sábado, setembro 03, 2016

PT e suas fases - MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 03/09
A era PT teve várias fases e muitos ângulos. As louvações e as críticas gerais são sempre imperfeitas. Houve a primeira fase da política econômica que ajudou a estabilização da economia, houve política anticíclica na hora certa. Mas o governo perdeu o ponto de interromper os estímulos e passou a ser irresponsável na área fiscal e no combate à inflação. Isso levou o país à crise.

Não se pode separar os erros e os acertos entre Lula e Dilma. É mais sútil. No período do exministro Antonio Palocci, uma equipe econômica competente fez a política que reduziu a inflação e arrumou o país. O medo do PT e das políticas que defendera durante a campanha elevou o dólar e a inflação e gerou uma crise de confiança.

Foi nesse momento que Palocci e o presidente do Banco Central Henrique Meirelles trabalharam em conjunto para combater a crise. A inflação chegou a 17% em 12 meses até maio de 2003. Sem uma política econômica correta, ela continuaria subindo e certamente a história seria outra. O país não suportaria o escândalo do mensalão, mantendo Lula no cargo, se a inflação estivesse fora do controle.

O combate ao descontrole dos preços por uma política fiscal responsável e uma política monetária firme foi tão eficiente que em março de 2007 a inflação havia caído para 2,96% em 12 meses. Em 2005, os ministros Palocci e Paulo Bernardo propuseram a meta do déficit nominal zero. Naquele momento, seria possível e o ideal é que tivessem reduzido a meta inflacionária.

Foi quando as ideias antigas do PT deram a resposta na voz da então chefe da Casa Civil Dilma Rousseff. Ela considerou a ideia “rudimentar”. Estava ficando mais forte e, em torno dela, os economistas da velha guarda do PT se reuniram. Após a queda de Palocci, em 2006, a política econômica permanece com alterações periféricas, mas o grupo que havia ajudado Palocci já estava fora e restava apenas Meirelles, no BC, defendendo a política monetária.

O economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa, peça fundamental da equipe do primeiro governo Lula, avalia que o Brasil viveu duas fases de política econômica desde os anos 80:

— A primeira fase é mais liberal, voltada para inserção do Brasil na economia mundial, e vai do final do governo Sanery até o meio do período Lula. Depois, voltase à política de Geisel. Visões diferentes na economia há em todos os partidos, mas no governo do PT a política nacional desenvolvimentista ganhou força com a saída de Palocci e predominou após 2008.

A crise internacional de 2008 foi o momento considerado perfeito para a guinada mais heterodoxa. Primeiramente, as políticas de estimulo fiscal e monetário protegeram o país do pior da crise, mas em 2010 passaram a ser usadas com o objetivo de eleger a ex-presidente Dilma. No seu governo, esse caminho do descontrole fiscal, benefícios a empresários, intervencionismo e descuido com a inflação se aprofundou.

— A estagnação dos anos 80 é reflexo dos erros dos anos 70. E o crescimento dos anos 2000 é resultado das reformas dos anos 90. O Brasil voltou a errar no final do governo Lula e no governo Dilma e agora precisa fazer reformas estruturais, de longo prazo, para garantir o crescimento da década seguinte — disse Lisboa.

Um dos piores erros foi na política energética. Dilma errou ao segurar os preços em 2013 e depois teve que soltá-los de uma só vez em 2015. Quando foi feito o realinhamento tarifário, não havia como manter a repressão aos preços porque as empresas estavam quebrando. Dilma cometeu o erro sozinha: quis manipular o setor elétrico, em uma intervenção que se revelou desastrada, com o objetivo de usar isso em campanha. Hoje, reescreve a história e culpa a falta de chuvas. Mas o período seco só agravou a crise que ela criou.

Na área social, as políticas de transferências de renda ficaram mais fortes e foram responsáveis pelos resultados favoráveis em inclusão e aumento de consumo. Mas se não houvesse a estabilização monetária elas não teriam tido o mesmo efeito. Há muitos mitos nos números da retirada da pobreza. O PT fala deles como se fossem estáticos, mas a economia é dinâmica: ao gerar a crise, o PT retirou parcelas do grupo dos incluídos.

O governo Temer já está errando, na visão de Marcos Lisboa, quando faz reajuste salariais de servidores que beneficiam “o topo da pirâmide” e manda sinais ambíguos sobre o ajuste fiscal. É na economia que a política se perde ou se encontra.

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