segunda-feira, outubro 05, 2009

AUGUSTO NUNES

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Os vampiros aliados festejam a ampliação do banco de sangue

5 de outubro de 2009

Menos de um mês depois de promover o Brasil a potência petroleira, Lula promoveu-se a presidente de uma potência olímpica. Em 6 de setembro, Dia da Segunda Independência, não precisou de um só barril a mais para apresentar ao mundo o caçula da OPEP. O que resolveu que vai acontecer daqui a 10 ou 15 anos pareceu-lhe suficiente. Em 2 de outubro, depois de derrotar os ianques, os espanhóis e os japoneses na Batalha da Dinamarca, não precisou de uma única medalha de bronze para instalar o país no clube dos colossos esportivos. Bastou o que resolveu que vai acontecer no Rio em 2016.

O curto espaço entre os dois assombros avisa que a metamorfose ambulante sofreu mais uma mutação para pior. Lula sempre se apropriou do passado para fingir que fez o que outros fizeram. Quem ouve a discurseira interminável imagina, por exemplo, que a inflação liquidada em 1994 pelo Plano Real foi banida em 2003 pelo maior governante da história. Pois agora decidiu também expropriar o futuro para moldá-lo às conveniências do presente e fingir que já foi feito o que está por fazer. O craque que vive reinvindicando a autoria de gols alheios agora deu de assumir a paternidade dos que nem aconteceram.

A fantasia seria menos inverossímil se Lula não inaugurasse o futuro sempre em companhia de gente que eterniza o passado. No descobrimento do pré-sal, protagonizou uma superprodução futurista à frente de um elenco de cinema mudo liderado pelos canastrões José Sarney e Edison Lobão. No comício em Copenhague, anunciou a ascensão do Brasil à primeira divisão do planeta num palanque de segunda. O país não tem sequer algum arremedo de política esportiva. Investe apenas, e com frequência desastrosamente, no esporte de alto rendimento. Isso a gente resolve até a festa de abertura, sugeriu a discurseira em Copenhague.

Dinheiro é o que não falta, deixou claro ao informar que serão investidos no Rio quase R$ 30 bilhões. A bolada vai ser muito maior, corrigiu o sorriso de empreiteiro malandro no rosto da cartolagem. E boa parte vai parar no bolso dos campeões do salto sobre cofres públicos, modalidade não-olímpica praticada com muita competência por figurões federais e supercartolas.

Só os olhos gulosos dos bandidos e a miopia dos idiotas incuráveis enxergam um Brasil dividido entre nacionalistas grávidos de patriotismo com o triunfo incomparável e traidores da nação em aliança com os mortos de ciúme da Cidade Maravilhosa. O Brasil não precisa hospedar a Olimpíada para afirmar-se como uma grande nação em marcha acelerada para longe das cavernas. O Rio não precisa virar sede dos Jogos de 2016 para merecer as atenções, o respeito, o carinho e as verbas que a cidade mais bela do mundo reclama há tanto tempo. Consumada a escolha, ninguém minimamente sensato vai torcer pelo naufrágio. Mas o desastre só não virá se a tripulação for trocada a tempo.

Em 2003, a população do Rio soube que os Jogos Panamericanos de 2007, orçados em R$ 400 milhões, trariam como brinde a linha de metrô da Barra, a despoluição da Baía de Guanabara, a ressurreição da Lagoa Rodrigo de Freitas e outros espantos. A conta ficou em R$ 4 bilhões e os milagreiros nada santos esqueceram o prometido. Tudo será feito agora, declama Carlos Nuzman, que presidiu o comitê do Pan, preside o COB e presidirá o comitê dos Jogos de 2016. É errando que a gente aprende, recita Orlando Silva, ministro do Esporte desde 2006 e parceiro de Nuzman numa dupla que sempre faz bonito no campeonato nacional da gastança suspeita promovido pelo Tribunal de Contas da União.

O cinismo dos vendedores de ilusões só não é mais espantoso que a ingenuidade dos iludidos. Com o mesmo entusiasmo dos vampiros encarregados da administração, multidões de doadores festejam a ampliação do banco de sangue.

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