terça-feira, dezembro 01, 2009

LUIZ GARCIA

O que amputar

O GLOBO - 01/12/09

Para o pessoal da arquibancada, torcer é muito fácil quando, lá no campo, o bem enfrenta o mal, cada time usando camisas bem diferentes. Mas raramente a realidade tem essa nitidez.

Neste Brasil que estamos vivendo no momento, é fato que Lula e o seu PT avançam sobre as benesses do poder como pobre em prato de comida (que os pobres me perdoem pela imagem politicamente incorreta, mas, convenhamos, ela define a força do apetite). Mas também é verdade que esse anseio pelo poder é ignorado pela maioria da opinião pública.

Tudo parece ser diferente quando aparecem provas de que na turma da oposição há comportamentos em nada diferentes daquilo que se denunciou em relação à turma do governo, no caso do mensalão.

Como acaba de acontecer com o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, do DEM. Trata-se de personagem de média importância no partido. De sua carreira política — para se fazer uma ideia — o episódio mais notável até agora era aquele em que ele e o senador Antonio Carlos Magalhães invadiram o registro de votações do Senado, meio de brincadeirinha, para saber quem tinha votado a favor ou contra a cassação do senador Luís Estevão.

Cometeram infração grave, que lhes custou o mandato. Na época, a opinião pública não teve reação indignada: afinal, o delito era principalmente tolo. Ninguém viu no episódio uma perigosa demonstração de onipotência. Não se percebeu que a dupla tinha mostrado acreditar que as normas institucionais eram para os outros, não para pessoas especiais como eles.

Ambos logo voltaram para o Senado.

O primeiro já descansa e Arruda governa o Distrito Federal. Ou seja, o partido considerou que a cassação de seu mandato de senador tinha sido castigo suficiente. Pelo visto — literalmente, pelo visto e ouvido em gravações da Polícia Federal — não foi.

Está provado, em som e imagens, que ele comandou um esquema de arrecadação de dinheiro com empresas que prestavam serviços ao governo. O dinheiro ia para ele mesmo e para deputados aliados.

É um novo mensalão. Com notável diferença: no mensalão original, o PT e seus aliados fizeram o possível para fingir que ele não existia; quando isso se tornou impossível, os mensaleiros diretamente implicados no escândalo foram simplesmente mandados para casa. No caso de Arruda, o seu partido, o DEM, fala em se livrar dele. Como disse um de seus dirigentes, “num processo infeccioso, é melhor amputar uma perna para evitar a contaminação de todo o corpo”.

É melhor mesmo. Talvez o PT não pudesse fazer algo parecido porque, no seu caso, talvez, quem sabe, tivesse sido necessário amputar a cabeça ou algo parecido.

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