sexta-feira, junho 26, 2009

JANIO DE FREITAS

Em torno dos escândalos


Folha de S. Paulo - 26/06/2009


É de dentro da burocracia do Senado que tem saído tudo o que situa Sarney no centro do noticiário pejorativo

OS ACONTECIMENTOS no Senado entram na fase perturbadora, comum a todos os grandes casos anormais no Brasil, em que tudo pode ser lançado no noticiário, não só por jornalistas. Se faltar fundamento ou sobrar desproporção, a relevância dada no início leva às repetições, e poucas vezes à verificação e às correções devidas -e embarcamos todos no mesmo desvio.
E estão aí, como exemplo de agora, as duas contas ultrassecretas do Senado na Caixa, mais do que suspeitas, segundo a associação das revelações do senador Renato Casagrande com, digamos, a ansiedade jornalística. Não tardaram as explicações de que as contas são legais, de serviços externos da informática do Senado (o Prodasen) e de conhecimento do Tribunal de Contas da União. O que ficará valendo e influindo? Por ora, o segredo suspeito das contas, não verificada nem avalizada a explicação.
Os riscos que essas precipitações criam tanto implicam inverdades e injustiças, como embaralhamentos que inviabilizam a apuração dos fatos reais e dos seus responsáveis verdadeiros. Até hoje rolam por aí vários casos conturbados, também pela própria polícia, como o da maleta de dólares em São Paulo, aquele dos dólares apresentados como alegada intromissão de Cuba na eleição, e vários outros. Se bem que não desvirtuassem o desfecho necessário, os malabarismos no escândalo de Collor foram fartos, desde a grande dimensão atribuída à cascata na Casa da Dinda aos inquéritos, que se voltaram erradamente para dois Ermírio de Moraes, enquanto grandes empresários do esquema PC/Collor nem foram citados jamais.
É verdade que não faltam, com frequência, concessões muito baratas ao sensacionalismo, sejam por fraqueza de jornalistas, sejam por decisão de um ou outro meio de comunicação. Mas não há como sustentar que alterações na segurança do noticiário decorram, como norma, de má-fé ou campanhas deliberadas. Razões e propósitos são complexos, e também nesse sentido o escândalo Collor serve de exemplo: revistas, jornais, e TVs que projetaram o processo de denúncias contra Collor foram, quase todos, os mesmos que mais o apoiaram até aquele momento e desde a campanha eleitoral.
A entrada no descontrole, a meio dos chamados escândalos, tem a ver sobretudo com o problema de maturidade do jornalismo brasileiro, retardada pela interrupção de seu percurso por duas décadas de ditadura militar. Tal maturidade não depende só, no entanto, do jornalismo mas também das circunstâncias de sociedade e instituições. E nisso estamos bastante mal.
A convicção exposta ontem pelo senador José Sarney, de que há uma "campanha midiática", da imprensa & cia., para destituí-lo da presidência do Senado não é de todo equivocada. Mas incompleta e insuficiente para explicar sua posição de figura central nas revelações e nos comentários, inclusive de senadores, da realidade oculta do Congresso. Por menos que conte com a simpatia do jornalismo, Sarney está na original posição de alvo daquilo que procura proteger. É de dentro da burocracia do Senado, e não de artifícios de uma "campanha midiática", que tem saído, para os jornalistas, tudo o que o situa no centro do noticiário pejorativo sobre o Senado.
O que não deixa de ser prejudicial para o próprio noticiário e para o conhecimento dos fatos ocultos. Porque permite, por exemplo, que Renan Calheiros se ponha atrás das colunas e fique em sossego, como se nada tivesse com manobras e segredos do Senado nos anos em que o presidiu com carga incomum de poder e arbitrariedade. E assim também com outros componentes de Mesa Diretora. E isso está obscurecido, para conveniência dos diferentes grupos que manobram por um sigilo ainda maior que os descobertos.

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