quarta-feira, maio 20, 2009

JOGO DE CENA

EDITORIAL

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/05/09

Sobra cinismo em ataque do governo Lula à CPI da Petrobras, inquérito que não desperta grande expectativa de resultado


A CPI prejudicará a imagem do Brasil no exterior; o Congresso não é delegacia de polícia; a celeuma vai paralisar o Legislativo e abalar a economia; a iniciativa não passa de manobra eleitoreira da oposição. Com tais gritos de guerra, a tropa de elite do Planalto combateu -e derrotou- a proposta de criar a então apelidada CPI da Corrupção. Era março de 2001, e o presidente, Fernando Henrique Cardoso.
Num fato que já se tornou tedioso constatar, os anos se passaram, a oposição chegou ao poder, e os papéis se inverteram. Agora são os petistas que invocam os sagrados valores da pátria e da estabilidade econômica na tentativa de sabotar a CPI da Petrobras. Os tucanos encenam o clássico jogo da oposição, mais interessada em desgastar o governo que em conhecer a verdade.
Na reedição da trama, embora as trupes tenham mudado de lado, o cinismo dos atores que interpretam o governo permanece. Não conseguem convencer o público de que acreditam no que dizem. É difícil, reconheça-se, emprestar credibilidade a falas como "Abrir CPI contra a Petrobras é abrir CPI contra o Brasil".
Nenhuma empresa que atue no Brasil, quanto menos uma estatal da importância da Petrobras, está imune a investigação parlamentar. A abertura de um inquérito no Congresso pode até prejudicar negócios da companhia, no curto prazo, mas isso não é razão suficiente para abortar uma investigação. Não é admissível manter indícios de má gestão sob o manto do segredo.
O problema com a CPI da Petrobras é que ela oferece, já na saída, escassas perspectivas de que algo relevante venha a ser esclarecido. Nem se fale, aqui, do peso descomunal do governismo na comissão, o que tende a barrar no nascedouro iniciativas consideradas inconvenientes à direção da empresa e ao Planalto.
Em vez de escolher um foco, a investigação pretende abraçar vários temas complexos ao mesmo tempo. A CPI se propõe a apurar suspeitas de irregularidades que vão dos patrocínios culturais da estatal, passam pelos indícios de irregularidade nas obras de uma refinaria em Pernambuco e pelas polêmicas manobras contábeis e chegam às denúncias de fraude em pagamentos de royalties.
Além disso, outro roteiro batido de CPIs, o que evita emoções fortes e deságua em inquéritos inconclusivos, se insinua neste caso. Tentáculos dos negócios bilionários da estatal e de seus fornecedores chegam a praticamente todos os Estados -negócios e contratos que muitas vezes beneficiam interesses próximos ao de senadores, do governo e da oposição. Esse fenômeno tende a amaciar ainda mais o ímpeto investigativo da comissão.
O acaso, decerto, pode pregar peças. Mesmo com vários fatores a sugerir ceticismo quanto aos resultados do inquérito, continua valendo a máxima de que se sabe como uma CPI começa, mas não como termina.

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