sábado, julho 16, 2016

Eletrobras dominada por um Cardeal - MÁRCIO KROEHN

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Sucateada, sem dinheiro e com uma dívida bilionária. Esse é o resultado da ingerência política e da corrupção comandada pelo braço direito de Dilma Rousseff



Os fracassos dos leilões das linhas de transmissão foram a confirmação para o setor elétrico de que a situação da Eletrobras era preocupante. Desde 2012, cerca de 40% dos projetos apresentados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não recebem propostas de empresas privadas. No último certame, realizado em meados de abril, dos 24 lotes oferecidos, apenas 14 foram arrematados. Sempre que esses buracos apareciam, a estatal, maior empresa de energia da América Latina, era obrigada a arrematar as obras.

A Eletrobras servia como o ponto de equilíbrio e evitava que a falta de fios pudesse causar um descasamento, no futuro, entre as geradoras e as distribuidoras. Essa garantia não existe mais. Com um prejuízo de R$ 31 bilhões nos últimos quatro anos e uma dívida superior a R$ 40 bilhões, a empresa ficou sem caixa para investir, uma consequência do populismo de preços, da ingerência política e da corrupção sistêmica. “A corrupção e os baixos retornos são os dois gatilhos que levaram a empresa para o buraco”, diz Thais Prandini, sócia da consultoria Thymos Energia.

Com 14 subsidiárias em geração, transmissão e distribuição de energia e 178 participações diretas e indiretas em companhias do setor, como em obras das usinas de Belo Monte, Teles Pires e Jirau, os problemas da Eletrobras estão distribuídos por todos os lados. Um nome, porém, aparece como a principal ligação entre os esquemas fraudulentos que envolveram a empresa: o engenheiro elétrico Valter Cardeal. Temido por todos os participantes do sistema elétrico nacional, ele era conhecido por ser os olhos e os ouvidos da presidente afastada Dilma Rousseff.

A união entre eles é antiga e remete aos anos 1990, quando ambos ocupavam cargos públicos no Rio Grande do Sul. A estreita confiança fez com que trocassem o PDT pelo PT no início dos anos 2000. Quando Dilma assumiu o Ministério de Minas e Energia, Cardeal foi alocado na Eletrobras. Na gigante do setor elétrico, todos sabiam que ele trabalhava como operador de Dilma, assim como Pedro Paulo Leoni atuava, no início dos anos 1990, pelo então presidente Fernando Collor na Petrobras.

Entre 2007 e 2008, por exemplo, Cardeal ocupou a presidência da estatal e só escapou da Polícia Federal e do Ministério Público por influência da madrinha. Denunciado na Operação Navalha, que descobriu desvios de recursos em obras públicas, Cardeal foi acusado de gestão fraudulenta e irregularidades, mas ele não apareceu entre os 47 presos. O que mais impressiona no estilo de Cardeal é a franqueza. Os empreiteiros relataram aos investigadores da Operação Lava Jato os encontros que tiveram com o operador de Dilma para a construção da usina de Angra III.

Embora fosse executivo da Eletrobras, Cardeal assumiu as negociações pela Eletronuclear. O consórcio formado pelas construtoras Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e UTC pediu um desconto de 10% num contrato de quase R$ 3 bilhões. Cardeal concordou em conceder 6%, mas a diferença de 4% deveria ser depositada na conta do PT. Ele é apontado, também, como operador dos esquemas nas obras das hidrelétricas de Belo Monte e Jirau. A estimativa é que a corrupção na Eletrobras movimentou algo em torno de R$ 1,5 bilhão – o escritório americano Hogan Lovells coordena uma investigação interna para apurar os desvios na companhia desde junho de 2015 e deve apresentar o primeiro relatório nas próximas semanas.

Há dois anos, o balanço da Eletrobras tem questionamentos sobre o real valor dos desvios de dinheiro. Esse problema suspendeu a negociação da ação da empresa na bolsa de Nova York, que decidirá, em outubro, sobre a deslistagem do papel. Mas Cardeal não é o único responsável por sangrar a Eletrobras. Sua madrinha Dilma, que se dizia uma especialista no setor elétrico, colaborou diretamente com a situação pré-falimentar da empresa.

A decisão populista da presidente em baixar o preço da energia a força, em setembro de 2012, minou o caixa da empresa e de suas subsidiárias, reduziu os ganhos e retirou a possibilidade de realizar novos investimentos. O TCU calcula que para tirar R$ 16,8 bilhões por ano da tarifa, o governo arcou com R$ 61 bilhões. A empresa, já prejudicada por um sistema corrompido, acabou estrangulada por uma interferência política.

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