sexta-feira, agosto 21, 2009

EDITORIAL - VALOR ECONÔMICO

A valiosa contribuição de Mercadante à crise do PT

Valor Econômico - 21/08/2009

A reunião do Conselho de Ética do Senado, anteontem, foi uma série de jogos para a plateia. A oposição fingiu que tentava recorrer da decisão do presidente do Conselho de Ética do Senado, Paulo Duque (PMDB-RJ), que, numa decisão autocrática, arquivou na semana passada, uma a uma, as seis denúncias e cinco representações contra o presidente do Senado, José Sarney, e a representação contra o líder do PSDB, Arthur Virgílio (PSDB-AM). A bancada governista fingiu que acreditou, mas ajudou a arquivar com todos os seus votos na comissão a representação contra Virgílio. Os deputados petistas integrantes da Comissão - Delcídio Amaral (MS), Ideli Salvati (SC) e João Pedro (AM) - votaram pelo arquivamento da representação, mas fingiram que a decisão não lhes cabia: foi lida carta do presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), assumindo o voto dos três como decisão partidária.

No final de um dia de farsas, o PT havia perdido um senador, Flávio Arns (PR), que anunciou a decisão de mudar de legenda; foi-se o líder - o senador Aloizio Mercadante (SP) declarou que queria deixar a liderança, a bancada disse que não mais o queria, o governo quis vê-lo pelas costas e o partido não ficou feliz com sua atuação -, saída que deveria ter sido (e não foi) oficializada ontem; e a bancada do PT no Senado acusou um racha nunca dantes apresentado. Nesse dia de completo atropelo, a senadora Marina Silva (AC) anunciou, enfim, sua decisão de sair do PT.

De todos os atropelos do escândalos Sarney, o maior desastre foi o protagonizado pelo líder do PT, Aloizio Mercadante (SP). No início da sucessão de denúncias, o senador assumiu a missão, definida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de defender o presidente do Senado. Recuou em seguida, quando veio à tona gravações que flagraram a negociação familiar, entre neta e o avô Sarney, em torno de uma vaga. Tirou, na bancada, um documento oficial recomendando a Sarney que se afastasse do cargo enquanto se apuravam as denúncias, mas não conseguiu manter a posição diante da ofensiva do Planalto e da direção do PT, junto aos seus liderados, em favor do pemedebista. Até o último momento, tentou ainda uma saída que lhe tirasse da desconfortável posição de líder sem bancada: ajudar a arquivar todas as representações contra Sarney, exceto uma, que seria apurada pela Comissão como satisfação à opinião pública e aos seus eleitores - Mercadante é candidato à reeleição.

Antes da reunião do Conselho de Ética que analisaria os recursos contra o arquivamento das ações contra Sarney e Virgílio, os altos comando do PT e do governo se reuniram com o líder do Senado, que concordou com uma saída para se livrar do desgaste de liderar o apoio a Sarney: Mercadante leria uma nota assinada pelo presidente do PT, Ricardo Berzoini, assumindo como decisão partidária o voto dos senadores pelo arquivamento de todas as representações. Reunida a Comissão, no entanto. Mercadante decidiu não ler a nota e criticou os petistas que votaram com Sarney. "Seria uma hipocrisia ler uma carta com a qual não concordo", afirmou.

Na semana passada, o senador deixou de atender ao pedido de dois dos três integrantes do Conselho, Ideli e Amaral, de que fossem substituídos, para se preservarem para a disputa aos governos de seus Estados. Mercadante achou que seus liderados poderiam assumir o desgaste do apoio a Sarney. Na última hora, na frente dos holofotes, no entanto, fez prevalecer a sua decisão de não se submeter, ele próprio, ao risco do desgaste de liderar a sua bancada para uma ação pró-PMDB. Conseguiu a proeza de transformar uma posição eticamente recomendável e desejável, a de opor-se ao arquivamento das representações contra Sarney, em uma decisão destinada unicamente a salvar a sua própria pele. Não fortaleceu a posição dos governistas que queriam a apuração das denúncias contra Sarney, não conseguiu neutralizar a pressão do Palácio do Planalto sobre a bancada que liderava e sequer evitou que o líder do PMDB, Renan Calheiros, reinasse na reunião do Conselho como o fiscal dos votos petistas, com a "exigência" de que todos eles reforçassem a tropa de choque pemedebista. Seus avanços e recuos para tentar salvar o seu mandato nas urnas, no ano que vem, podem produzir o efeito inverso: o descompromisso do partido não apenas com a sua eleição, mas com a sua própria candidatura ao Senado.

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