domingo, novembro 29, 2009

ELIO GASPARI

De ernesto.geisel@edu para lula@gov

FOLHA DE SÃO PAULO - 29/11/09


Defenda o Estado da ação dos sacripantas das privatizações, crie a e statal da banda larga


SENHOR PRESIDENTE,
Antes de mais nada, agradeço seus gentis comentários sobre meu governo e faço-lhe uma revelação: em 1994 votei no senhor. Há por aí pelo menos uma pessoa a quem eu contei isso.
Escrevo-lhe para pedir que enfrente as operadoras de telefonia nessa história da banda larga da internet. Crie uma estatal, não se intimide. Informe a todos os sacripantas das privatizações que cabe ao presidente da República a defesa dos interesses do Estado. O seu cargo é estatal. Seu antecessor privatizou-o e, pelo que me contou o Tancredo Neves (que não gosta dele), carrega índices constrangedores de rejeição popular.
A rede de banda larga do Estado de São Paulo tem mais conexões que o Norte, Nordeste e Centro-Oeste somados. Algo de errado está acontecendo. Os empresários preferem trabalhar no mercado paulista, onde está o dinheiro, desprezando as regiões mais pobres. Não podemos condená-los, mas daí a fazermos o que lhes convém, vai distância enorme.
Durante o governo do marechal Castello Branco eu coordenava a política de telecomunicações do país e queria que esse serviço ficasse sob o guante de uma empresa estatal. O Roberto Campos era ministro do Planejamento e queria privatizar tudo. O Castello não quis discutir a venda da Petrobras, mas disse que gostaria de ver as telecomunicações nas mãos da iniciativa privada. Pediu ao Campos que atraísse capitais para o negócio. Como eram ingênuos...
O Campos foi ao mercado e aprendeu que a plutocracia só se interessaria se a viúva do Duque de Caxias entrasse com os capitais. Eu só consegui estatizar as telecomunicações porque tive a ajuda de um empresariado que defendia um mercado no qual a iniciativa é privada, mas os recursos são públicos, de preferência do BNDES.
Presidente, fuja do monopólio, mas crie um competidor estatal para a banda larga. Se ficarmos na parolagem privatista, voltaremos ao tempo da minha juventude, quando vendia-se manteiga europeia nos armazéns de Bento Gonçalves. Não digam que isso é conversa de velho. Aos 80 anos eu vi os supermercados de Ipanema vendendo verduras belgas.
Respeitosamente,
Ernesto Geisel

PSTU/PSOL (1)
Quem avisa amigo é: tudo indica que o ano letivo de 2010 começará com a armação de uma greve na Universidade de São Paulo.
O movimento terá duas agendas. Numa, reivindicará salários. Na outra, procurará atrair a tropa de choque da Polícia Militar para o campus da USP.
Se vier só a PM, tudo bem para o comissariado grevista.
É forte a influência do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) e do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) junto a uma parcela dos estudantes da USP. Sobretudo nas escolas das Humanas.

PSTU/PSOL (2)
Os estudantes da UFRGS deram uma aula aos onipotentes comissários dos partidos de esquerda na eleição do DCE da universidade.
Juntos, o PSOL e o PSTU teriam perto de 2.500 votos, mas cada um correu com sua chapa. Resultado: perderam para um grupo que se intitula antiesquerdista e conseguiu 1.559 votos. (A chapa do PSOL teve 1.524 votos e a do PSTU, 1057.)

DE UM SÁBIO:
"Lula precisa tomar cuidado com sua tática do Eu x Fernando Henrique. Ninguém votará em Dilma Rousseff porque Lula é melhor que FHC. A certa altura, o eleitor quererá saber quem é ela".

GRANDE BEN
Pérola atirada pelo presidente do Fed, Ben Bernanke, durante uma das rodas de fogo da quebradeira de 2008:
"Não há ateu em trincheira, nem ideologia em crise financeira".

ADVOGADOS DO CAPETA
Pelas suas virtudes, a Diretoria Jurídica do Banco do Brasil está debaixo de chumbo. Rompendo a tradição, ela começou a auditar os processos em que o banco perdeu causas com valores superiores a R$ 200 mil. Foi como se descesse a um porão.
Numa amostra de 40 processos que envolviam empresas, a auditoria revelou que em oito ocasiões o banco foi mal defendido. Coisas assim:
Num caso o BB cobrou R$ 8 milhões de uma companhia que nada devia. Seus advogados perderam o prazo para se explicar e o banco teve que pagar R$ 1,2 milhão de honorários ao escritório que defendeu a empresa. (Esse tipo de erro aconteceu em pelo menos duas outras ocasiões.)
Noutro processo, o banco estava num litígio de R$ 500 mil que dependia de uma perícia. Os quesitos apresentados pelo BB foram impugnados pela outra parte e o juiz os indeferiu. O banco não recorreu, o caso seguiu seu curso e a sonolência acabou custando R$ 35 milhões.

EREMILDO, O LULÓLOGO
Eremildo é um idiota dedicado à Lulologia, ou a busca da luz pelo estudo da vida de Nosso Guia. Ao saber que Lulinha foi para Brasília num Boeing da Presidência, acompanhado por 15 convidados, o lulólogo captou um sinal, vindo da biografia do "Filho do Brasil".
Se os convidados pagassem suas passagens, a viagem custaria R$ 15 mil. Esse foi mais ou menos o capital que Dona Lindu juntou em 1952, quando vendeu o que tinha no sertão, da terra ao jumento, e foi com os filhos para São Paulo, numa viagem de pau-de-arara que durou 13 dias. Lindu e seus filhos eram pessoas comuns.

SERRA É O MUDO QUE RECLAMA DO SURDO

José Serra é um tucano de vitrine. É candidato à Presidência da República, mas não sabe se será. Decidirá no ano que vem. Até lá, silêncio.
Felizmente acaba de sair o livro "Retrato de Grupo", comemorativo do 40º aniversário do Cebrap, o centro de pesquisas criado em torno de Fernando Henrique Cardoso. Nele há uma boa entrevista de Serra, dada em julho do ano passado. Ele reclama dos juros caros, do dólar barato, dos gastos do governo e resume uma vaga plataforma econômica:
"Temos de pensar o seguinte: o Brasil deve ter hoje 190 milhões de habitantes, perto disso; daqui a dez anos, teremos dezenas de milhões de pessoas a mais no mercado de trabalho. O modelo primário exportador, para onde o país está caminhando, não é capaz de gerar empregos com o dinamismo que a oferta de trabalho exige. Ele não vai gerar desenvolvimento sustentado (e sustentável), e o país está caminhando para isso. Então é um grande desafio reinventar o desenvolvimento, como se dizia na linguagem da Cepal, hacia dentro [para dentro], junto com hacia fuera [para fora], porque voltar o desenvolvimento só hacia fuera, que é o que está acontecendo, não vai dar conta dos problemas principais do país".
Ao final da entrevista, Serra reclama da falta de "um bom debate" e diz que essa prática é "algo interditado no Brasil de hoje": "Infelizmente esse debate não existe, está obscurecido e até reprimido, não pela força, mas reprimido ideologicamente".
O debate não está reprimido. Ele poderá começar quando Serra sair do silêncio.

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