sexta-feira, novembro 28, 2008

DORA KRAMER

Rolando Lero


O Estado de S. Paulo - 28/11/2008
 

Período compreendido entre o balanço de perdas e ganhos de uma eleição e a apresentação das cartas em jogo no próximo pleito, a entressafra eleitoral é a fase das floradas do recesso.

A atual revela-se especialmente fértil em fabulações de toda sorte por causa da dificuldade que a crise econômica impõe à visão do horizonte. Na falta de algo consistente para dizer ou fazer, os partidos, os políticos e os pretendentes a candidatos fazem e dizem qualquer coisa.

Desde que ocupem espaços e aumentem os respectivos cacifes para disputar as melhores posições na largada, valem todas as marolas.

Vale o presidente Lula sacramentar Dilma Roussef como candidata à sucessão sem perguntar o que o PT tem a dizer; vale o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, abraçar a candidatura da ministra ao arrepio da posição de seu partido, mesmo cansado de saber que o PMDB tem outros (no sentido de múltiplos) planos.

Vale Dilma trocar os óculos por lentes de contato, reunir uma claque eleitoral em palácio e posar como provável chefe de Estado não obstante careça dos 50, 60 milhões de votos necessários; vale o DEM pedir rigorosa investigação para “apurar” se Lula está ou não fazendo campanha eleitoral antecipada para Dilma usando da máquina pública, sabendo da esterilidade da ação.

Vale até mesmo os governadores José Serra e Aécio Neves defenderem com assertividade a realização de prévias para escolher o candidato do PSDB à Presidência, quando a hipótese não está nem nunca esteve em cogitação. Se os tucanos falam dia e noite em unidade, há três eleições sofrem as dores da divergência interna, era o que faltava abrirem uma disputa a votos dentro do partido em pleno transcorrer de 2009.

Só o que não vale é o eleitor investir seu estoque de crença nessas conversas, cujo conteúdo é para ser registrado por um ouvido, dispensado pelo outro e nunca, jamais, ser escrito. 

Nada do que está sendo dito ou feito merece confiabilidade rigorosa. Muito menos o que é dito e feito em público, entregue ao exame da população previamente enquadrado na moldura que mais interessa a seus autores.

Nos exemplos acima citados, os interesses são os seguintes: Lula precisa de Dilma para não esvaziar o mandato em curso antecipadamente; o PMDB precisa simular fidelidade para não perder espaço; o DEM precisa posar de oposição aguerrida e o PSDB precisa fazer ares de família que reza unida.

Vida pregressa

A absolvição do deputado Paulo Pereira da Silva no Conselho de Ética da Câmara é dada como certa. Foi alcançado por investigação da Polícia Federal sobre desvio de empréstimos no BNDES e flagrado em telefonema prometendo “mexer os pauzinhos” no Congresso para convocar o ministro da Justiça a dar explicações sobre a prisão de um assessor na operação.

As provas, ao presumido sentir do conselho, são inconsistentes.

Insuficiente também para caracterizar falta de decoro é o inquérito que corre contra ele no Supremo Tribunal Federal por causa de repasses de verbas do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Presidente da Força Sindical, o deputado responde pela entidade sob suspeita de ter recebido dinheiro do Ministério do Trabalho para promover cursos inexistentes oferecidos a alunos fantasmas.

As acusações atingem outras centrais, entidades patronais e apontam para a conivência do ministério, que avalizou todos os convênios feitos ainda durante o governo Fernando Henrique Cardoso. 

Na campanha eleitoral de 2002, candidato a vice-presidente na chapa de Ciro Gomes, Paulo Pereira ameaçou fazer e acontecer contra seus “caluniadores”. Terminou ele sendo o investigado e, dependendo da decisão do STF, processado.

Na Câmara nada disso conta. O mandato parlamentar serve para conferir foro privilegiado por atos cometidos antes do mandato, mas esses mesmos atos não pesam na avaliação da conduta do parlamentar. 

Autocombustão

À falta de argumentos consistentes para defender o correligionário Cássio Cunha Lima, governador cassado da Paraíba, os tucanos disseminam desconfiança sobre o voto do ministro-relator do caso no Tribunal Superior Eleitoral, Eros Grau.

Dizem que ele votou “muito rápido”. Sobre os 35 mil cheques de programa social distribuídos no período eleitoral como “um presente do governador” ou a respeito de boladas usadas para pagamento de contas pessoais de Cunha Lima, nem uma palavra. Não lhes ocorre, por exemplo, que o ministro tenha sido ligeiro exatamente porque os fatos são espessos.

O tucanato repete aqui o gesto da defesa do senador e então presidente do PSDB Eduardo Azeredo no caso do “mensalão mineiro”, em 2005.

Lá, perdeu a moral para acusar o PT e, recolhido à insignificância conferida pelo equívoco, viu Lula renascer.

Aqui, joga no lixo o discurso da probidade e eficácia administrativas.

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