terça-feira, fevereiro 17, 2009

JÂNIO DE FREITAS

A mãe eleitoral


Folha de S. Paulo - 17/02/2009
 

Lula queria uma jogada de propaganda; para isso, não precisaria de mais do que uma "mãe do PAC"

O JOGO POLÍTICO que Lula faz com Dilma Rousseff é tão acintoso, com tantas viagens justificadas por nada e solenidades de razão nenhuma, que daí resulta um efeito já acintoso também, mas contrário. É uma reação de antipatia que está se projetando sobre a ministra, refletida com clareza na substituição do tratamento cerimonioso que lhe dava a imprensa, um reconhecimento a seus méritos, por uma vulgarização depreciativa de seus atos e de sua figura.
Aparente reação também às atitudes desafiantes de Lula, a propósito da imposição desmedida da presença de Dilma Rousseff, a antipatia difusa lembra aquela que assolou José Serra em sua candidatura à Presidência, pelo tom sempre entre o ríspido e o agressivo, enquanto Lulinha paz e amor representava a sua peça.
A mais recente explicação de Lula para as viagens quase diárias de Dilma Rousseff soa, diante dos meros comícios exibidos, mais como deboche do que como esclarecimento: "A Dilma tem que viajar mesmo para inspecionar as obras do PAC". Inspeção não se confunde nem com visita de propaganda, quanto mais com comícios, para os quais são deslocados moradores das redondezas, sindicalistas, militantes petistas a granel, políticos locais e farto material de propaganda política. Tudo depois de um "escalão avançado", pago por dinheiro público, estudar as condições locais e montar o formidável "esquema presidencial", pago também nas contas sempre generosas e jamais expostas da Presidência.
A aritmética de Lula, seja qual for sua precisão, informa que há obra do PAC em 5.200 municípios, dos 5.563 existentes. Informação a que se segue o que tanto pode ser uma antecipação, como advertência ou ameaça: "Nós vamos a cada um dos 5.200 municípios". Vão, no caso, significa fazer comícios. Ou melhor, inspeção de obras.
Daqui à eleição presidencial são cerca de 570 dias, o que indica a necessidade de que Lula e Dilma visitem, até lá, nove municípios por dia, e às vezes mais um de quebra. Ainda que se reduza o total do plano Lula a 10% das viagens anunciadas, não se atenua esta curiosidade: com tanta viagem de Dilma Rousseff, como poderia ela estar conduzindo, já agora, as inúmeras tarefas e responsabilidades do Gabinete Civil? E qual é a sua função primordial, senão a eficiente e competente condução do Gabinete Civil?
O PAC não é um programa bem-sucedido, a rigor não é nem sequer um programa. E uma de suas falhas está no ato preliminar da entrega de sua coordenação a Dilma Rousseff. A quantidade de dinheiro à disposição de tantas e tão dispersas obras, com o envolvimento de vários ministérios e uma multidão de prefeituras, para ser sério precisaria de um núcleo complexo de coordenação, fiscalização e constantes correções técnicas e administrativas. Nada a ver com acumulação funcional de chefia do Gabinete Civil da Presidência, que não é adequado para cuidar nem de obra no banheiro.
Mas Lula queria uma jogada de propaganda. Para isso, não precisaria, mesmo, de mais do que uma "mãe do PAC". E vários bilhões girando por aí, para afinal pousarem em destinos incertos e não sabidos. Enquanto Lula e Dilma Rousseff voam, voam, voam.

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