sábado, julho 25, 2009

COISAS DA POLÍTICA

Autocrítica involuntária de Lula

Villas-Bôas Corrêa

JORNAL DO BRASIL - 25/07/09

A agenda sobrecarregada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o recorde absoluto de viagens internacionais aos cafundós do mundo e mais os giros domésticos da esperta, mas de ética discutível, antecipação da campanha eleitoral para consolidar a candidatura da ministra Dilma Rousseff com mais alguns pontos nos índices de popularidade e a rotina das audiências, muitas inúteis e sempre em alta na temporada da caça ao voto para garantir mais quatro anos em um dos melhores empregos do mundo, deve estar preocupando, com os sinais de estafa, a família, os amigos e a turma do cordão que cada vez aumenta mais.

Nada de grave em um saudável sessentão que está fazendo o que gosta, com autoconfiança sobrando nos autoelogios da meia dúzia de longos improvisos diários e a cega certeza de que tudo está dando certo como comprovam os seus índices de popularidade acima dos 80%.

Alguma coisa anda arranhando o seu otimismo e se denuncia nos discursos, nas conversas com os jornalistas e nos recados do fanático comunicador. Exemplos, às dúzias. Uma seleção dos mais recentes: para o auditório de cerca de 2 mil pessoas para o lançamento da safra da agricultura familiar 2009-2010, com a presença de oito ministros, claro da ministra-candidata Dilma, Lula partiu para o elogio do seu governo, sempre comparado com a mediocridade de todos os seus antecessores, desde Pedro Álvares Cabral. E renovou o apelo ao povo para que eleja "quem tem compromisso com o país", e que estava visível ao seu lado. No impulso, embaralhou um pouco as coisas, na referência ao próximo ano, "quando o povo vai fazer a mudança, melhorar, aprimorar, tirar quem não tem compromissos com este país e colocar pessoas com compromissos". Se a alusão ao ex-presidente Fernando Henrique é cristalina, ficou faltando explicar por que não fez as correções nos seis anos dos seus dois mandatos. Elogiado em discursos de três pequenos agricultores levantou-se, justificando: "Eu levantei porque o meu ego não cabia ali".

Na solenidade da posse do novo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, Lula passou um sabão na imprensa, uma das suas implicâncias. O conselheiro do país recomendou aos procuradores que não aceitem pressões, porque "a imprensa brasileira quer condenar antes de concluído o processo". E gabou-se de que jamais fará um pedido pessoal ao procurador-geral da República e jamais colocará um alfinete para atrapalhar qualquer investigação neste país. Pois, no Brasil, "dependendo da carga de manchetes da imprensa, a pessoa já está condenada".

Com a exceção dos períodos de escuridão dos oito anos do Estado Novo de Getúlio Vargas e dos mais recentes quase 21 anos da ditadura militar dos cinco generais-presidentes, jamais um presidente teve à sua disposição um esquema publicitário da extensão, da competência e com as verbas do que o que o presidente Lula montou e tem à sua disposição. E que cresce como tiririca em terreno abandonado. Desde o Café com o presidente pela rede de emissoras de rádio ao mais recente artigo semanal, com o texto de Lula oferecido aos jornais, revistas e publicações em todo o país. Com a nunca jamais louvada iniciativa, o modesto presidente recuperou a TV Educativa, que sempre viveu na miséria, hoje apelidada de TV Brasil, que começa a ser descoberta pelos que correm todos os canais e param no canal 2.

O presidente tem uma grande dificuldade em entender como funciona o Congresso e ignora as profundas mudanças disparadas com a mudança da capital do Rio para o canteiro de obras inacabadas, em 21 de abril de 1960, pela obstinação do presidente JK que sonhava com a volta em 1965. Enquanto o Rio foi a capital do país, as relações entre os presidentes e as duas Casas do Congresso eram cerimoniosas e obedeciam a um modelo de respeito e compostura que o cerrado acanalhou até a atual crise moral e ética que desmoraliza o Senado e a Câmara na sucessão de escândalos de quadrilhas de assaltantes do dinheiro público.

No Palácio do Catete, distante do Centro da cidade, que se percorria a pé, por entre ministérios, sedes dos principais partidos, o presidente recebia os líderes da maioria no Senado e na Câmara, que se entendiam com os partidos em nome do presidente.

Eram outros tempos e costumes. Na pasmaceira do recesso do Congresso teremos tempo para continuar esta conversa.

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