quarta-feira, outubro 07, 2009

ELIO GASPARI

Ciro Gomes precisa reler Ciro Gomes


O Globo - 07/10/2009

Tudo indica que, se o deputado Ciro Gomes for candidato à presidência da República , formará com Dilma Rousseff a velha dupla dos filmes policiais.

O mau meganha azucrinará o tucano José Serra, enquanto a boa candidata, Dilminha, percorrerá o país com Nosso Guia, falando do Brasil de um novo tempo. É um ardil velho, mas legítimo, desde que Ciro Gomes respeite a inteligência alheia.

Assim como Lula, o tucano precisa de um adversário. Sete anos de pastor serviu Serra a Nosso Guia fazendo tudo, menos oposição, pois não serve a ele, mas à própria candidatura.

Se em 2010 alguém exigir contas ao tucanato, todo mundo ganha. Ciro Gomes pretende esse papel, mas deve respeitar os fatos.

Ele disse o seguinte ao repórter Raymundo Costa: “O que o Serra fez quando o câmbio estava apreciado?” Ótima pergunta. Entre 1994, quando foi lançado o Plano Real, e 1999, quando a economia brasileira foi à breca, o tucanato segurou o dólar numa faixa entre R$ 0,80 e R$ 1,20. Quando o governo capitulou, ele chegou a R$ 2. O câmbio valorizado importou a crise externa que começou na Ásia.

A pergunta de Ciro procede: “O que o Serra fez quando o câmbio estava apreciado?” Ele foi ministro do Planejamento de 1994 a 1995 e, publicamente, fez quase nada. Mesmo assim, não há no Brasil uma só alma honesta capaz de dizer que Serra defendeu o câmbio valorizado.

Em 1997, quando o economista Gustavo Franco, pai dessa política, foi para a presidência do Banco Central, Serra respondeu a uma pergunta do senador Pedro Simon, que buscava sua opinião a respeito da escolha dizendo o seguinte: “Peço a Vossa Excelência que ouça o meu silêncio.” O que o Serra fez quando o câmbio estava apreciado? Manteve a navalha na manga. Falou com o silêncio público e com uma gritaria de bastidores que, infelizmente, conta pouco.

Mas há outra pergunta: o que fez Ciro Gomes quando o câmbio estava apreciado? Passados quinze anos, a informação parece nova: nada. É pior. Entre setembro de 1994 e janeiro de 1995, ele foi ministro da Fazenda.

Assumiu com o câmbio apreciado e o dólar a R$ 0,80. Deixou o ministério com a moeda americana a R$ 0,84. Fazendo-se justiça ao deputado, no Ministério da Fazenda ele foi mais um animador do que um titular.

Quem mandava no país era o grupo de sábios da ekipekonômica.

Eles deixaram o governo e foram felizes para sempre aninhando-se na banca.

Ciro Gomes poderia ter ficado quieto, mas cavalgou a ficção do dótral lar barato: diante de uma ameaça de aumento dos preços dos veículos por conta de um acordo entre trabalhadores e montadoras, baixou a alíquota dos carros importados de 35% para 25%. Um Renault Twingo ficou mais barato que um Corsa GL e o Omega CD mais caro que um BMW 318i. Mais: diante de um surto de alta nos preços, amparado no câmbio maluco, reduziu as restrições às importações pelo Correio. As mercadorias com valor inferior a US$ 100 ficaram livres de imposto de importação.

Acima de US$ 500 a alíquota setembro baixou para 10%. Ficava mais barato comprar boas roupas no Brooks Brothers do que nas lojas Marisa.

Em novembro de 1994, quando um grupo de empresários foi ao Ministério da Fazenda para se queixar da apreciação do real, Ciro Gomes disse o seguinte: “Esqueçam o câmbio. Não falem mais disso.” Bom conselho para Ciro-2010.

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