terça-feira, julho 16, 2019

Dallagnol tem tudo para provar a lisura de seus atos, basta mostrar as planilhas - RANIER BRAGON

FOLHA DE SP - 16/07

É aceitável que procurador use função pública para alavancar negócios privados?

As conversas se assemelham àquelas que saem no Jornal Nacional tendo como pano de fundo o encanamento estourado, a jorrar maços e maços de dinheiro de dentro de suas tubulações enferrujadas.

Discutem-se cifras e percentuais, várias vezes. O plano é encobrir o real objetivo —o ganho financeiro— escalando laranjas para gerir a empresa ou criando uma entidade simuladamente sem fins lucrativos.

Conforme revelam mensagens obtidas pelo Intercept Brasil e analisadas em conjunto com a Folha, o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato, montou um plano privado de negócios a partir de seu trabalho na operação.

Os diálogos mostram procuradores arrebatados por um único desejo, auferir o maior lucro possível —o que incluiria parceria com outras empresas— por meio de uma atividade a ser escamoteada pelo manto da filantropia. De forma chocante, não há nada ali que lembre remotamente a versão pública de Dallagnol sobre o objetivo de sua prolífica carreira de palestrante —estimular a cidadania e o combate à corrupção.

"Tomara que seja algo como 1 bi porque vamos faturar!!", escreveu o chefe da Lava Jato na madrugada do dia 15 de fevereiro ao também procurador Roberson Pozzobon. Dallagnol diz não haver veracidade comprovada nem contexto nas mensagens. É hora então de ele revelar o devido contexto de seus atos.

Cerca de 40 palestras teriam lhe rendido mais de R$ 300 mil "limpos" em 2018. Basta levar as planilhas ao escrutínio público. Quem o contratou, quanto recebeu, quanto foi parar no seu próprio bolso? Pode provar, como sempre disse, que destinou grande parte a entidades filantrópicas ou de combate à corrupção?

Dallagnol é um funcionário público pago para desbaratar maracutaias. É lícito, ético, que use essa atividade como escada para negócios privados? Ao tramar nas sombras e cogitar subterfúgios e institutos de fachada para ocultar a real finalidade da empreitada, o coordenador da Lava Jato parece saber a resposta.


Ranier Bragon
Repórter especial em Brasília, está na Folha desde 1998. Foi correspondente em Belo Horizonte e São Luís e editor-adjunto de Poder.

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