domingo, dezembro 11, 2016

Para a plateia - MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 11/12

Estamos em plena temporada da dissimulação. O PT chegou a propor teto para os gastos em duas ocasiões, hoje prefere exibir sua cômoda amnésia. Também reduziu pensões de viúvos e viúvas, e a ex-presidente Dilma estava preparando um projeto de reforma da Previdência. Portanto, o repúdio dos petistas às propostas é mais um dos vários atos de hipocrisia política.

O projeto de reforma se propõe a reduzir desigualdades dentro do sistema de aposentadoria, apesar de manter várias delas. A Previdência sempre foi muito desigual, mas agora é que alguns políticos e sindicalistas criticam os tratamentos diferenciados. As últimas semanas têm sido de declarações feitas para ludibriar o público. Uma delas foi do deputado Henrique Fontana (PT-RS). Segundo ele, a reforma, ao estabelecer a idade de 65 anos, pune o trabalhador mais pobre, sem qualificação, que começa a trabalhar cedo. Quem usufruiu todos estes anos da aposentadoria precoce foi o trabalhador de maior renda, que tem qualificação e que trabalhou no setor formal. Para o pobre e sem qualificação, sempre valeu a idade mínima de 60 anos.

Muitas das desigualdades no sistema de aposentadorias e pensões permanecem com a reforma. Antes, as injustiças eram maiores e não incomodavam as centrais sindicais porque elas representam o trabalhador qualificado do setor formal. Paulinho da Força, do Solidariedade, sugeriu que as novas regras da Previdência só valessem para quem nasceu em 2001, que tem hoje 15 anos, e vai se aposentar em meados da década de 2060. Isso é demagogia. Ele conhece os números e sabe que a Previdência está quebrada e exige mudanças imediatas. Mas está jogando para a plateia.

Este governo tem muitos defeitos, já errou bastante nestes meses em que conduz o país. Porém, o poço em que estamos foi provocado por Dilma, e as mais ferozes críticas a Temer são de quem votou nele. Temer era o segundo nome na mesma chapa. A PEC do teto de gastos não vai nos tirar da crise, mas o que está tramitando no Congresso tem o objetivo de evitar o crescimento insustentável das despesas. A oposição ataca todas as medidas de ajuste, mas apoiou o governo que produziu o maior rombo da história, a maior recessão e levou a dívida pública de 52% do PIB para 70%. Não fazer nada sobre isso é correr um enorme risco.

A educação está em crise, mas os dados que saíram recentemente são de 2015. O sucateamento das universidades e o atraso na educação básica não ocorreram em seis meses. O PT aumentou os gastos com educação nos 13 anos em que governou, mas isso não se refletiu em melhoria de qualidade. Entre outras coisas, porque gastou errado. Um deles foi o inchaço que levou a R$ 20 bilhões a despesa com o Fies para aumentar o faturamento dos grandes grupos educacionais.

Os senadores do PT estão na confortável situação de condenar as medidas que se tornaram inevitáveis por causa da sua má condução dos negócios do Estado brasileiro. Nenhuma crise nasce ou desaparece da noite para o dia. Deveriam, os políticos petistas, já que governaram o Brasil, explicar como se sai do buraco em que eles nos colocaram. Um rombo fiscal desse tamanho pode provocar descontrole inflacionário e crise de confiança na dívida pública. Como a dívida é a soma de todas as aplicações financeiras das famílias e das empresas, o risco não é pequeno. O que sugere a oposição diante desse problema concreto criado pela administração petista?

O governo Temer tem vários defeitos e está imerso em contradição. Um deles: com seu exército de aposentados precoces, comanda a reforma que vai mudar a vida de tantos milhões. Seria mais fácil encontrar a saída se cada grupo político admitisse os dados da realidade e tivesse uma receita concreta de sair da crise.

Muitos sindicalistas e políticos não têm demonstrado estar à altura da necessidade do país. Esse é um momento grave da vida brasileira em que a economia sangra, os empregos somem e a dívida pode escalar. A economia precisa de um mínimo de horizonte e não tem. Os números falam por si. E atrás dos números há pessoas vivendo dramas pessoais cada vez mais agudos e uma vasta desesperança. Deveríamos, pelo menos, ser poupados da demagogia.

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