terça-feira, agosto 18, 2009

MÍRIAM LEITÃO

Terreno instável

O GLOBO - 18/08/09

Foi um início de semana típico de crise. O Japão anunciou um inesperado número positivo no segundo trimestre, depois de a Alemanha e a França terem feito o mesmo na semana passada. E o que aconteceu? As bolsas caíram. Isso lembra a todos que o mundo ainda se move em terreno instável. A boa notícia é que o Brasil parece que ficará entre os países com número positivo no segundo trimestre.

O economista José Roberto Mendonça de Barros disse que sua consultoria está prevendo que no dia 10 de setembro o dado divulgado pelo IBGE será de 2% de crescimento do PIB, ainda que isso signifique uma retração de 1,2% em relação ao mesmo trimestre do ano passado. José Roberto acha que o Brasil está no grupo dos países que saem mais cedo da crise por não ter tido crise bancária.

— Está havendo uma cacofonia na economia internacional.

Alguns países crescendo forte como China, Índia, Indonésia, Vietnã.

Alguns países saindo da recessão e tendo números positivos mais cedo do que se esperava, como Japão, Alemanha e França. Os Estados Unidos com um consumo ainda fraco mas tendo um número positivo do PIB no terceiro trimestre, e outros países muito mal, como a Rússia — explicou.

De qualquer maneira, as bolsas caíram em todo o mundo. Tóquio recuou 3,10%, no pior dia dos últimos cinco meses. Xangai tombou 5,79%, no pior resultado do ano. No Brasil, o Ibovespa recuou 2,5%. A mudança de humor foi provocada pela China. Depois de ver o crescimento do PIB saltar de 6,1%, no primeiro trimestre, para 7,9%, no segundo trimestre, muita gente apostou que haveria uma grande aceleração até o final de 2009. Essa alta do PIB chinês puxaria o crescimento mundial, principalmente dos países vendedores de commodities.

Mas ontem a ficha parece que começou a cair. Apesar de ainda estar com ritmo forte de crescimento — já que 8% de alta não é pouca coisa — a aceleração não será tão forte quanto parece porque o comércio global e principalmente o consumo americano continuam fracos. Ainda na madrugada do Brasil, empresas chinesas já estavam despertadas para o fato de que há vários problemas no país: anunciaram que não enxergavam crescimento robusto nos próximos meses, mas uma manutenção do ritmo atual. O Investimento Estrangeiro Direto na China caiu pelo décimo mês seguido, em julho. As exportações e as importações recuaram pelo nono mês consecutivo.

Há dados muito bons na economia mundial, e há outros preocupantes. Momento de transição ainda. Os piores riscos ficaram para trás, mas nem todos foram ainda superados. O Japão ter 0,9% de crescimento no segundo trimestre é um resultado realmente excelente. Na pesquisa feita pelo “Japan Times” com as 108 maiores empresas do país, 66% disseram que a recuperação começaria no final do ano. Só 12% já acreditavam num resultado positivo.

Além do mais, Japão e Alemanha estão se recuperando mais rápido em parte porque voltaram a exportar e isso é uma boa notícia que vai além das fronteiras das duas máquinas exportadoras. Mesmo assim, há sustos em outras áreas. A China foi puxada em parte por forte investimento das estatais, que pode ter formado uma bolha.

— A grande dúvida é a sustentabilidade da melhora.

O mundo também se pergunta o que vai acontecer quando acabarem os efeitos das medidas de estímulo fiscal — disse José Roberto.

O fato evitou o aprofundamento da recessão com fortes anabolizantes. Manter a forma sem eles é que será o teste definitivo.

Na visão do Departamento de Estudos Econômicos do Bradesco, a decepção com o ritmo de aceleração do crescimento chinês foi um dos fatores que provocaram o dia de realização nas bolsas: “Muitos analistas projetaram crescimento acima de 9% para o PIB chinês em 2009. Mas para que isso aconteça, o país teria que acelerar muito fortemente no segundo semestre.

O que estamos vendo até agora é uma acomodação nesse patamar de 8%. Isso não significa que seja um resultado ruim, mas é uma quebra de expectativa em relação ao que muitos economistas haviam previsto”, disse o Bradesco.

José Roberto acha que a crise mostra que os países que têm mercado interno forte, e que não tinham crise bancária, estão retomando o crescimento mais rapidamente.

O Brasil é um desses. Tanto que depois de dois trimestres ruins, o país colherá um número positivo no segundo trimestre deste ano. E ainda que não cresça em 2009, vai ter, na visão de José Roberto, 4% de crescimento no ano que vem. Vários analistas estão revendo para cima as previsões de alta do PIB de 2010 para o Brasil.

Para José Roberto, uma das boas notícias no mundo é que ninguém está piorando: — Alguns estão crescendo, alguns melhorando e ninguém piorando. Mas países como a Espanha, México e Rússia não vão nada bem — afirmou.

A Carta Econômica Galanto, do economista Dionísio Dias Carneiro, chama a atenção para o fato de que a maior parte da melhora é devido aos estímulos financeiros, mas a recuperação ainda não está sendo puxada pela recuperação do consumo.

É isso. O mundo continua em transição, de uma grave crise, para a recuperação.

No atual momento dessa transição o mundo ainda pisa em terreno instável.

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