quinta-feira, dezembro 31, 2009

LUIS FERNANDO VERISSIMO

O futuro do GPS

O GLOBO - 31/12/09


Ainda não me refiz da primeira vez que vi um GPS funcionando. GPS, já sabia todo o mundo menos eu, quer dizer Sistema de Posicionamento Global, em inglês. É um aparelho que mostra onde estamos numa telinha e diz como chegar onde queremos ir. Diz, literalmente. O danado do aparelho não apenas fala como é poliglota: você pode escolher a língua com a qual será guiado. Durante a Copa do Mundo na Alemanha, que foi quando conheci o engenho mágico, éramos orientados por uma simpática portuguesa que não nos deixava confundir ingang com aufgang, chamava rotatória de “rotunda” e nunca nos falhou. Nem comecei a tentar compreender como a visão de um satélite estacionado sobre nossas cabeças chegava no carro e se transformava em voz com sotaque português. Eu ainda não sei bem como funciona grampeador.
Mas posso imaginar como será o futuro do GPS. É provável que um dia ele assuma o volante e dispense o motorista, eliminando uma etapa no processo de dar direções e só usando sua voz para gritar com as crianças no banco de trás. E não é impossível que, com o tempo, surja uma espécie de GPS moral, um sistema de orientação não para veículos mas para gente, que mostre o caminho a ser seguido, os desvios éticos a serem evitados e a melhor saída para qualquer “rotunda” de incertezas que possa nos comprometer. O aparelho não seria maior do que um celular que cada um carregaria no bolso ou na bolsa.
Porque a verdade é que todos os nossos antigos sistemas de orientação – o religioso, o familiar, o jurídico, o filosófico – falharam, somos uma geração à deriva, sem giroscópio. Com o aperfeiçoamento do GPS seríamos guiados por uma entidade superior que tudo vê e tudo sabe, um satélite estacionário sem nenhuma dúvida sobre o que é certo e o que é errado e o que nos convém. Bastaria levar o aparelho ao ouvido e escutar
seus conselhos. Na voz que escolheríamos.
VOTO
(Da série “Poesia numa
hora dessas?!”)

Só pra fugir
do clichê:
liz novo
ano fe!

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