domingo, janeiro 26, 2014

Exemplo argentino - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 26/01

A presidente Dilma Rousseff ganhou dos hermanos argentinos mais um motivo para levar a sério tudo o que ela e a equipe econômica prometeram ao mundo nos últimos três dias durante as reuniões do Fórum Econômico Mundial em Davos. Tarefas como o controle severo do gasto público para manter o paradigma dos superavits primários, o combate prioritário e sistemático à inflação, a manutenção de política cambial flutuante e transparente, além, é claro, do respeito absoluto a contratos. A isso, a presidente realçou a recente mudança do governo em relação à iniciativa privada, que passou a ser vista como parceira fundamental para deslanchar o investimento, ainda que isso signifique tolerar o pecado - antes grave, agora, apenas venial - da obtenção do lucro.

Era tudo o que os investidores internacionais queriam ouvir antes que desistissem de vez daquela economia promissora, que estava deixando de encantar o mundo. Foi-lhes garantido que o Brasil não pretende mais se desviar dos paradigmas que, desde a implantação do Plano Real, a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal e a adoção de política econômica com menor grau de intervenção do Estado - exceto quanto à regulação do sistema financeiro -, levaram o país a inédito reconhecimento como destino confiável de capitais de risco.

Enquanto o Brasil aproveitava a oportunidade para resgatar o crédito e falava ao mundo do capital sob o frio intenso do inverno suíço, seu maior parceiro no Mercosul via sua moeda derreter sob o forte calor da desconfiança da própria população. Apenas na tarde de quinta-feira, o peso despencou 12% em relação ao dólar no câmbio oficial, no qual, aliás, ninguém na bela Calle Florida acredita mais. A perda de reservas cambiais, que baixaram de US$ 52 bilhões para apenas US$ 29 bilhões, entre 2011 e 2013, refletem a dramática fragilidade da economia argentina.

Se hoje a maioria dos brasileiros com menos de 20 anos nunca ouviu falar no Clube de Paris - entidade que congrega 19 países com títulos soberanos a receber e com o qual o Brasil negociou e honrou os compromissos nos anos 1990 -, os argentinos são humilhados com o carimbo de maus pagadores, com conta pendurada de US$ 10 bilhões. A intervenção estatal nos mercados, inclusive com anacrônicos tabelamentos de preços, o atropelamento de contratos, o controle artificial do câmbio e o erguimento de barreiras irregulares (tarifárias e burocráticas) para dificultar importações, em vez de encarar a perda de competitividade, compõem o roteiro que, desde o calote da dívida externa, vem conduzindo a Argentina ao desastre.

São maus exemplos a serem evitados pelo governo brasileiro, assim como houve o bom senso de não dar ouvidos a quem defendia o não pagamento da dívida, como se o calote fosse patriótico e não produzisse nenhuma consequência. Aos hermanos, diferentemente do que fazemos quanto ao futebol, resta-nos desejar que se livrem logo do populismo que os atrasa. A Argentina próspera e competitiva é o parceiro que nos interessa e pode nos ajudar nas negociações com os grandes blocos econômicos.

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