quinta-feira, abril 02, 2009

BRASIL S.A

Indústria fraqueja

Correio Braziliense - 02/04/2009
 

Produção cresce, mas em ritmo fraco e investimento em queda, o que é mau se o G-20 negar fogo


Variável-chave para a evolução corrente da economia, com impactos sobre o nível do emprego, a renda, a arrecadação tributária e, por consequência, o desfecho da sucessão do presidente Lula em 2010, o desempenho da produção industrial em fevereiro na métrica do IBGE foi menor que o esperado. Mas não sinaliza um desastre. Ainda. 

Não, pelo menos, no mesmo patamar de recessão tendendo a virar uma depressão, à falta de políticas anticíclicas eficazes e de um horizonte confiável para o capital, visto nas economias da Europa, EUA, Japão e na maioria dos emergentes, à exceção de China e Índia — enfim, o Grupo dos 20, G-20, dos países mais ricos do mundo. 

Os chefes de governo do G-20 se reúnem hoje em Londres para outra rodada anticrise, mas a expectativa é baixa. O que se espera de mais relevante é um pacote de US$ 250 bilhões de reforço às linhas de crédito disponíveis nas agências de promoção comercial, como o Eximbank dos EUA, que adicionaria US$ 100 bilhões, Japão (US$ 25 bilhões), Banco Mundial (US$ 50 bilhões) e até o brasileiro BNDES. 

O juízo é que a escassez de crédito, estimada em US$ 300 bilhões, agravou o colapso do intercâmbio comercial entre países. Na conta da Organização Mundial do Comércio, o fluxo comercial recuou 23% no primeiro trimestre sobre igual período de 2008. Sem reforço do crédito, tenderá a recuar 13% no ano, contra o aumento médio de 8% nos últimos anos. O problema é que tal análise não é consensual. 

No próprio Banco Mundial há economistas que relacionam a retração do comércio não à escassez de crédito, mas à recessão nas maiores economias, e isso devido à globalização das cadeias produtivas no mundo. Se a demanda interna em países de consumo voraz, como EUA e China, enfraqueceu, o comércio global também enfraquece. E só com estímulos fiscais para ativar a demanda doméstica a situação volta ao normal. Ainda assim, tal ação precisaria ser seletiva. 

O ativismo fiscal deveria ser mais forte em países ou blocos com superávits externos, sobretudo China e Japão, mas também a Europa, e menor nos EUA, que já está gastando mais do que pode, só que, se ficar isolado neste esforço, reiniciará o circuito importador e os seus enormes déficits comerciais. Está neles a origem primária do desbalanceamento global, expresso pela enorme propensão ao consumo dos EUA sem a contrapartida de importações equivalentes pelos seus parceiros superavitários, sobretudo China, Japão e a zona do euro. 

Um processo doentio 
As raízes da crise são profundas. Elas começam com a cornucópia dos dólares emitidos para financiar os déficits primeiro fiscais, depois, comerciais, dos EUA. Eles criaram o “capital de giro” para a expansão do comércio global, que impulsionou o modelo exportador de bens industriais baratos para o mercado americano, a volta dos superávits desses países para aplicação em papéis dos EUA, e por ai se foi semeando a crise atual. O superendividamento dos EUA, as bolhas de especulação nos últimos anos, o colapso do crédito, tudo vem daí: do processo doentio de acumulação de riqueza no mundo. A ambição do G-20 é livrar o mundo desses males, mas não será agora. 

Sabedoria em falta 
Falta tudo ao G-20, de visão consensual sobre as origens da crise à vontade sincera dos governos em assumir sua cota de sacrifício. O laxismo fiscal coordenado sugerido por Barack Obama não encontra respaldo entre os governos da Alemanha e França, mais preocupados em defender seus próprios mercados que em facilitar o comércio dos “outros”, embora esta seja uma política em que só há perdedor. Mas quem disse que a riqueza das nações traz sabedoria ao governante? 

Risco de estagnação 
É neste contexto de contradição e mesquinhez do mundo rico que se insere a economia brasileira e seu principal elemento, a produção industrial. Ela cresceu 1,8% em fevereiro sobre janeiro, abaixo da expectativa, e acumula expansão de 4% sobre dezembro – ritmo lento para recuperar o tombo de 20,1% de outubro a dezembro em relação a setembro. Por tais dados, o quadro não se agrava, mas torna remota a chance de o Produto Interno Bruto (PIB) fechar o ano com taxa de crescimento parruda. No cenário do Banco Central, crescerá 1,2%. 

A esperança de crescimento, ainda que modesto, se abate diante da forte queda do investimento. A produção de bens de capital recuou 6,3% sobre janeiro, revelando o pessimismo empresarial. Não é bom augúrio. Sem o mercado interno e o investimento, a estagnação é o melhor cenário, já que do mundo, por ora, não há o que esperar. 

Miopia globalizada 
Tal como aos EUA, onde está o centro da crise, no Brasil também a retomada exige a combinação de ações que reanimem o consumo com um projeto crível de expansão a longo prazo. Mas tanto lá como cá é o cenário corrente que merece atenção, o que se entende nos EUA, com a insolvência virtual da banca, mas não aqui. O governo se importa mais com indicadores correntes capazes de mexer com a popularidade presidencial que com o quadro econômico futuro, desprezando o fato de que é no presente que se constrói o que virá. Tipo o quê? Dando redução de imposto para máquinas e equipamentos, por exemplo, não só para carro e material de construção. A miopia não é só do G-20.

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