domingo, março 27, 2016

O tempo de Temer está acabando - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 27/03

Quanta paciência haverá com um governo de Michel Temer? Qual o risco de que atole na sarneyzação, incapaz de tomar medidas decisivas, limitado a administrar o desastre até a eleição de 2018?

Será um governo que tentará sair do pântano econômico enquanto forma coalizão capaz de aprovar "reformas" de imediato (se vier com desconversa, haverá sarneyzação).

Tal tentativa deve ocorrer no seguinte ambiente:

1) Líderes políticos ainda serão abatidos pela Justiça. Caso Temer não nomeie com cuidado, ministros podem cair, o que seria desastroso. Calar a Operação Lava Jato causará outras crises;

2) A campanha eleitoral pode tornar o Congresso mais avesso a mudanças impopulares;

3) É possível que "as ruas" antipetistas refluam; é provável que "as ruas" da esquerda ainda convulsionem o ambiente;

4) O Congresso será o mesmo que ajudou a dinamitar as contas públicas. No momento, não tem lideranças conscientes da crise fiscal e capazes de organizar as forças políticas, ora bandos livres de saqueadores legais ou ilegais de fundos públicos;

5) Entre essa gente, há expectativa de repetir o padrão de negócio político que chegou ao presente extremo de degradação. Lotear o governo entre oportunistas ineptos ou coisa pior não vai prestar;

6) Pode haver afobação liberalizante, exagero insensível e contraproducente na dose; há uma onda algo populista contra impostos, que podem ser necessários até para atenuar a crise social;

7) O Judiciário está falando demais, cada vez mais, fora dos autos, o que piora a confusão.

Ouve-se que a mera saída da presidente daria cabo do temor de malfeitos adicionais na economia. Daí a dizer que apenas a troca de guarda vai incentivar a retomada de investimento é especulação alegre. Outras consequências econômicas imediatas da queda de Dilma Rousseff devem ser tênues.

Não virá estímulo de gastos do governo. O fim dos choques de confiança causados por Dilma 2 deve ter efeito marginal no aumento do consumo das famílias.

Na oposição pensante, espera-se que Temer apresente um grande plano reformista liberal, de implementação e efeitos de médio a longo prazo, que, porém, incutiria confiança no futuro, destravando desde já os negócios. Pode ser que uma privatização agressiva ajude o investimento em 2017.

Que seja: isso leva tempo. Caso Temer assuma em maio e convença os donos do dinheiro de que vai agir para valer, as empresas que não estão avariadas começarão a pensar em mudar de ideia lá pelo último trimestre. De prático (investir), viria algo em 2017.

Ressalte-se o "empresas que não estão avariadas". Petrobras e empreiteiras chegaram perto da ruína, para ficar no óbvio. A crise e o dólar endividaram muita empresa boa. Os bancos avisam que vão sentir a onda de inadimplência a partir da segunda metade do ano; a Caixa está em situação difícil. De onde virá crédito?

O desemprego deve passar dos 9,5% de agora para 13% no fim do ano. A baixa da renda será inédita em quase década e meia. A dor social aumentará; pode ser intensificada com a frustração de ver que a troca de governo não promove logo melhorias.

Esse diagnóstico não é destino. Há curas possíveis. Mas o tempo de Michel Temer já está acabando.


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