quinta-feira, janeiro 17, 2013

O "espírito animal" - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 17/01


Há algum tempo se discute no país o que é preciso fazer para despertar o "espírito animal" do investidor para que voltemos a crescer. O termo é de John Maynard Keynes em "A teoria geral do emprego, do juro e da moeda" (1936). Quando fala das expectativas de longo prazo, ele escreve que a hora certa para investir se dá quando o "espírito animal", tipo especial de confiança, sobrepõe-se a cálculos matemáticos. "Isso acontece quando o receio do prejuízo, que volta e meia acomete os pioneiros, é colocado de lado como um homem saudável esquece a expectativa da morte".

Esse "otimismo espontâneo" geraria uma inclinação natural "para a ação, em vez da inação", fazendo a "engrenagem" da economia girar. A presidente Dilma tem chamado para conversas privadas ou coletivas os mais importantes empresários brasileiros, numa demonstração de que afinal compreendeu que precisa se comunicar diretamente com eles para dissipar eventuais dúvidas que os fazem recalcitrantes diante da possibilidade de ampliar investimentos no Brasil.

Esse "espírito animal" que o governo pretende despertar depende, no entanto, muito mais de atitudes concretas do que de conversas. A economia este ano será crucial para as pretensões da presidente Dilma de se reeleger, não apenas para viabilizá-la junto ao eleitorado como para desmobilizar movimentos internos no PT e na base aliada para a volta de Lula, que parecia fora das cogitações do ex-presidente, mas passou a ser um dado fundamental do xadrez político a partir do momento em que Lula viu-se acuado por uma série de denúncias, existindo a possibilidade de que venha a ser investigado sobre o mensalão.

Para reagir ao que considera uma campanha de desconstrução de sua imagem, Lula começou a sugerir uma possível volta ao cenário eleitoral, para alimentar uma expectativa de poder que o fortalece e protege de ameaças. Lula pretende sair pelo país em viagens para enfrentar a tal campanha diante do povo, e a ala petista descontente com a gestão da presidente Dilma, assim como políticos de diversas tendências abrigados na aliança governamental, também se anima com essa possibilidade, pois Lula sempre teve uma relação com os políticos mais próxima do que a presidente Dilma.

As políticas assistencialistas do governo certamente são a base de sua popularidade, mas talvez essa imagem de distância do mundo político permita que ela seja tão popular mesmo sem ser nada carismática. Já o carisma de Lula o mantém altamente popular mesmo com a revelação constante de sua leniência com políticos de todas as tendências.

Exatamente porque a economia será uma definidora fundamental das chances de reeleição da presidente Dilma, os políticos começam a abrir os olhos para o que está ocorrendo nessa área, e outro tipo de "espírito animal" começa a se manifestar: o que faz com que procurem com lupa sinais que identifiquem as reais possibilidades de cada potencial candidato à Presidência em 2014.

Esse "espírito animal" faz com que seja pule de dez o apoio à reeleição de Dilma se a economia se recuperar nestes dois anos, mesmo que não venha nenhum "pibão".

Mas o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, está sendo identificado como uma peça fundamental nesse jogo, e sua habilidade política de se manter na base aliada "até 2013", deixando aberta a possibilidade de candidatura própria, tem chamado a atenção de seus pares. A candidatura do senador Aécio Neves (PSDB) ainda não se inclui na lista das possibilidades reais, pela fragilidade da oposição e pelos problemas tucanos internos. Mas a capacidade de Aécio de formar alianças faz com que ele não seja desprezado nessa corrida, ainda mais se a situação econômica corroer a imagem da presidente. A presença de Marina Silva e seu novo partido no páreo é outro elemento importante nas análises, e não escapa aos políticos a possibilidade real de um grande acordo oposicionista, em eventual segundo turno, unindo esses três candidatos.

O que não foi possível em 2010 porque no segundo turno a alma petista de Marina acabou rejeitando um acordo com o tucano José Serra que poderia levá-lo a vencer Dilma. A eleição de 2014 começa a ser jogada este ano e está nas mãos do "espírito animal" dos investidores e dos políticos.

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