sábado, dezembro 06, 2008

A CONTA DO CASAL K


O Globo - 06/12/2008
 

Não há país inteiramente preparado para resistir à crise internacional. Alguns estão em melhores condições que outros. Mas poucos estarão tão despreparados como a Argentina, cuja economia já estava debilitada. Ontem, não havia combustível em Buenos Aires. Empresários e trabalhadores dos postos de gasolina deflagraram uma greve de 24 horas, com adesão de 95% e longas filas nas poucas bombas abertas. O setor reivindica rentabilidade mínima e proteção ao emprego - 3 mil postos já fecharam na Argentina, com perda de 40 mil empregos. A dificuldade dos empresários é obter uma resposta do governo, a quem não interessa reajustar preços ou salários por conta de uma inflação de 15% a 25% ao ano, maquiada para ficar nos 8% ou 9%. 

A terapia Kirchner tirou a Argentina do balão de oxigênio na crise de 2001/2002 e permitiu ao país voltar a crescer a partir de níveis de atividade muito deprimidos. O erro foi não ter adaptado o tratamento à melhoria do doente. Insistiu-se no congelamento de preços, na hostilidade ao capital privado e no apoio à estatização, como oposição a medidas vistas como "neoliberais". A situação se deteriorou com a mudança do Kirchner no poder - Cristina assumiu em dezembro de 2007. Hoje, a presidente busca desesperadamente fundos para pagar a dívida e financiar um grande programa de obras públicas que impulsione não só a economia como sua popularidade, estatelada a 20%. 

O casal K parece cego ao bom senso. Em março, quando eram mais elevados os preços das commodities, Cristina conseguiu estragar tudo ao elevar o imposto retido sobre a produção rural, o que resultou num enfrentamento de 102 dias com os produtores, encerrado com a capitulação do governo. 

Em outubro, a presidente obteve do Congresso aprovação para confiscar US$29 bilhões depositados nos fundos de pensão privados - em termos simples, um roubo das aposentadorias dos argentinos. Cristina também baixou legislação com incentivos à repatriação de capitais que fugiram do país, estimados em US$123 bilhões. A Argentina está sem acesso ao escasso crédito internacional em decorrência do calote da dívida de US$95 bilhões em 2001. No momento, suas exportações estão em queda, assim como o preço de commodities como a soja. Por isso, analistas já estimam que haverá dificuldades em relação aos US$28 bilhões de dívidas que vencem nos próximos três anos. A conta dos erros chegou. Para o governo, o melhor será abandonar a arrogância e ter a coragem de fazer os ajustes necessários na economia, inclusive com medidas de austeridade fiscal.

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