sábado, maio 25, 2013

Os boatos e os limites - LEONARDO CAVALCANTI

CORREIO BRAZILIENSE - 25/05

Deveria existir uma linha para segurar ações políticas inconsequentes. Uma espécie de marcação, que funcionaria como limite de gestos, a última fronteira a ser respeitada, tal qual o alerta das plataformas de metrô e trens: se o senhor — ou a senhora — ultrapassar a faixa amarela, babau. O boato envolvendo o corte do programa Bolsa Família é um exemplo de como personagens do cenário político podem extrapolar nas declarações, avançando perigosamente no jogo partidário.

O presidente do Partido dos Trabalhadores, Rui Falcão, e a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, conseguiram chegar onde nem os mais radicais integrantes da torcida petista foram capazes de planejar. Menos de 24 horas depois da divulgação do boato, quando se teve a dimensão do fato, Maria do Rosário resolveu por conta e risco usar uma rede social para fazer a tal política de ultrapassar a faixa amarela. E foi para cima da oposição, acusando diretamente adversários políticos.

“Boatos sobre o fim do bolsa família deve (sic) ser da central de notícias da oposição. Revela posição ou desejo de quem nunca valorizou a política”, escreveu a ministra, que é formada em pedagogia. A declaração destoou do restante da equipe da presidente Dilma Rousseff na Esplanada. É que a ordem até aquele momento era de cautela. Afinal, nada indicava a origem do boato e o próprio ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tinha anunciado poucas horas antes a entrada da Polícia Federal no caso. Até ali, nada havia de concreto, por mais que os investigadores tenham avançado ao longo da semana e por mais que, a cada dia, aumentem as suspeitas de uma ação de fato orquestrada.

Faixa amarela
O que está no centro da questão é a precipitação das declarações. A própria Dilma fez um discurso duro contra os autores do boato, mas evitou ultrapassar a tal faixa amarela, preferindo denominar a ação de “desumana” e “criminosa”, algo que assessores palacianos já tinham feito no Twitter no próprio domingo, numa clara demonstração de jogo combinado nas declarações. Em nenhum momento do discurso no Recife, na segunda-feira, a presidente fez menção a oposicionistas. Luiz Inácio Lula da Silva seguiu o mesmo caminho e, questionado por jornalistas sobre eventuais motivações políticas, o ex-presidente, depois de defender o programa, disse simplesmente “eu não sei”.

As declarações de Dilma e de Lula são as possíveis, por ora. Até que se confirme oficialmente a origem dos boatos, qualquer frase de um político sobre isso não passava de especulação. E volta-se ao início deste texto. A oposição chegou pedir a convocação da ministra no Congresso, sugerindo a irresponsabilidade na declaração. Aqui, caímos no jogo político rasteiro. Afinal, o que mais os tucanos fizeram no domingo foi associar os boatos a uma estratégia petista para desestabilizar a oposição.

Um desses tucanos, de alta plumagem, chegou a comparar o boato da Bolsa Família com a privatização da Petrobras no então governo Fernando Henrique Cardoso. A única coisa que diferencia governistas e oposicionistas aqui é que, no caso da ministra, os primeiros ocupam cargos de relevância na República e precisam ser mais cuidadosos nos comentários. Ainda na segunda-feira, Maria do Rosário — possivelmente depois de levar uma bronca de Dilma — disse, na rede: “Gente, sobre tweet de hoje de manhã, quero dizer que não tenho nenhuma indicação formal da origem de boatos. Singela opinião. Não quero politizar”, publicou. “O importante é que todos os esclarecimentos estão sendo realizados. Escrevi bem cedinho e nem imaginei tal repercussão... Encerro o assunto.” Ah, tá.

Os petistas de fato deveriam ter encerrado o assunto por ali, mas o presidente do partido achou que não era suficiente. Rui Falcão avaliou os boatos como atos de terrorismo contra o PT e “principalmente contra o nosso governo”. Para ele, “o terrorismo eleitoral já começou”. É até possível que se confirme um ato orquestrado contra os petistas, como sugerem as primeiras apurações. Mas, no momento das declarações de Maria do Rosário e de Rui Falcão, ainda não existia nada. Assim, ou tinham alguma informação antes mesmo de Dilma ou simplesmente decidiram se precipitar.

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