terça-feira, setembro 29, 2009

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Bancos: secos e molhados


Folha de S. Paulo - 29/09/2009


BC faz ajuste no compulsório mas não "aperta" oferta de dinheiro; bancos ainda não emprestam como em 2008


O BANCO CENTRAL soltou, no início da noite de ontem, pequenas modificações no "compulsório". "Compulsório" é o termo corrente para o dinheiro que os bancos têm de deixar "estacionado" no BC -uma parte dos depósitos à vista, a prazo (como um CDB) etc. tem de ficar sem uso, de modo a limitar a capacidade que os bancos têm de emprestar e de criar moeda.
Em setembro de 2008, o BC relaxou parte do compulsório. Isto é, permitiu que os bancos recolhessem menos dinheiro para suas contas no BC, preenchidas certas condições.
Naquele momento que se seguiu à quebradeira no mercado americano, bancos pequenos brasileiros, diz-se, estavam com dificuldades de fechar as contas no final do dia (honravam seus compromissos, viam seu "caixa" se esvaziar, mas não conseguiam captar dinheiro).
Havia boatos de corridas (saques e resgates em massa) até a respeito de bancos médios e grandes. O BC, então, irrigou o mercado. Em três meses, o total de recolhimentos compulsórios caiu de uns R$ 260 bilhões, em agosto de 2008, para R$ 200 bilhões, no início de janeiro.
Os bancos, enfim, não voltaram a emprestar, mas ninguém quebrou, o que é muitíssimo importante. A quebra de um microbanquinho, mesmo de um tamborete, teria provocado tornados arrasadores num sistema financeiro basicamente arrumado.
O que o BC fez ontem foi, aparentemente, ajustar o comprimento da barra da calça do compulsório. No ano passado, o BC permitiu que os bancos maiores recolhessem menos dinheiro desde que comprassem carteiras de bancos pequenos (isto é, dessem dinheiro aos bancos menores em troca dos empréstimos que esses haviam feito. Ou seja, que comprassem um fluxo de renda).
"Banco menor" era aquele com patrimônio de referência de até R$ 7,5 bilhões. Agora, o abatimento do compulsório vale para compra de carteiras de bancos com patrimônio de até R$ 2,5 bilhões.
O resto foi ajuste menor. Na verdade, o Banco Central disse que a situação está praticamente normalizada, apesar de deixar a calça um tanto folgada -prorrogou, por exemplo, para março de 2010 o relaxamento do compulsório que vencia no final do mês.
A dúvida que fica é o que o BC vai fazer do compulsório quando tanto o crédito e a economia voltarem a crescer de modo relevante. Vai usar o compulsório como linha auxiliar da política monetária (a fim de reduzir o crédito)? Por ora, não deu sinal nenhum disso. Na prática, os bancos estão com mais bala na agulha do que antes da crise. Emprestam menos (pelo menos até julho) e o compulsório ainda está relaxado.
Um estudo do economista Márcio Nakane, da Tendências Consultoria, divulgado ontem para clientes, mostra que a exposição dos grandes bancos ao crédito diminuiu de dezembro de 2008 (de crise braba) para junho de 2009 (Nakane usa como medida a proporção entre operações de crédito e ativos operacionais nessas duas datas, comparadas a setembro de 2008, antes da crise).
Os bancos também estão mais "líquidos" do que em setembro de 2008 (usam uma proporção menor do "dinheiro à disposição" para fazer negócios, como empréstimos).

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