o mesmo mês do ano anterior fosse haver alta. E houve mesmo, de 5,1%. Em novembro de 2008 a economia se desfazia atingida de frente pelo colapso do crédito que houve no mundo inteiro após a quebra do Lehman Brothers. Portanto, a alta é até natural porque está sendo comparada com um dado baixo. É mais fácil subir quando a comparação é com uma base fraca, mas é fato para comemorar que, depois de doze meses de queda nessa comparação anual, novembro tenha dado um número positivo.

A queda de novembro na comparação com outubro é considerada uma acomodação pelo economista da Coordenação de Indústria do IBGE, André Macedo.

Caiu puxado por bens de consumo duráveis, que haviam subido forte nos últimos meses, e que só em outubro tiveram alta de 6,3%. A produção de veículos automotores foi um dos fatores de queda. Caiu 2,2% em novembro, mas havia crescido 107,6% nos dez meses anteriores.

— Depois de tantas altas é normal que aconteça uma acomodação. O crescimento foi muito forte e em algum momento o empresário espera para ver o que vai acontecer — explicou.

Por outro lado, houve uma forte aceleração dos bens de capital nos últimos meses: 5,1% em setembro, 4,8% em outubro e 6,1% agora em novembro. Isso mostra investimento em aumento de capacidade, ainda que a produção de máquinas e equipamentos esteja 11,4% menor do que em setembro de 2008, um pouco antes de tudo despencar.

Ninguém olhou esse dado de novembro como sinal de que está havendo uma reversão na tendência de crescimento. Todos sabem que o PIB vai subir em 2010, que haverá maior atividade econômica, maior produção.

Um dos medos é o de essa retomada levar a um aumento da inflação. Por isso, a queda da produção na área de bens de consumo duráveis foi lida como um sinal de que a economia não está indo para um nível de aquecimento que pressione a inflação nos primeiros meses.

Como, além disso, o que está subindo é a produção de máquinas e equipamentos, a conclusão é que haverá mais capacidade instalada para atender ao aumento da demanda esperado para este ano. Os analistas concluíram, então, que estavam exageradas as previsões de que os juros poderiam subir no começo do ano para deter a inflação. E por isso os juros futuros caíram ontem.

Esses números assim meio negativos, meio positivos da produção industrial são um retrato de uma economia que sai de um período muito ruim para a recuperação.

A queda que está ficando para trás não foi um passeio, lembra o economista Regis Bonelli, pesquisador sênior do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ele lembra que o PIB brasileiro crescia a 6% antes da crise e que os dados vão mostrar que 2009 terminou com crescimento zero. Isso significa que o Brasil deixou de adicionar algo como R$ 180 bilhões ao seu PIB. Esse é o tamanho da queda.

— É uma parte do custo da marolinha — diz Regis.

Com os indicadores do final do ano sendo divulgados já é possível fazer uma análise mais completa do que aconteceu com o país no período de crise. A indústria sem dúvida foi o setor mais atingido. Olhando para o mercado de trabalho, o que se vê foi uma mudança de tendência: — A expectativa que se tinha para 2009 era por uma continuação de melhora no mercado de trabalho, como houve em 2008. Mas isso não aconteceu. Embora não dê para dizer que foi um ano ruim, ele não melhorou em relação ao ano anterior. Parou de melhorar — explicou Cimar Azeredo, gerente da Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE.

Os números mostram isso.

De 2007 para 2008 a taxa de desocupação no país caiu 1,4 ponto percentual, de 9,3% para 7,9%. O IBGE só tem os dados de 2009 até novembro, mas se acontecer nesse ano o mesmo que aconteceu em dezembro de 2008, a taxa de desocupação fechará em 8,1%. Ou seja, em vez de melhorar, vai piorar 0,2 ponto percentual.

Em 2010, é natural que haja uma melhora no mercado de trabalho, ainda que no começo do ano sazonalmente o índice de desemprego piore. Há ainda o risco de que o otimismo eleve mais o desemprego. Como o que se mede é o percentual de pessoas procurando trabalho que não encontram, a esperança de retomada do crescimento pode levar mais pessoas de volta ao mercado. Isso já aconteceu em outros momentos de crescimento. Quem estava desanimado e nem procurava emprego estava fora da estatística. Aí, a pessoa se anima com as boas novas e volta a procurar emprego, e assim entra na estatística.

Bonelli acha que a economia brasileira vai crescer 5,6% este ano e que 2,2% será efeito estatístico da comparação com um ano muito fraco.

Mas ele acha que, apesar de crescer, o país continua com vários problemas. Ele define como “pouco justificados” os movimentos excessivamente otimistas da Bolsa de Valores. Por isso, vê o dado da produção industrial como um sinal de que se deve ter cautela. Em momento de transição, cautela é um bom conselho.

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