domingo, março 17, 2013

A verdade da plástica - WALCYR CARRASCO

REVISTA ÉPOCA

Um amigo ligou entusiasmado:

– Vou fazer uma lipo!

Duas frases depois, descobri que, no final da intervenção, pretendia voltar dirigindo.

– É uma loucura! – disse. – Já fiz e preferi dormir na clínica.
– Mas o médico disse que não tem problema!

Contei meu caso:

– Quando acordei da anestesia, ainda fiquei tonto um bom tempo. Seria arriscado dirigir. Por sorte, não tive dores. Algumas pessoas têm. Além disso, você estará com o colete.

– Ahn?

Expliquei que quem faz lipo deve usar um colete modelador no abdome, durante uns dois meses.

– É quente. Nos dias de calor, eu me sentia como um salmão defumado.

Do outro lado da linha, só ouvia murmúrios incrédulos. Meu amigo é divorciado, pai de um menino pequeno. Falei:

– Não se arrisque. Pense no seu filho.

Há muitos anos, uma amiga, a atriz Ivete Bonfá, que chegou a atuar numa das minhas peças de teatro, fez lipo e plástica facial. Voltou para casa. Algumas horas depois, sentiu dores. Ao chegar ao hospital, era tarde. Teve septicemia e morreu. Depois desse exemplo dramático, meu amigo arrumou alguém para acompanhá-lo. No dia seguinte, me agradeceu:

– Me senti mal. Tive de deitar. Senti enjoo e tontura.

Médicos amenizam as notícias. Um bom profissional detecta o cliente com quem pode falar francamente sobre uma doença grave ou aquele que prefere não saber o que há de ruim. Se alguém chega à emergência torto numa maca, o médico diz aos familiares:

– Não se preocupem. Depois dos exames, teremos um quadro da situação.

O que mais pode falar? Em todo caso pode haver uma reviravolta, até nos mais inesperados. O profissional médico acredita que pode fazer alguma coisa pelo paciente e transmite essa sensação. Muitas vezes, na cirurgia plástica, o profissional ameniza demais. É até um incentivo, já que puxar o rosto acaba sendo questão de escolha. Após um regime, certa vez resolvi tirar a pele da papada. Escolhi o plástico e me internei numa clínica particular. A enfermeira veio me preparar. Disse:

– Não dói. Só o capacete é desconfortável.
– Queeeee.... capaceeeeete? – perguntei.

Acordei transformado em múmia. Em plásticas faciais, os pacientes são submetidos a um capacete de gaze, que comprime o rosto. Respira-se por dois furinhos no nariz e um na boca. Comida, só líquida, de canudinho. Em algumas técnicas, dura 24 horas. Noutras, 48. A sensação de claustrofobia é incontrolável. Chafurdei em tudo o que aprendi sobre meditação zen a vida inteira para não pirar:

– Respire fundo. Você vai se acalmar. Vai se acalmar! – dizia para mim mesmo.

Soube mais tarde que pacientes exaltados arrancaram os capacetes, sem se importar com mais nada. Nem mesmo em ficar piores do que antes da operação. Uma amiga resolveu arredondar o traseiro. Onde o cirurgião mostrou as próteses de silicone que aplicaria em sua silhueta. A certa altura, teve dúvida.

– Vou passar a vida inteira com a sensação de estar sentada numa almofada?
– Beeem...

Mesmo assim, fez. No pós-operatório, mais uma descoberta incômoda: devia passar um mês sem sentar. Dormir, só de bumbum para cima. Reclamou:

– Doutor, você disse que eu podia continuar trabalhando.
– Trabalhar, pode. Mas sem sentar.

Quem bota silicione nos seios frequentemente tem de manter as mãos abaixo do pescoço um bom tempo.

– Tive uma cliente que não conseguia comer sozinha – diz um fisioterapeuta.

Depois da operação, Branca de Neve pode acordar como Frankenstein. Há o caso de uma mulher que namorava o cirurgião. No auge da paixão, fez lipo, seios e puxou os olhos, tudo de uma vez. Foi o caos. O pombinho perfurou seu pulmão ao botar o silicone. Não arrematou a lipo. Puxou demais os olhos, que ficaram tortos. Aos R$ 15 mil planejados, teve de acrescentar uma semana de UTI. Até hoje faz tratamento para consertar os olhos: Botox para impedir que fechem, pois às vezes as pálpebras se comportam como persianas descontroladas; peeling para revigorar a pele. Quer parecer com ela mesma antes da plástica! O romance com o médico acabou, e ela pensa processá-lo.

Mesmo assim, sou a favor de plástica. Costumo dizer que com a idade a gente tem duas opções: parecer uma ameixa ou um pequinês. Determinar os prós e contras é uma questão pessoal. Mas o otimismo dos médicos precisa de uma cirurgia.


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