domingo, novembro 29, 2009

CRISTIAN KLEIN

A herança maldita ficou para o PSDB

JORNAL DO BRASIL - 29/11/09


A EXPRESSÃO “HERANÇA MALDITA” foi muito utilizada pelo PT quando estava na oposição para demonizar o legado que os tucanos deixariam para o país. O partido assumiu em 2002 e manteve várias políticas do governo anterior. Herança maldita era uma acusação forte e bastante eficiente, como quase toda a retórica petista até hoje. Uma das grandes diferenças entre tucanos e petistas não está tanto na capacidade de governar. Mas na de se defender e atacar na luta política.

O longo tempo na oposição fez do PT um partido exímio em discursos contundentes, ferozes. Independentemente de sua veracidade. Chegou a combater o Plano Real. A ideologia à época, ainda radical, deu-lhe aquela convicção própria dos dogmáticos, cujo poder de convencimento vem do fato de se considerarem donos da verdade.

O PSDB é diferente. É ambíguo, vem de uma tradição centrista, relativista. Sua origem como partido de quadros – uma costela saída do PMDB – imprimiu-lhe um DNA institucional. Seus principais nomes já exerciam cargos políticos no sistema. O DNA do PT veio do movimento social, e suas poucas estrelas foram se transformando numa constelação, eleição após eleição. Mas sempre com a retórica dogmática e de oposição.

Ao assumir o governo, houve um arrefecimento. Mesmo assim, a intrepidez do discurso continua. O PT nasceu batendo e aprendeu a apanhar, sobretudo depois da surra que levou com o mensalão. O PSDB não se especializou nem em uma, nem em outra prática ao longo dos anos.

Uma demonstração disso é a defesa tímida, envergonhada que sempre fez das conquistas do governo FHC. Um dos dados mais curiosos da pesquisa CNT/Sensus sobre a corrida presidencial, divulgada nesta semana, foi o fato de 49,3% dos entrevistados afirmarem que não votariam em um candidato apoiado pelo ex-presidente tucano. É esse o tamanho da impopularidade de FHC. Ele não faz a cabeça do eleitor.

E deverá ser mais uma vez escondido pelos marqueteiros do PSDB.

Mesmo tendo sido o presidente que debelou a hiperinflação, que foi o responsável pela estabilidade econômica e que criou a Lei de Responsabilidade Fiscal. Não é pouco, para um país que vivia em tentativas e erros desastrosos de inúmeros planos econômicos.

Logo, o que fez FHC para cultivar uma imagem tão ruim? A pergunta intriga mesmo quem está acostumado a avaliar o cenário político brasileiro há anos. Diretora-executiva do Ibope Inteligência, Márcia Cavallari lembra que Fernando Henrique terminou seu segundo mandato, em 2002, com uma avaliação baixíssima. Em outubro daquele ano, seu índice de aprovação era de 35%, contra 57% de desaprovação. Ou seja, menos da metade dos 80% que o presidente Lula ostenta hoje, no auge de sua popularidade.

Ocorre que Fernando Henrique também teve sua lua de mel com a população e chegou a ter como pico 70% de aprovação, em março de 1997. Para Márcia Cavallari, a grave crise econômica mundial e a desvalorização altíssima do real, em 1999, explica muito, mas não tudo, na brutal queda de popularidade da qual FHC nunca mais se recuperou.

Na pesquisa seguinte à desvalorização, a aprovação do ex-presidente caiu de 61%, em dezembro de 1998, para 35%, em janeiro de 1999. “A crise foi o pivô da queda de popularidade. Foi uma crise internacional gravíssima, para a qual o país ainda não estava tão preparado quanto esteve para esta de agora. Mas o que falta investigar é por que ele (FHC) nunca mais reabilitou seu prestígio”, aponta Cavallari.

Não se reabilitou, entre outras possíveis explicações, pelos enormes transtornos causados à população, no segundo mandato, com a crise energética e os longos meses de racionamento. Ou pela não recuperação do poder de compra do trabalhador. Mas, sobretudo, porque as conquistas de seu governo não entraram como contrapeso. Não foram defendidas em momentos cruciais, durante as últimas campanhas presidenciais. Primeiro, com Serra, em 2002. Depois, com Alckmin, em 2006, que poderia ter justificado, com alguma maestria, a privatização das estatais. Mas titubeou. Não enfatizou, por exemplo, benefícios como o amplo acesso da população à telefonia. Por essas e por outras, os tucanos vão para mais uma eleição sem um passado, sem um eleitor de peso que poderia ser o ex-presidente. Ironicamente, a maior “herança maldita” dos anos FHC ficou com o próprio PSDB.

Os tucanos vão para mais uma eleição sem um passado, sem um eleitor de peso

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