quinta-feira, maio 07, 2009

CAIU O SISTEMA NA INFRAERO


EDITORIAL

O ESTADO DE S. PAULO - 7/5/2009

O PMDB não esperneia porque o irmão e a cunhada do líder do governo no Senado, Romero Jucá, e a ex-mulher do líder do partido na Câmara, Henrique Eduardo Alves, perderam seus empregos na Infraero, como deve acontecer com a imensa maioria da centena de funcionários comissionados da estatal, cujos salários variam de R$ 4 mil a R$ 14 mil. Deles, nada menos de 81 chegaram lá por serem correligionários, amigos ou parentes de políticos de vários partidos. O PMDB decerto protesta porque as demissões privam os padrinhos de algo mais substancioso do que a paga mensal perdida pelos apadrinhados. Numa palavra, oportunidades. 

A empresa, que administra 67 aeroportos com um orçamento anual de cerca de R$ 1,3 bilhão, é um manancial de contratos de obras e de cessão de espaços nos terminais para publicidade. Empregos como aqueles, portanto, credenciam os seus ocupantes a participar de decisões que envolvem grandes interesses. Quando as coisas saem a seu gosto, a sua comprovada influência acrescenta poder e prestígio aos que os indicaram. Desse mecanismo dependem o patrimônio político dos caciques partidários e o financiamento de suas campanhas eleitorais. É assim que o sistema funciona, mesmo quando os diretamente envolvidos são insuspeitos de ilicitudes no manuseio dos recursos públicos.

Eis por que faz sentido a demanda peemedebista por um lugar no grupo da coordenação política do presidente Lula, integrado pelos chamados "ministros da casa", todos eles petistas (salvo o titular da Secretaria de Comunicação do governo, sem filiação partidária). Com acesso assegurado a esse grupo especial de interlocutores do presidente, que com ele se reúne no mínimo uma vez por semana, a legenda poderia, se não impedir que se concretizem decisões lesivas às suas mais caras aspirações, a exemplo do que aconteceu com os cargos na Infraero, ao menos ser indenizada com nomeações também proveitosas em outras áreas da administração.

A carta na manga, ou melhor, na mão do PMDB, é evidentemente o seu decantado - quem sabe inflado - cacife para a sucessão de 2010. Diferentemente da maioria dos observadores, que apostam na divisão da sigla entre os candidatos do governo e da oposição, o presidente Lula parece acreditar que os recursos de poder ao seu alcance poderão arrebanhá-la para fazer par com a sua escolhida Dilma Rousseff ou, conforme a evolução do seu estado de saúde, para respaldar um ainda nebuloso "plano B". E disso se valem os cortejados para demandar, sem a menor preocupação de disfarçar os seus apetites, parceria "na construção e elaboração" desse ano e meio de governo que Lula tem pela frente.

Descontados os presumíveis interesses que o levaram a se manifestar - ele novamente quer ser "uma alternativa" ao Planalto -, o deputado Ciro Gomes desta vez disse a coisa certa, ao advertir para o risco que correria o presidente se as concessões que fizer ao PMDB incluírem um recuo na decisão de apoiar o afastamento dos protegidos políticos dos quadros da Infraero. "Uma volta aí seria a desmoralização", adverte. De fato, o que está acontecendo na estatal dos aeroportos é algo literalmente excepcional na era Lula. Com o aval do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o sinal verde do Planalto, o presidente da empresa, brigadeiro Cleonilson Nicácio, implantou na sua estrutura um processo de profissionalização que é a antítese dos padrões dominantes na administração federal.

Os 109 cargos em comissão da Infraero (chegaram a ser 240!) serão reduzidos a 12. Isso atinge em cheio o esquema de loteamento que ali prevalecia: dos 109, 81 estavam ocupados por membros de patotas políticas (28 deles já demitidos). E, dos 5 diretores, 4 terão de ser necessariamente funcionários de carreira. A reestruturação, que há pouco menos de um mês se tornou norma estatutária, deixará a estatal em condições de atender aos padrões requeridos das empresas de capital aberto - no que ela poderá se transformar. As pressões por um retrocesso são o cúmulo do descaramento, mas não deixam de ser comensuráveis com o alcance da mudança em curso. Mas não se vê como o presidente possa dar o dito pelo não dito. Se o fizesse, afrontaria o seu ministro da Defesa, o dirigente da empresa - e ainda a corporação dos seus empregados. 

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