domingo, janeiro 22, 2012

Brasil, nação classe C - GUILHERME FIUZA

REVISTA ÉPOCA


O presidente ficou conhecido como "o filho do Brasil", por ser "gente como a gente". "A gente" quem, cara-pálida?

Dilma Rousseff declarou que "queremos um país de classe média". É a primeira governante a anunciar como deve ser a pirâmide social. Desde o lema da ditadura do proletariado não se ouvia algo parecido. Aparentemente, a doutrina Dilma substituiu a dialética pela aritmética: para resgatar os muito pobres é preciso acabar com os muito ricos. Um Eike Batista será transformado em alguns milhões de emergentes da classe C. Talvez eles formem uma cooperativa para cuidar das jazidas de Eike. Ou então acabarão de uma vez com esse negócio de explorar ouro e petróleo, que são coisas de rico.

Já estava mesmo na hora de eliminar a elite da vida brasileira. E não só pelo aspecto econômico. Foi profundamente incômodo ao país ser presidido por um intelectual cultivado, cheio de títulos acadêmicos. Dentre outros comportamentos elitistas, esse presidente acabou com o compadrio na área econômica do governo, impondo a virtude como critério. Ou seja: um desumano, insensível aos apelos de um amigo, parente, afilhado ou cabo eleitoral.

Nesse período, a economia brasileira saiu das trevas, mas o país só ficou à vontade quando foi entregue a um ex-peão. A nação ficou aliviada sob um presidente que empregava os companheiros, que não se importava em maltratar a língua, que se orgulhava de não ler jornais, que fazia o elogio da ignorância - ufanando-se da sua própria falta de estudos, ao cantar vitória sobre o antecessor diplomado. O símbolo máximo dessa cultura (sic) foi a distribuição pelo MEC de livros ensinando uma espécie de português não contabilizado ("nós pega o peixe" era uma das novidades do idioma).

Esse presidente ficou conhecido como "o filho do Brasil", por ser gente como a gente. Você perguntaria: "'A gente' quem, cara-pálida?". Evidentemente, uma pergunta elitista. Cheque seu passaporte, porque você talvez não caiba no Brasil de classe média.

Fora um certo sotaque fascista, até que a ideia do nivelamento geral de um povo poderia ter seus encantos. Nessa grande nação classe C, não existiria mais, por exemplo, o golpe do baú. As moças interesseiras teriam de mudar de ramo, porque não valeria mais a pena cavar um casamento para continuar na mesma classe social. (Esclarecendo que o mesmo raciocínio vale para os rapazes interesseiros. No império da igualdade, é mais prudente tirar a média de tudo, até dos sexos.)

Nessa doce sociedade mediana, as ambições também terão de estar niveladas, para garantir que todos sejam iguais perante suas contas bancárias (ou mais ou menos iguais, vá lá). Isso acabará com um dos grandes problemas do capitalismo, que é a exploração do homem pelo homem. Estando quase todo mundo na classe C, a mais-valia sairá de moda. E, não havendo mais nenhuma outra classe relevante, essa imensa e única classe média poderá, por que não, ser rebatizada de classe A - num grande final feliz que nem Aguinaldo Silva imaginaria, muito menos Karl Marx.

A erradicação da elite, a partir do postulado de Dilma Rousseff, traria benefícios imediatos ao funcionamento do país. Ministros como Fernando Pimentel e Mário Negromonte poderiam sair de seus esconderijos e voltar ao trabalho, sem a imprensa burguesa e elitista para fuxicar seus negócios no governo popular. Pelo mesmo motivo, a presidente não precisaria gastar todo o seu primeiro ano de governo tentando segurar ministros que caíam de podres. Sobraria-lhe mais tempo para trabalhar nas fundações do seu Brasil médio. E que país seria este?

Seria um país muito mais tolerante. Além das liberalidades no uso da língua portuguesa e do dinheiro público, a mentalidade média que emerge da sociologia governamental muda inteiramente o conceito de responsabilidade. Por exemplo: o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, teve a carteira de habilitação apreendida por dirigir em excesso de velocidade e falando ao celular. De cara limpa, tranquilo, apareceu no Detran confirmando seus delitos e anunciando que "retomará os parâmetros de civilidade".

Já o hábito da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, era estacionar em local proibido. Ela também apareceu sorridente, prometendo que não vai mais fazer isso não.

Tudo normal. Tudo médio. Inclusive os parâmetros de civilidade e humanidade.

Cadê a ala dos mensaleiros? - REVISTA ÉPOCA



O tema da Gaviões da Fiel neste Carnaval é a exaltação (e bajulação) ao mais célebre dos corintianos, o ex-presidente Lula. Nunca antes na história deste país a escola conseguiu tanto dinheiro de patrocínio - nem tantos políticos interessados em mostrar samba no pé


Quem for à avenida assistir ao desfile da escola de samba Gaviões da Fiel em homenagem ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve estar preparado para uma daquelas obras de fantasia de que só a folia do Carnaval brasileiro é capaz. Estão lá as alas que, previsivelmente, aludem a programas como o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, ProUni e Luz para Todos - além de uma bateria vestida com macacões de metalúrgico e de uma coreografia inspirada no escorpião, o signo de Lula no zodíaco. Mas o ziriguidum vai além.

Lembra quando o governo Lula tentou criar um conselhão de jornalismo para tentar controlar a mídia? Pois a Gaviões vem aí com uma descabida ala da liberdade de imprensa... Lembra quando o PT, num primeiro momento, cogitou não assinar a Constituição de 1988? Pode então deixar o samba rolar para a ala de exaltação ao desempenho de Lula e dos petistas na Constituinte. E abre alas para os passistas vestidos de notas de real que desfilarão pelo sambódromo (seria uma desajeitada referência ao plano econômico que estabilizou nossa economia e foi bombardeado por Lula e pelo PT desde a primeira hora?). E que dizer do maior esquema de corrupção de que o país já teve notícia? Cadê a ala dos mensaleiros? Ou do ditador iraniano favorável ao apedrejamento de mulheres e apoiado por Lula? Cadê o carro alegórico do Ahmadinejad? E do dólar na cueca? E... bem, não importa, minha gente. Tem Lula na avenida. É Carnaval, eeê ooooôôô ....

Como peça de marketing, o desfile da Gaviões não deixa nada a desejar às alegorias e aos adereços de um Duda Mendonça. A sequência de alas apresenta alguns delírios característicos dessa forma peculiar de construção cênica conhecida como desfile de escola de samba. Num dos pontos altos, o sambódromo será tomado por passistas fantasiados de borboletas. Foi a forma que o carnavalesco Igor Carneiro encontrou para representar uma das frases mais conhecidas de Lula, dita em dezembro de 2007, quando ele procurava justificar sua mudança de posição em relação à CPMF, o imposto sobre transações financeiras criado para financiar a saúde. Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o PT criticava o imposto. No poder, precisou do dinheiro para fechar as contas. Lula, com seu pragmatismo, mudou de opinião e se saiu com uma citação de Raul Seixas: "Eu não tenho vergonha e muito menos tenho razão para não dizer que eu mudo de posição e há muito tempo eu digo que prefiro ser considerado uma metamorfose ambulante".

Quando descobriu que o PT se recusou a assinar a Constituição de 1988 - e só o fez posteriormente com ressalvas, Carneiro diz que levou um susto e cogitou excluir a ala da Constituinte. "Mas aí encontrei um discurso recente do Lula, de quando ele era presidente, dizendo que, se ocorresse o que o PT queria, ele teria dificuldade de governar", diz Carneiro. Essa recente metamorfose de Lula bastou para preservar o que estava planejado. E quanto à ala da "Liberdade de Imprensa"? Obviamente a Gaviões esqueceu o capítulo da difícil e tensa relação entre o governo Lula e a imprensa livre, marcada pelas tentativas de setores do PT de introduzir o que era chamado de "controle social da mídia", um eufemismo para a censura.

As escolas de samba endeusam seus homenageados desde muito antes de o ditador Getúlio Vargas, por meio de seu Departamento de Imprensa e Propaganda, apoiar as agremiações que falavam bem dele e suas realizações. Também já faz tempo que as escolas de samba adotaram o esquema do "enredo patrocinado", exaltando Estados, cidades ou mesmo setores da economia em busca de dinheiro. Neste ano, a Porto da Pedra carioca falará do esplendor e da glória do... iogurte. O motivo? O dinheiro de uma indústria de laticínios.

Homenagear Lula, no entanto, é um negócio muito melhor. Graças a seu enredo, a Gaviões da Fiel fará um dos desfiles mais caros de seus 43 anos de história. A agremiação vai gastar R$ 3,5 milhões, um terço a mais que a escola gastou nos últimos carnavais. "No ano passado, nosso enredo era sobre Dubai", diz Carneiro. "Não apareceu nenhum interessado em patrocinar." Neste ano, numa folia bajulatória, choveram ofertas de patrocínio, a ponto de algumas terem sido recusadas. TIM, Schin, RedBull, Consigaz e Água de Cheiro ajudarão a bancar o desfile. "É porque é o Lula, né?!", diz Carneiro. "Estamos de portas abertas para os caminhões de dinheiro", diz o presidente da Gaviões, Antônio Alan, conhecido como Donizete, em tom de piada.

O plano de transformar o corintiano Lula em enredo vem sendo desenhado pela Gaviões há mais de um ano. A ideia teve pronto apoio do presidente do Corinthians, Andrés Sanchez. Graças ao apoio de Lula, Sanchez conseguiu que seu time ganhasse um estádio financiado com dinheiro público. Foi ele, habitué da quadra da escola às sextas-feiras à noite, quem intermediou o convite a Lula. O ex-presidente já fora procurado pelas escolas Portela e Vila Isabel, ambas cariocas. Declinou dos dois convites. A turma da Gaviões caprichou no convencimento. Em maio passado, Sanchez, Donizete, Carneiro e outros dirigentes da escola foram à sede do Instituto Lula mostrar todos os detalhes do desfile. Ao longo de duas horas, apresentaram ao ex-presidente cada paetê em PowerPoint e ouviram alguns pitacos do ex-presidente, de seu filho, Lulinha, do ex-ministro Luiz Dulci e do presidente do PT em São Paulo, Edinho Silva.

Além de empresas patrocinadoras, o enredo sobre Lula atraiu um cordão de políticos que normalmente não se interessariam pelo chuvoso carnaval paulistano. O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), se deslocará para São Paulo, tratada desdenhosamente pelos cariocas como "túmulo do samba", para sambar em homenagem a Lula. Vascaíno e mangueirense, Cabral vestirá a fantasia de Metamorfose Ambulante. Outro passista de luxo deverá ser o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Ele foi convidado por Lula a abandonar os trios elétricos do Galo da Madrugada, no Recife, e se juntar à festa petista. Com os governadores, cerca de 20 parlamentares, federais e estaduais, mostrarão sua ginga e malemolência na passarela. A organização da ala ficou a cargo do deputado estadual Donisete Braga (PT-SP). Cada fantasia custa R$ 600. Braga afirma que a disputa entre os políticos foliões é grande. Um dos que já confirmaram presença é o deputado federal José Mentor (PT-SP), citado nos autos do mensalão.

Os governadores Sérgio Cabral, do Rio, e Eduardo Campos, de Pernambuco, já confirmaram presença no desfile paulistano

Os sindicalistas também aderiram com força ao desfile e sambarão ao som de Vai meu gavião/ Cantando a saga do menino sonhador/ Um filho do sertão, cabra da peste/Irmão/Que deus pai iluminou! Em nome da Força Sindical, o deputado Paulinho da Força (PDT-SP), adversário político de Lula no passado em que o PT não era governo, comprou uma ala inteira, batizada de Profissão Cidadão. Nela, desfilarão os filiados da Força. Quando soube que sua principal rival comprara uma ala, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) não marcou passo. As 100 fantasias da ala Sindicalismo foram compradas pela CUT. São vendidas a R$ 450 cada. Informada de que fora atravessada no samba, a União Geral dos Trabalhadores (UGT), ligada ao PSD do prefeito paulistano Gilberto Kassab e flerte antigo dos tucanos, correu para sair nas mesmas condições das outras centrais. "A Força já apoiou o Serra, mas eles mudaram de ideia", diz Ricardo Patah, presidente da UGT. "Política é como nuvem, uma hora está de um jeito, outra hora de outro."

Pelos planos traçados pela Gaviões, Lula participará do desfile ao lado da mulher, dona Marisa, e dos filhos. Para a aparição da família Silva, a escola construiu um palco armado no último carro alegórico do desfile. Há duas semanas, a filha Lurian apareceu num ensaio na quadra da escola de samba e pediu adaptações em sua fantasia, originalmente um biquíni, para torná-la mais comportada. Como Lula está em tratamento de um câncer na laringe - ao receber a notícia da doença, sua primeira reação foi perguntar ao cardiologista Roberto Kalil se o tratamento permitiria que ele desfilassse -, há dúvidas sobre sua presença. Os dirigentes da Gaviões chegaram a pensar em construir uma estátua de Lula, com 13 metros de altura, para suprir sua possível ausência. Mas desistiram da ideia. Eles sabem que, sem Lula em carne e osso, o desfile perderá muito de seu impacto

Que tal fechar as escolas ruins? - GUSTAVO IOSCHPE

REVISTA VEJA

No apagar das luzes da gestão Haddad, o Ministério da Educação decidiu cortar 50 000 vagas de cursos universitários de "baixa qualidade", que não tinham atingido a nota mínima no mecanismo de avaliação do ministério. Mais de 30 000 das vagas cortadas são da área de saúde. A lógica dos cortes é elevar a qualidade do sistema universitário, fazendo com que as melhores instituições possam crescer adicionando as vagas subtraídas das más instituições e a população seja protegida de profissionais despreparados.

A maioria das pessoas parece concordar com a medida, e até jornais liberais a apoiaram em editorial. Se você concorda com ela, gostaria de ir um passo adiante e recomendar que também sejam cortadas todas as vagas de escolas de educação básica de má qualidade. Se a lógica vale para o sistema de ensino superior, por que não haveria de valer para a educação básica, que é certamente ainda mais importante para o país e açambarca um número consideravelmente mais alto de alunos (51 milhões, contra 6 milhões do ensino superior)? O corte de matrículas na educação básica faz muito mais sentido do que no ensino superior. Primeiro, porque, enquanto os alunos da educação superior são jovens e adultos que têm a capacidade cognitiva para passar por todo um sistema educacional e também por um vestibular ou Enem e, portanto, possuem todas as condições de saber qual é a qualidade da faculdade em que estão ingressando, os alunos que entram em uma escola na 1ª série têm reduzidas (para não dizer nenhuma) condições de saber a qualidade daquela escola. O primeiro indicador oficial de qualidade de uma escola, o Ideb, é divulgado a partir do 5° ano (o MEC tem outro, que mede a alfabetização nas primeiras séries, mas se recusa, para não desagradar às corporações do ensino, a torná-lo compulsório ou publicar seus resultados). Em segundo lugar, frequentar o ensino superior é uma escolha, enquanto a educação básica é compulsória; é mais lógico proteger alguém de um mal obrigatório do que de outro, opcional. Finalmente, faz um grande sentido financeiro adiantar a extinção das vagas. Se quem será mau profissional deve ficar na ignorância, faz mais sentido começar o corte lá pelo 3° ou 4° ano da escola. Como é óbvio que um aluno analfabeto jamais poderá ser um profissional competente, para que gastar anos de sua vida e muito reais com merenda, transporte, livros, professores e escolas se ele já está condenado? A maioria dessas pessoas vai sair da escola mesmo ao longo dos anos - temos 3,2 milhões de alunos na 1° série do ensino fundamental, mas só 2,2 milhões no último ano do ensino médio -, então por que não tornar o processo mais objetivo e chancelado pelo governo, em vez de causar prejuízos aos cofres públicos e perda de tempo e dinheiro aos alunos e seus pais?


Se a lógica de fechar cursos insatisfatórios vale para o sistema de ensino superior, por que não haveria de valer para a educação básica, que é certamente ainda mais importante para o país?


Talvez você esteja pensando que a educação é um direito do cidadão; não poderia, portanto, ser suprimido. Em tese, concordo. Mas veja os resultados da Prova ABC, aplicada no ano passado pelo Inep e por ONGs em alunos do 3° ano: ela mostrou que quase 60% dos estudantes não aprendem o mínimo esperado para essa série em matemática e quase 45% em leitura. Não dá para chamar de "educação" o que ocorre em pelo menos metade das nossas escolas, portanto. Cortar vagas, nesses casos, não seria homicídio, mas eutanásia.

Como você gosta do método do MEC para o ensino terciário, certamente não se oporá à sua utilização na educação básica. O MEC corta vagas dos cursos que tiveram notas 1 e 2 no Índice Geral de Cursos (IGC). Na educação básica, o índice semelhante é o Ideb. Diferentemente do IGC, que vai de 0 a 5, o Ideb vai de 0 a 10. Para chegar ao mesmo nível de qualidade nas escolas, basta cortar as vagas daquelas que têm notas de 0 a 4 no Ideb, portanto. Como a média do país no Ideb está em torno de 4, e como a distribuição dessas notas deve ser gaussiana, estimo que cortar vagas das escolas com Ideb igual ou menor que 4 subtrairia aproximadamente metade do total de alunos na educação básica. Assim, em pouco tempo, provavelmente nem teríamos mais de cortar vagas nas universidades, pois todos aqueles que passassem pela faxina e chegassem ao ensino superior certamente seriam muito capacitados. Também acabariam os problemas de inflação de salários em profissões como babás, empregadas e peões da construção civil, pois o que não faltaria seria gente totalmente ignorante no mercado.

Claro, o que vai acima é um exercício de absurdo. As pessoas só não o percebem dessa maneira quando é aplicado ao ensino superior porque estamos falando de 50 000 pessoas, e não de 50 milhões. Na verdade, nem são 50 000 as pessoas afetadas, porque, como mostrou reportagem da Folha de S.Paulo, 73% das vagas cortadas estão ociosas, ou seja, as instituições as oferecem, mas os alunos não as preenchem.

Cortar vagas em instituições de ensino, no Brasil de hoje, é não apenas uma estupidez, mas crime de lesa-pátria. Porque o Brasil está fracassando terrivelmente em formar jovens com ensino superior, que são - e serão cada vez mais - determinantes para o desenvolvimento do país. O Brasil matricula pouco mais de 20% de seus jovens no ensino superior. Alguns de nossos vizinhos latino-americanos, como Peru, Chile, Venezuela e Uruguai, têm taxas de matrícula que são o dobro. Países da Europa têm taxas de matrícula na casa dos 50% a 70%. E alguns países, como Coreia do Sul, EUA e Finlândia, estão chegando perto da universalização do ensino superior. Imagine para que países irão os empregos com maiores salários, que dependem da capacidade de geração de bens e serviços de alto valor agregado. Imagine que países desenvolverão a pesquisa tecnológica inovadora. Nós ou eles?

A ideia de que é bom cortar vagas é uma mistura de preguiça intelectual com realismo mágico. Porque as pessoas ouvem falar que uma enfermeira matou um paciente ao colocar vaselina em vez de soro na injeção e então, indignadas e pensando com o fígado, bufam: "Precisamos proteger a sociedade de profissionais como esses! Vamos atacar o problema na fonte, fechando as más escolas formadoras!". O.k. Vamos presumir que o IGC seja um bom indicador para medir a qualidade dos cursos universitários (não é) e também que o principal culpado pelo fato de a vaselina ter sido usada no lugar de soro seja a formação da enfermeira, e não a desorganização do hospital, o cansaço da enfermeira ou simplesmente a falibilidade humana. Então cortamos a vaga, e evitamos que os "maus profissionais" se tornem enfermeiros. médicos ou contadores - sim, o MEC cortou vagas dos cursos de contabilidade, já que todos nós sabemos que um contador incompetente pode tirar milhares de vidas (?). Multiplique isso por 1 000 ou 50 000. O que acontece? Digamos que cada "mau profissional" atenda dez clientes por dia. Então serão 500 000 clientes desatendidos por dia. Não com um mau atendimento com um atendimento um pouco abaixo do ideal: zero. Em vez de terem maus contadores, médicos ou enfermeiros, as pessoas não terão nenhum. O que acontece quando são subtraídos de um mercado profissionais para os quais há demanda? Se há uma economia de mercado, em que os preços se reajustam livremente, o preço cobrado pelos profissionais que ficam no mercado sobe. Para os ricos, isso não fará muita diferença. Mas para os pobres o aumento de preço pode ser a diferença entre ter condições de ser atendido e não ter. Se os preços forem controlados, como no sistema público, por exemplo, as enfermeiras e os médicos que ficarem não poderão cobrar mais, mas terão de atender mais pacientes. Como o tempo de trabalho é finito e a oferta de gente qualificada é menor do que a demanda por seus serviços, isso significa que os pacientes demorarão mais para ser atendidos, ou morrerão antes do atendimento. É fácil ficar indignado com vaselina na seringa, porque vira notícia. Mais difícil é lamentar os milhares de casos anônimos de gente que morre em casa por não ter atendimento médico ou por ser atendida por um ótimo médico estafado por ter de dar conta de uma demanda sobre-humana. Esses casos permanecem no limbo. Assim como o dos milhares de presos pobres e inocentes que não podem pagar um advogado e em locais onde não há defensores públicos que cheguem.

O realismo mágico a que me referia é o de pessoas que acreditam que o mundo é binário, em que há profissionais bons e ruins, instituições boas e ruins, e que, se cortarmos as instituições ruins, é claro que suas vagas serão ocupadas pelas instituições boas, que formarão bons profissionais. Mas a realidade é mais complexa.

O aluno que frequenta uma universidade mal avaliada não o faz porque é burro ou está sendo enganado, e sim porque aquela é a melhor instituição em que conseguiu entrar, ou a mais barata com que seu bolso pode arcar. Se essa vaga for cortada, portanto, ele não vai estudar na USP nem na FGV. Vai ficar sem estudar. A tônica de um país em desenvolvimento, como o nosso, é justamente a existência de desequilíbrios: há mais demanda do que oferta, e não há gente qualificada para atender a todos. Não só na medicina, mas em todas as áreas, do conserto do carro ao transplante de medula. Não há como gerar atendimento de Primeiro Mundo a todos porque simplesmente não há gente que chegue com qualificação de Primeiro Mundo. É demagogia querer oferecer uma sensação de proteção contra erros. Erros acontecerão. A questão não é o que fazer para acabar com eles, porque isso é impossível, mas sim o que fazer para minorá-los. E a saída certamente passa por ter mais gente com alguma qualificação, não menos. É melhor ter gente com qualificação insuficiente do que com qualificação nenhuma. Às vezes digo isso e as pessoas me perguntam: "Mas você gostaria de fazer uma ponte de safena com um médico formado por uma dessas universidades caça-níqueis que ficam em cima de uma padaria?". É claro que não. Nem eu nem ninguém. Num mundo ideal, só gostaria de ser operado pelo melhor médico do mundo naquela especialidade. Mas no mundo real a maioria das pessoas não terá dinheiro para se operar com o melhor do mundo, e, mesmo que tivesse, esse profissional não teria tempo para atender a todos.

No mundo real, para grande parte das pessoas, ou elas vão ser operadas pelo médico ruim ou não vão ser operadas por ninguém. Se eu estivesse num avião e sofresse um infarto, é claro que gostaria que o meu vizinho de poltrona fosse um cardiologista renomado. Mas, se não tiver essa sorte, prefiro que o vizinho seja um médico de quinta categoria, ou até mesmo um aluno dessa universidade-padaria, a que seja alguém que teve de virar carteiro porque, justo no ano em que iria prestar o vestibular para medicina na única faculdade em que conseguiria entrar, veio um burocrata de Brasília e resolveu cortar aquela vaga.

A turma do SOPA não entendeu nada - PAULO MOREIRA LEITE

REVISTA ÉPOCA


Numa hora em que tantas pessoas prestam atenção na blogueira cubana Yaoni Sanchez, também é muito relevante discutir o SOPA e o PIPA.

São situações parecidas mas, estranhamente, nem todos se comovem da mesma forma, como se não tivessem percebido ou não quisessem perceber que se trata do mesmo problema, numa escala muito mais grave e ameaçadora.
A repressão sofrida pela blogueira é injusta e merece repúdio. Mas o SOPA e o PIPA representam uma ameaça concreta à liberdade em países que se orgulham de garantir direitos democráticos a seus cidadãos, coisa que o regime dos irmãos Castro nunca disse que pretendia fazer depois que tomou o poder, em 1959.
Os projetos de controle da internet representam um risco grave e imediato. Isso ficou claro ontem, nos protestos que envolveram diversos sites no mundo inteiro.
O efeito não tardou. Pelo menos 18 senadores americanos já retiraram seu apoio ao projeto. O risco dele ser aprovado não acabou mas tornou-se menor. Barack Obama já disse que não irá assinar nenhuma lei que implique em criar censura na internet.
Em sua coluna de hoje, em O Globo, Cora Ronai explica: se os projetos de lei em discussão no Congresso americano forem aprovados, “a rede com que colaboramos e que se formou graças ao conteúdo produzido e compartilhado por nós mesmos se transformaria numa estufa censurada, onde só se encontraria o que passasse pelo crivo da industria americana.”

Outro autor que compara o SOPA à uma censura é Ethevaldo Siqueira, colunista especializado em tecnologia do Estadão e insuspeito de qualquer antipatia por empresas privadas.
Ele recorda que, caso o SOPA venha ser aprovado, poderá “se transformar em péssimo exemplo dos EUA para o mundo, inspirando muitos países a adotar formas semelhantes “de censura, de repressão e bloqueio de sites, hoje só praticadas pela China, Irã, Coréia do Norte, Cuba e poucos outros países.”
Traduzindo: longe de ser um risco apenas para o cidadão americano, essas leis ameaçam o espaço de comunicação e cidadania que a internet ajudou a criar ao longo de 20 anos. Considerando o domínio americano nas inovações tecnológicas — há uma década o New York Times definiu a internet como uma colonia dos EUA — não há dúvida que toda medida tomada em Washington terá reflexos imediatos no mundo inteiro.
Não estamos falando de países periféricos nem fechados. Mas do maior PIB mundial, com um imenso poder de retaliação e capacidade de impor interesses. Uma das forças por trás dos leis em debate é o cinema americano, que retira uma fatia enorme de suas receitas do mercado externo. Outra força é a industria de comunicações, que faz movimentos na mesma direção.
O que está em questão é a natureza profunda da Internet.

Se há algo de revolucionário na Internet, o SOPA e o PIPA representam Termidor, a reação conservadora, que pretende restaurar uma ordem que deixou de fazer sentido neste universo.

Criada por cientistas que procuravam um espaço para facilitar o avanço do conhecimento, sendo muito utilizada por militares nos primeiros anos, a internet não é um produto de empresas privadas nem nasceu sob a lógica do lucro. É obra de millhões de cidadãos que todos os dias acessam sites, trocam mensagens, defendem idéias.
Nasceu sob a lógica dos espaços públicos e continua assim.
Nos primórdios, recebeu uma imensa carga de recursos do Estado americano, graças a visão de Al Gore, o vice de Bill Clinton que enxergou muita coisa à frente do titular.

O resultado é que a internet serve a economia de mercado — e como! — mas não se confunde com ela. É muito maior. Tem outra natureza.

Nem tudo que ali circula é mercadoria, o que tem vantagens e desvantagens. Começando pela desvantagem: seu trabalho pode ser divulgado, expropriado e até falsificado e você não vai receber nada por isso. Outra desvantagem: dificilmente poderá se defender mesmo que sofra uma acusação injusta. E terá de contar com advogados caros e competentes se quiser impedir a divulgação de uma informação que possa prejudicá-lo no YOUTUBE.

Concluindo pela vantagem: num mundo definido como sociedade da informação e do conhecimento, a internet cumpre um papel indispensável pelo seu caráter universal, aberto e descontrolado. Sem querer abusar de uma palavra que às vezes parece tão gasta, ajudou o mundo a se tornar mais democrático. Para muitas pessoas, o principal exercício de cidadania acontece ali. Os governos não mandam na internet. Nem as grandes corporações. Todos podem usá-la, disputar audiência, tentar criar monopolios, ganhar dinheiro e até enriquecer.

Mas é preciso respeitar uma regra básica, do espaço de liberdade. A internet é nossa grande praça pública, aquele lugar das sociedades contemporâneas que não existe mais nas cidades nem nas ruas — mas no computador. Não é magia mas até parece.
O esforço para criar controles oficiais na internet é tipico de ditaduras. O esforço para transformá-la num espaço da iniciativa privada também. Num caso, sacrifica-se a liberdade em nome de uma ideologia. No outro, sacrifica-se a liberdade me nome da propriedade. Quem perde é a humanidade.
Como é fácil de entender, no fim das contas o resultado é o mesmo. Não sou um fanático do individualismo contemporâneo. Mas vivemos num tempo de autonomia para os indivíduos, que têm espaço para seu pensamento, sua existencia, suas escolhas fundamentais e secundárias, sua capacidade de reagir.

É um movimento profundo, maior do que os profetas de todas as escolas de pensamento político do século XX poderiam imaginar.
Numa sociedade de grandes monopólios econômicos e super podres poderes políticos, a internet é nosso lugar de respiro e resistência.
Ninguém nos impede de ler o blogueiro que apreciamos, de xingar o blogueiro inconveniente, de espalhar opinião muito pessoal e manifestar aquela raiva que não paramos de sentir. Ninguém tem o direito de destruir a internet.
Enquanto não houver uma ideia para corrigir seus defeitos sem ameaçar essa liberdade, é bom para todos nós que ela continue assim.

A palavra e o sexo - RUTH DE AQUINO


REVISTA ÉPOCA

É justo que a sociedade condene automaticamente um homem acusado de estupro?


RUTH DE AQUINO  é colunista de ÉPOCA raquino@edglobo.com.br (Foto: ÉPOCA)
Era uma vez Emir. Imigrante marroquino, em Paris, apaixonou-se por uma belga. Ela foi morar no apartamento que ele alugava. Emir é garçom e músico. Brigas azedaram o amor e o casal se separou. Um dia, ela telefonou. Insistiu num encontro para discutir a relação. Foi para a casa dele. Beberam. Fizeram sexo. Na manhã seguinte, cedo, ela foi à delegacia e o acusou de estupro. Disse que Emir a forçou a fazer o que não queria.
Não havia marca de violência. Era a palavra do homem contra a da mulher. Ele jurava ser inocente. Afirmou que o sexo tinha sido consentido. Emir contratou advogado, foi julgado e condenado a três anos de prisão. O julgamento estarreceu seus patrões, franceses. Amigos de Emir acharam a condenação sexista e racista. Ele ficou incomunicável um bom tempo.
Acabo de reencontrar Emir, servindo mesas novamente em Paris. Ficou um ano na prisão. Tem uma companhia inseparável: a tornozeleira eletrônica. Flutua entre dois mundos – o de seu apartamento alugado, único bem que conservou, e o restaurante. Se decide, dentro do metrô, mudar a conexão para o mesmo destino, recebe imediatamente um telefonema e é convocado pela Justiça a se explicar. Se escolhe outra rua em seu trajeto, o celular toca.
Emir é grato ao juiz pela liberdade vigiada, que compara a uma ressurreição. Não quer processar ninguém. Só provar que nunca foi uma ameaça às mulheres. Tenta reconstruir suas economias, porque faliu. Ouviu dizer que a ex se mudou para a Itália com um amigo dele e com a indenização que foi condenado a pagar. Emir sempre foi gentil, atencioso, educado. Está mais calado, por temor e mágoa.
A lei hoje é mais rigorosa em suspeitas de abuso sexual. A palavra do homem vale bem menos que a palavra da mulher. É justo? Há casos tenebrosos de estupro contra meninas, moças, mulheres, filhas, sobrinhas, pacientes. Podemos concluir então que o homem, pelo poder e força física, tende a estuprar? Podemos nos permitir algumas injustiças escabrosas para equilibrar o jogo?
“A história fala de homens que submeteram mulheres a viver com medo e intimidadas, e o sexo também se prestou a isso”, diz o psicanalista Sócrates Nolasco. “Todavia, os tempos são outros, e o estupro, prática de alguns homens, passou a ser considerado uma prerrogativa masculina. Algumas mulheres usam essa prerrogativa para manipular ou tirar proveito de uma situação. Acontece nas varas de família, como vingança. Ou no caso da camareira em Nova York com Strauss-Kahn.” Nesta coluna, levada pela gravidade da acusação, o histórico de DSK e a reação da Justiça americana, dei crédito à camareira e me retratei pela precipitação. 
As fronteiras entre o sexo consentido e o abuso costumam ser claras. Às vezes, não são. Penetramos então no terreno obscuro da subjetividade. O efeito do álcool ou da droga torna a mulher vítima potencial do homem? A mulher adulta precisa saber quem ela leva para a cama ou na cama de quem ela vai parar. E com que fim. Normalmente, não é para conversar ou rezar, mas ela tem o direito de mudar de opinião. Ele também. Se a mulher quiser perder o controle sobre si mesma, dificilmente controlará os atos do outro.
O que aconteceu com Daniel, do BBB, me pareceu exemplar e simbólico. Antes mesmo de se ouvir Monique, a moça que contracenou com ele as carícias explosivas sob o edredom, a sociedade já condenara o homem. Foi estupro. Foi abuso. Ouvi mulheres indignadas com os comentários dos machistas de plantão: ela pediu, ela estava de sainha, ela o espicaçou. Sempre existirão os ignorantes que acham que uma mulher atraente e sensual pede para ser abusada. Mas ainda assim eu me perguntava: quem disse que a moça sofreu abuso? Ah, ela estava bêbada e não podia discernir o que fazia.
Argumentei que homens bêbados também são levados para a cama por mulheres levemente mais sóbrias e, no dia seguinte, não se lembram de nada. E nem por isso a mulher é acusada de estupro. Ouvi de amigas que um homem bêbado não consegue transar obrigado. Será? Tem homem que, ao perceber com quem dormiu, pensa: “Eu só posso ter bebido demais”. Machismo meu? Ou vontade de não infantilizar as mulheres e não demonizar os homens?
O que chocou na semana passada foi a ideia de que um “estupro” teria sido transmitido pelo BBB, um dos programas mais vistos no Brasil, também pelas classes A e B. A ira prematura contra Daniel desabou quando Monique declarou que tudo foi consentido. O comportamento dos participantes de reality shows em todos os países – e na França inclusive – costuma ser inadequado. Não assisto porque não gosto do formato nem me identifico. E você, assiste?
Mais cruel que os reality shows é o enredo real que aprisionou Emir. A meu ver, ele sempre foi inocente. Mas de que adianta minha opinião?

Fadiga de material - RENATA LO PRETE

FOLHA DE SP - 22/01/12


FÁBIO ZAMBELI (interino) 


Na tentativa de impedir apagão de mão de obra em aeroportos, o governo federal prepara plano de treinamento de pessoal e reestruturação de carreiras no setor, que cresceu 13% em 2011 e seguirá em expansão até a Copa e a Olimpíada. Hoje, cada empresa aérea capacita seus funcionários e não há padronização nem currículo mínimo para diversas funções.

O ministro Wagner Bittencourt (Aviação Civil) discute até a criação de uma "universidade do ar" com o objetivo de formar quadros em todos os níveis -de atendentes a pilotos. Ele identificou, por exemplo, que faltam auxiliares para acompanhar idosos nos terminais.

A fila anda 
Os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Alexandre Padilha (Saúde) e Tereza Campello (Desenvolvimento Social) assinam na terça-feira a adesão do Rio ao Plano Nacional de Combate ao Crack.

Sintonia 
Em São Paulo, Padilha alinhará sua equipe à da prefeitura nos consultórios de rua que atenderão dependentes. A decisão sobre quais Centros de Atenção Psicossocial funcionarão 24 horas também será conjunta.

Tabu 
Os ministérios da Defesa e da Justiça enviaram à Casa Civil minuta de projeto de lei que retira do capítulo de crimes sexuais do Código Penal Militar termos considerados preconceituosos. O governo quer mudar o artigo 235, que pune com detenção quem praticar "pederastia" ou "ato libidinoso, homossexual ou não", em área militar.

Diversidade 
A ideia é eliminar do texto qualquer menção à orientação sexual. A revisão acolhe antigo pleito de juristas e associações de defesa dos direitos humanos.

Baixa Marcio Meira pediu para deixar a presidência da Funai, cargo para o qual foi designado em 2007.

Gerenciar... 
Nas reuniões setoriais de ministros, Dilma Rousseff demonstra particular empenho na adoção de mecanismos de acompanhamento dos resultados dos programas de cada pasta.

...é preciso 
O zelo da presidente com os cronogramas de obras é diretamente proporcional às críticas endereçadas ao Planalto pela desarticulação na resposta às enchentes do início do ano.

Perdas... 
Debruçado sobre as opções do PSDB na sucessão paulistana, Geraldo Alckmin sabe que o prejuízo resultante do eventual naufrágio de Andrea Matarazzo na disputa pela prefeitura da capital seria socializado entre os principais líderes tucanos, José Serra incluído.

...e danos 
Já o possível fracasso de Bruno Covas, candidato "in pectore" do governador, seria debitado integralmente em sua conta.

Holofote 
Em ano eleitoral, Gilberto Kassab orientou a equipe a tratar como prioridade máxima a iluminação pública. Quer dar resposta às queixas de apagões e panes, que lideram o ranking da Ouvidoria da Prefeitura e começam a inflamar o debate entre os pré-candidatos.

Copyright 
A Fifa lançará esta semana em Recife dois manuais para a Copa: o de eventos e o de marketing. O objetivo da entidade é proteger seus patrocinadores da "publicidade de emboscada" -invasão de espaço promocional sem amparo contratual com os detentores de direitos do Mundial de 2014.

Ampulheta 
São Paulo ainda não decidiu onde instalará o relógio de contagem regressiva para o evento, oferecido pelo patrocinador suíço Hublot. O projeto é assinado por Oscar Niemeyer.

com LETÍCIA SANDER e DANIELA LIMA

Dividida

"Quem diria que, após triagens humilhantes, os EUA se renderiam ao nosso poder de compra? Antes nos faziam tirar até os sapatos; agora vão estender tapete vermelho."

DO DEPUTADO PROTÓGENES QUEIROZ (PC do B-SP), sobre a decisão do governo norte-americano de facilitar a emissão de visto de entrada a estrangeiros, anunciada por Barack Obama na quinta-feira passada em Orlando.

Contraponto
Caminho do mar

Ex-presidente do STF, Sepúlveda Pertence conversava, quarta-feira passada, com o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, logo após a cerimônia em homenagem ao centenário de nascimento do jurista Evandro Lins e Silva. Um dos assuntos era o naufrágio do "Costa Concordia". Wadih se dizia perplexo com o comandante que deixou o navio antes dos passageiros. Após dar opinião técnica, o ministro, nascido em Sabará (MG), tratou de explicar:
-Não se assuste! Apesar de mineiro, sou especialista em direito marítimo.

HIPPIE DE APLIQUE - MÔNICA BERGAM0

FOLHA DE SP - 22/01/12



Cabeleira anos 60 dos personagens do musical 'Hair' é resultado de perucas e muito mega-hair

Não é muito fácil ser hippie de musical em 2012. Ainda mais perto do Carnaval. Não por causa da procura por adereços, mas sim porque falta cabelo.

"Não achávamos fios naturais crespos para comprar para as atrizes negras. As passistas das escolas de samba já tinham reservado os estoques de quase todas as lojas de cabelo do Rio e de SP", diz Mel Mesquita, gerente de produção da Aventura, realizadora da versão brasileira de "Hair" [cabelo, em inglês].

Às vésperas da estreia, no dia 13, no Teatro Frei Caneca, ela teve que implorar para que uma vendedora conseguisse a cabeleira. "Expliquei a situação e ela 'roubou' o cabelo que estava reservado para uma passista lá do Rio. Pagamos R$ 2.000 por 600 gramas de fios", diz à repórter Lígia Mesquita.

O mais de meio quilo de cabelo se transformou em dois mega-hairs que foram trançados ao couro cabeludo das atrizes Juliana Peppi, 28, e Jennifer Nascimento, 18, num processo que levou 12 horas para ficar pronto.

Entre os 30 atores do espetáculo dirigido por Charles Möeller e Claudio Botelho, só 11 exibem longas madeixas naturais. Outros 11 colocaram mega-hair, um usa aplique e sete, perucas.

Todos os atores que alongaram as madeixas contam que sofreram e que o processo foi dolorido. Kiara Sasso, 32, uma das protagonistas, diz que "queria morrer" na primeira semana com o mega-hair. "Não dava pra dormir, doía a cabeça." Ela lembra que certa vez passou por uma turbulência em um voo e só pensava: "Não quero morrer com esse tanto de cola na minha cabeça".

O ator com ascendência japonesa Bruno Kimura, 30, de mega-hair, entra na sala onde fica a cabeleireira do espetáculo. Abre uma gaveta e coloca dentro algumas mechas de cabelo. "Todo dia a gente perde alguns fios. Aí guardamos aqui. No fim do mês, separamos qual mecha é de quem e vamos ao salão para colar de novo", diz. Ele conta que o visual cabeludo provoca curiosidade nas pessoas. "Hoje, ninguém pensa: 'Ah, esse cara é hippie'. Dizem: 'Será que ele é algum lutador? Será que faz show como travesti?'."

Reynaldo Machado, 21, cabeça raspada, se acomoda em uma cadeira para colocar a peruca estilo "black power". É a única que não leva fios verdadeiros. "Meu cabelo cresce pouco e, quando cresce, dói. Cabelo duro, sabe como é que é." O ator diz que a peruca é um fetiche para as mulheres. "Elas me acham mais gostoso."

Se na cabeça o negócio é ter uma juba, no corpo os atores quase não têm pelos -bem diferente da estética hippie dos anos 60, em que mulheres deixavam as axilas e as virilhas cabeludas. Na famosa cena em que o elenco aparece nu no palco, nota-se a depilação em dia até em alguns homens.

O protagonista Hugo Bonemer, 24, primo de William Bonner, raspa o peito. "Meu personagem tem 18 anos e é polaco. Mas eu não quero falar disso [depilação]." Segundo ele, "na tribo do nosso musical tem pessoas que fazem referências reais aos hippies de 68. Mas também tem gente que malha, que se depila. O público paga caro para assistir e espera uma qualidade estética".

"Muita gente questiona: 'Ah, mas eu vi uma hippie depilada!'. Meu amor, se fosse realmente seguir o fundamento hippie, não teria luz no palco, não teria figurino, afinação. Isso aqui é um musical que fala dos hippies. Ninguém aqui é hippie", afirma Reynaldo Machado. "Se é pra ser do jeito real, sem se depilar, a gente deveria estar nu, dançar na rua, se abraçar fedido. O ingresso custa caro [a partir de R$ 130]."

Kiara Sasso diz que não gostaria e nem poderia deixar o corpo peludo. "Fiz depilação a laser [ou definitiva]." E questiona: "No teatro é melhor ter alguém que cante bem ou que não fez depilação definitiva?".

Para a atriz Carolina Puntel, 31, que tem os cabelos longos ruivos naturais, deixar ou não os pelos no corpo é "o de menos" em "Hair". "O importante dessa peça é a mensagem de amor e de paz."

"Se fosse realmente seguir o fundamento hippie, não teria luz, não teria figurino. Isso aqui é um musical que fala dos hippies. Ninguém aqui é hippie"
REYNALDO MACHADO

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 22/01/12



Disputa entre Jirau e segurador irá ao BNDES

A disputa entre o consórcio da usina de Jirau e as seguradoras, sobre o ressarcimento pelos danos provocados durante os tumultos no canteiro da hidrelétrica no Rio Madeira (RO) no ano passado, será assunto para uma reunião no BNDES nesta semana, segundo o advogado dos construtores.

As partes não conseguiram ainda chegar a um acordo sobre o pagamento do sinistro, que pode variar de R$ 400 milhões a US$ 1,3 bilhão, por destruição de bens e perdas em geração de energia, segundo Ernesto Tzirulnik, advogado do consórcio Energia Sustentável.

As seguradoras, lideradas pela SulAmérica, querem levar o caso para ser solucionado em uma câmara arbitral em Londres, de acordo com uma cláusula que a hidrelétrica não reconheceu como válida.

Uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, entretanto, determinou no mês passado que a discussão permaneça em solo brasileiro.

No final da última semana, foi a Justiça britânica que exigiu que se tratasse do litígio no exterior.

"Agora, o BNDES, que também é beneficiário, como financiador dessa obra, convocou uma reunião com os construtores e os seguradores para ver como vai ficar. A instituição também tem o maior interesse em que esse sinistro seja pago", afirma Tzirulnik.

O advogado do consórcio afirma que "não faz sentido haver arbitragem fora do Brasil quando o segurado, a obra da usina e o financiador são todos brasileiros".

Procurada, a SulAmérica não se pronuncia.

Além de Jirau, o banco entrou como financiador na hidrelétrica de Santo Antônio, em Porto Velho.

LUZ DO SOL

A Rio Alto Energia, que no final do ano passado anunciou um empreendimento de geração solar em Coremas (PB), com investimentos de mais de R$ 300 milhões e 50 MW de potência, tem em estudo outros 200 MW na região.
A ideia é aproveitar o grau de insolação daquela área para geração por concentração solar, segundo Sergio Reinas, sócio da empresa.

"Temos diversos projetos em outros municípios. As medições apontam um cinturão nesta área", diz Rafael Brandão, também sócio.

No projeto de Coremas, os empresários optaram por fazer aproveitamento agrícola, com plantação de tomate em estufa na área.

"O modelo de produção agrícola, já adotado por americanos e israelenses, pode criar uma indústria em torno disso, com atração de empregos e desenvolvimento local", diz Reinas.

CAIXA DA CRISE

O caixa das empresas está mais cheio hoje do que em 2008, antes de a quebra do Lehman Brothers desencadear a crise internacional, segundo pesquisa da EIU (Economist Intelligence Unit) com 535 executivos de todo o mundo.
Dos entrevistados, 49% afirmaram que têm mais dinheiro em caixa agora do que há três anos, enquanto 27% disseram que houve redução.

Estocar dinheiro não é comum em épocas de juros baixos. As companhias, no entanto, estão ampliando seus caixas por acreditar que a economia débil pode criar condições favoráveis a expansões e aquisições, disse um executivo entrevistado pela EIU. Cerca de 35% das empresas devem voltar a investir em projetos de grande volume de capital entre um e três anos.

Qualificação 
A S.O.S Educação Profissional, do Grupo Multi, abrirá 40 escolas até junho deste ano, em dez Estados. A meta da empresa é fechar 2012 com mais cem unidades em processo de abertura e alcançar 300 escolas em 2013.

Treinamento... 
A LHH/DBM, consultoria que ajuda empresas a alocar funcionários para os cargos mais apropriados, inaugura neste semestre um escritório em Porto Alegre, seu primeiro no Rio Grande do Sul.

...interno 
Até o fim deste ano, a empresa deve iniciar operações em outros três Estados do país, provavelmente nas cidades de Recife, Salvador e Brasília, segundo Cláudio Garcia, presidente da LHH/DBM Brasil e América Latina.

COM QUE ROUPA

NOVO 'DANDY'

Xadrezes, sóbrios coletes, muitas malhas, tudo bem clássico. Foi nas passarelas de Milão, mas a moda masculina de outono - inverno 2012/2013 parece desfilar pelas ruas de Londres, notaram especialistas.

Para muitos, a inspiração inglesa não tem nada a ver com a Olimpíada, que será na cidade neste ano, ou com o casamento do príncipe William. É crise mesmo.

Em tempos de turbulência, o melhor a fazer é ser conservador e apostar no que possa vender mais, explica um executivo do setor.

É o estilo inglês com alguma invenção de Milão. A grife Zegna inovou nos motivos quadriculares, Armani e Gucci, nas malhas.

"Em período de crise, as roupas formais, ainda que atualizadas, entram muito em moda porque dão segurança, como a malharia", diz Raffaello Napoleone, CEO da Pitti Immagine, que organiza em Florença a mais sofisticada feira de moda masculina, a Pitti Uomo.

com JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ

As nossas coisas atípicas - GAUDÊNCIO TORQUATO


O Estado de S.Paulo - 22/01/12


O caso é tão hilário quanto impactante: uma professora se inscreve no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), entrega a prova em branco e, pasmem, recebe até 4 pontos acima da nota mínima. A intenção não era desmoralizar o sistema, mas levar as questões para o cursinho. As surpresas da semana não pararam por aí. As contas do Judiciário apontam uma movimentação "atípica" de R$ 885,7 milhões entre 2000 e 2010. A forma "atípica" apurada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sinaliza coisas como falta de controle e desvio de padrão. E mais: o governo federal gastou em compras sem licitação R$ 13,7 bilhões, quase 48% do total gasto em 2011.

Por mais convincentes que sejam as respostas para explicar tais fatos, espraia-se o sentimento de que a infindável coleção de casos mirabolantes, inusitados, rocambolescos que emolduram a vida de nossas instituições é parte de um País profundamente enraizado na cultura de improvisação e descontrole. É inescapável a imagem de que ao esforço para construir uma Nação digna, séria, formal se contrapõe um sistema de pressão para deixá-la flutuando nas ondas da informalidade, dando vazão ao conceito de que aqui tudo é permitido, até o que é proibido.

Esses três casos se localizam no obscuro limite entre o Brasil formal e o Brasil informal. A queda de braço entre os dois é um exercício de paciência que se desenrola desde o ciclo colonial, quando não havia separação entre a coisa pública e o negócio privado. Da administração patrimonialista do sistema monárquico ao modelo da administração por resultados, que o País tenta implantar desde o final dos anos 1990, conquistas e avanços obedecem a fluxos e contrafluxos, tendo como calibragem fatores como o tamanho da máquina estatal, as atribuições e funções das estruturas, a argamassa burocrática, o processo de tomada de decisões, os controles e a transparência. Infelizmente, não tem havido continuum na vida administrativa pública, fato que decorre de imposições de grupos de mando e ajustes ocasionais, sob o patrocínio da velha política. Traduzindo: os mandatários esbarram, em seus governos, com as pressões de partidos que lhes dão sustentação no Parlamento. A partir dessa barreira se desenha o cenário de obstáculos para a adoção de critérios racionais na administração pública. Basta olhar para as características do momento. É forçoso reconhecer que o atual ciclo se apresenta como um dos mais propícios para mudar a fisionomia carcomida do Estado brasileiro. Vejamos.

Nossa presidente, com seu perfil técnico, reúne condições melhores que as dos antecessores para implantar uma modelagem administrativa à altura dos desafios impostos pela meta de modernização do Estado. Eleita com a maior votação da História brasileira, conseguiu, ao final do primeiro ano de governo, uma avaliação popular mais alta que a de seu patrocinador, Lula. Dispõe de uma das mais largas bases de apoio político firmadas na contemporaneidade. Com essa bagagem poderia ter produzido intensa agenda reformista, abrigando, entre outras coisas: enxugamento da extensa máquina (38 ministérios), agrupamento de setores e nichos; reorientação dos mecanismos de controle para resultados; maior flexibilidade administrativa; melhoria significativa dos serviços públicos; avaliação permanente de desempenho dos quadros e transparência máxima nos atos administrativos. E por que Dilma não quer decolar na pista do segundo ano de governo com uma máquina mais moderna e azeitada? Ora, porque a engrenagem política a demove. Demover pode ser um termo inadequado para abrigar um perfil tão forte como o da presidente. Mas é visível seu esforço para não colocar explosivos num campo tão minado de pressões como é a Esplanada dos Ministérios.

Desponta, aqui, a inferência: o presidencialismo, mesmo o de cunho imperial, como o nosso, capaz de tornar o Parlamento refém de sua vontade, tem limites. Não pode fazer tudo. Essa é a razão por que passos mudancistas são dados em algumas áreas, mas outras permanecem estagnadas.

Há exemplos significativos de avanços, podendo-se citar os mecanismos para Declaração de Imposto de Renda, hoje mais simplificados; o sistema eletrônico de votação e apuração de resultados; os métodos de análise adotados pelo Tribunal de Contas da União; o desenvolvimento tecnológico da Petrobrás, que a levou a desempenho exemplar na prospecção e extração de petróleo; a digitalização no Judiciário, que poderá ser a alavanca da dinamização da Justiça. Ilhas de excelência técnica povoam o arquipélago nacional, como a Embrapa, reconhecida internacionalmente, responsável pela pesquisa e tecnologia que revolucionam a agricultura nacional.

Em contraponto, no meio da paisagem se distinguem polos de ineficiência, particularmente em infraestrutura, carga tributária, custo para exportação, tempo gasto na gestão de impostos, obtenção de licenças e execução de contratos. Como se justifica que, num país que precisa incentivar o emprego formal, um trabalhador custe à empresa 102% do que ganha? A redução desses freios poderia, pelas contas do FMI, dobrar o PIB per capita dos brasileiros, de quase US$ 11 mil para US$ 22 mil.

Mais uma constatação: dispomos do aparato normativo para promover uma revolução na administração pública. Temos uma batelada de leis, a partir de um comando maior, o artigo 37 da Constituição, que estabelece os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Mas é bom lembrar Montesquieu, que dizia: "Quando vou a um país não examino se há boas leis, mas se são executadas as que há, pois há boas leis por toda parte". O barão matou a charada. Por aqui muitos atos públicos são cobertos pelo véu da privacidade, o que os torna pessoais, amorais e pouco eficientes para a comunidade.

Esse é o pano de fundo que acolhe coisas atípicas como tirar boa nota sem fazer a prova.

Nódoa - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 22/01/12



Apesar da simpatia de setores do Palácio do Planalto pelo líder do PP, deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), para o Ministério das Cidades, pesa contra ele um inquérito no STF por crime contra a Lei de Licitações. Ribeiro foi condenado pelo TRF da 5ª Região por ter contratado, sem licitação, quando era secretário estadual de Agricultura, em 2000, uma empresa privada. Ele recorreu.

Privilégio
O Senado gastou R$ 175 mil, em dezembro, com reembolso de despesas médicas e odontológicas de 28 ex-senadores e dependentes. Eles têm direito a plano de saúde vitalício bancado pelos cofres públicos. O campeão foi o ex-senador e ex-governador do Pará Almir Gabriel, que recebeu R$ 32.958. Os ex-suplentes de senador João Tenório (PSDB-PA), Neuto de Conto (PMDB-SC) e Gilberto Goellner (DEM-MT) foram reembolsados, ao todo, em R$ 43.409 nesse período. Cinco viúvas tiveram restituição de quase R$ 14 mil em dezembro. Outro beneficiado foi o atual governador do Acre, Tião Viana (PT), que recebeu R$ 7.384.

"O PT não pode ficar contra um plebiscito. É da nossa história” — Marco Aurélio Garcia, dirigente petista e assessor da presidente Dilma, sobre proposta de submeter ao voto popular mudanças na legislação eleitoral

NOIVA. Assediado agora pelo PSDB em São Paulo, que está vendo o PSD se bandear para o lado do PT, o DEM diz que não vai tomar nenhuma decisão até março, quando os tucanos têm prévias marcadas para as eleições municipais da capital. "Não sabemos quem será o candidato deles. Nós temos candidato: Rodrigo Garcia. Mas estamos abertos ao diálogo", disse o presidente do DEM, senador José Agripino (RN), na foto.

Compartilhado
A ministra Miriam Belchior (Planejamento) não ficará mais sozinha no acompanhamento das obras do PAC. A presidente Dilma, nas reuniões setoriais, pediu para o Ministério da Fazenda e a Casa Civil darem um reforço.

Trauma
Até agora não há acordo, para a liderança do PT no Senado, entre os senadores Walter Pinheiro (BA) e Wellington Dias (PI). A disputa deve ser decidida no voto. "Acordo futuro eu não acho uma boa experiência, vide o que está acontecendo na Mesa (Diretora)", disse Pinheiro. Ele refere-se ao acordo para rodízio entre Marta Suplicy (PT-S) e José Pimentel (PT-CE) na vice-presidência do Senado, que está fazendo água.

Anarquista
Panfleto de encontro do movimento "Novo Política", capitaneado pela ex-senadora Marina Silva, diz: "É hora de ouvir o que a cidadania tem a dizer, sem a tutela de governos ou partidos políticos". Também fala em "reação civil pacífica".

Segurança
O governo privatiza aeroportos para a Copa, mas em pequenos terminais a situação é crítica. Em Campos (RJ), as bagagens de mão não passam pelo raio-X. Risco para passageiros e para o Santos Dumont, destino da maioria dos voos.

O MINISTRO
 Fernando Bezerra Coelho (Integração) decidiu substituir o atual diretor administrativo do DNOCS, Albert Brasil Gradvohl.

UM INTEGRANTE
 do governo, que participou das reuniões setoriais, diz que o mantra da presidente Dilma é: "Governança-monitoramento-comprovação".

PRESTÍGIO
. Rocha Loures, assessor da vice-presidência, participou de todas as reuniões setoriais com a presidente Dilma.

Do caderno de um repórter - HUMBERTO WERNECK


O Estado de S.Paulo - 22/01/12


Hoje, não sei, mas no começo dos anos 90 a redação da Elle vivia o permanente tormento de decidir o que, neste mundo, era ou não era Elle. Submetidas a uma sutilíssima e inescrutável peneira, as pessoas, coisas e assuntos podiam ou não ser Elle - e, caso não fossem, não esperassem acolhida em nossas páginas. Novato na revista, cometi a ingenuidade de levar a uma reunião de pauta a ideia de um perfil da Nana Caymmi. O impacto da sugestão só teria sido maior se a cantora, com toda a sua tonelagem física, houvesse desabado no centro daquela mesa servida pela mais implacável anorexia carnal e jornalística. Diante do constrangido silêncio que ali baixou, enveredei pela defesa dos dotes vocais da Nana - enquanto ia me dando conta de que talvez eu próprio fosse inapelavelmente não-Elle. Novo silêncio, até que alguém, maternalmente, me pusesse nos trilhos:

- A voz da Nana é Elle, compreende?, mas ela não é, compreende?

* * *

Ainda no prédio da Marginal do Tietê, a redação da Veja ficava no sétimo andar, e de lá saía eu, num começo de noite, quando o elevador parou no sexto, o da diretoria, e nele entrou ninguém menos do que Victor Civita, com quem eu jamais havia trocado palavra. Só nós dois lá dentro, cada qual num canto, como num ringue de boxe. Mal iniciamos a descida e o patrão, sorridente, veio vindo na minha direção. Seja o que Deus, o Outro, quiser, pensei eu - e nesse instante o dono da Editora Abril, num gesto rápido, puxou pela ponta uma nota que emergia do bolso da minha calça jeans. Seriam hoje uns R$ 50, e com eles meu companheiro de viagem, serelepe, voltou para o seu canto. Nesse momento desaguamos no térreo, e Victor Civita, com uma gargalhada, me devolveu o dinheiro, ao mesmo tempo em que me aplicava nas costas uma cordial mas nem por isso indolor palmada.

* * *

No ambiente algo hospitalar das redações de hoje, talvez não seja hábito pregar trotes nos calouros. Antigamente era, e não sei como escapei desse ritual de passagem quando, em maio de 1970, cheguei para disputar emprego no Jornal da Tarde. O falecido Inajar de Souza, que antes de ser avenida foi um boa-praça, bem que se esforçou para precipitar no ridículo e no sufoco aquele mineirinho. Talvez tenha me salvado o pé-atrás com que, forasteiro, encarei a selva paulistana. Menos sorte teve outro iniciante, a quem se confiou a missão de escrever sobre uma garota americana desmemoriada que fora vista a vagar por Guaratinguetá em companhia de um coiote. Mais romântica e intrigante não poderia ser a pauta, e a ela o aprendiz de repórter se aferrou com zelo inexcedível. Logo no primeiro dia, porém, viu desmoronar-se parte da história, ao descobrir que a menina não era americana. No segundo, soube que a desmemoriada se lembrava de tudo. Por fim, provado ficou que o coiote não passava de um reles cachorro brasileiro sem pedigree. Ainda me lembro dos uivos, pretensamente de coiote, com que o foca foi saudado na volta à redação.

* * *

Era por telex que boa parte das notícias chegava às redações, e foi assim que num final de tarde soubemos no Jornal da República que o deputado Ulysses Guimarães havia morrido de infarto nos braços do colega Tales Ramalho. Sucessivas mensagens, como se hábito, foram ampliando a informação: naqueles tempos de pós-anistia, mas ainda de ditadura, Ulysses tinha ido confabular com Tales - e lá pelas tantas adernara no sofá. Percebendo a gravidade do que se passava, o parlamentar pernambucano se jogou sobre o corpo do líder oposicionista, e, em vão, lhe aplicou respiração boca a boca. Todos nós, na redação, do diretor ao contínuo, sabíamos que se tratava de um trote de mau gosto, até porque Tales Ramalho, sendo cadeirante, dificilmente teria conseguido atirar-se sobre Ulysses. O editor de política foi o único a levar a coisa a sério, e, esbaforido, se espalhou em providências para a sensacional cobertura. E quando, uma hora mais tarde, percebeu a esparrela em que tinha caído, não disse palavra - juntou suas coisas e, sob gozações, se escafedeu, ultrajado. Na semana seguinte, morre subitamente o senador Petrônio Portela, e o editor, ao receber o telegrama, berrou lá da sua mesa:

- Duas vezes vocês não me pegam não, seus sacanas!

Deu trabalho ao diretor convencê-lo de que dessa vez era verdade.

Não canse quem te quer bem - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 22/01/12


Uns mais, outros menos, todos passam dos limites na arte de encher os tubos

Foi durante o programa Saia Justa que a atriz Camila Morgado, discutindo sobre a chatice dos outros (e a nossa própria), lançou a frase: Não canse quem te quer bem. Diz ela que ouviu isso em algum lugar, mas enquanto não consegue lembrar a fonte, dou a ela a posse provisória desse achado.

Não canse quem te quer bem. Ah, se conseguíssemos manter sob controle nosso ímpeto de apoquentar. Mas não. Uns mais, outros menos, todos passam do limite na arte de encher os tubos. Ou contando uma história que não acaba nunca, ou pior: contando uma história que não acaba nunca cujos protagonistas ninguém ouviu falar. Deveria ser crime inafiançável ficar contando longos causos sobre gente que não conhecemos e por quem não temos o menor interesse. Se for história de doença, então, cadeira elétrica.

Não canse quem te quer bem. Evite repetir sempre a mesma queixa. Desabafar com amigos, ok. Pedir conselho, ok também, é uma demonstração de carinho e confiança. Agora, ficar anos alugando os ouvidos alheios com as mesmas reclamações, dá licença. Troque o disco. Seus amigos gostam tanto de você, merecem saber que você é capaz de diversificar suas lamúrias.

Não canse quem te quer bem. Garçons foram treinados para te querer bem. Então não peça para trocar todos os ingredientes do risoto que você solicitou – escolha uma pizza e fim.

Seu namorado te quer muito bem. Não o obrigue a esperar pelos 20 vestidos que você vai experimentar antes de sair – pense antes no que vai usar. E discutir a relação, só uma vez por ano, se não houver outra saída.

Sua namorada também te quer muito bem. Não a amole pedindo para ela posar para 297 fotos no fim de semana em Gramado. Todo mundo já sabe como é Gramado. Tirem duas, como lembrança, e aproveitem o resto do tempo.

Não canse quem te quer bem. Não peça dinheiro emprestado pra quem vai ficar constrangido em negar. Não exija uma dedicatória especial só porque você é parente do autor do livro. E não exagere ao mostrar fotografias. Se o local que você visitou é realmente incrível, mostre três, quatro no máximo. Na verdade, fotografia a gente só mostra pra mãe e para aqueles que também aparecem na foto.

Não canse quem te quer bem. Não faça seus filhos demonstrarem dotes artísticos (cantar, dançar, tocar violão) na frente das visitas. Por amor a eles e pelas visitas.

Implicâncias quase sempre são demonstrações de afeto. Você não implica com quem te esnoba, apenas com quem possui laços fraternos. Se um amigo é barrigudo, será sobre a barriga dele que faremos piada.

Se temos uma amiga que sempre chega atrasada, o atraso dela será brindado com sarcasmo. Se nosso filho é cabeludo, “quando é que tu vai cortar esse cabelo, guri?” será a pergunta que faremos de segunda a domingo. Implicar é uma maneira de confirmar a intimidade. Mas os íntimos poderiam se elogiar, pra variar.

Não canse quem te quer bem. Se não consegue resistir a dar uma chateada, seja mala com pessoas que não te conhecem. Só esses poderão se afastar, cortar o assunto, te dar um chega pra lá. Quem te quer bem vai te ouvir até o fim e ainda vai fazer de conta que está se divertindo. Coitado. Prive-o desse infortúnio. Ele não tem culpa de gostar de você.

Paris 2012 - DANUZA LEÃO

FOLHA DE SP - 22/01/12


As lojas eram as mais lindas do mundo, eu tinha vontade de comprar tudo, de comer tudo, de ver e olhar tudo


Paris, com mais um A, com menos um A, não importa -não para mim. Mas a cidade está diferente; é claro que tudo muda, mas Paris mudar é um desconsolo.

Todas as vezes que vim a Paris -e não foram poucas- foi um encantamento. As lojas eram as mais lindas do mundo, eu tinha vontade de comprar tudo, de comer tudo, de ver e olhar tudo. Paris mudou? Mudou, sim. Não a cidade, é claro, mas o clima.

Foi difícil me dar conta do que estava acontecendo. Quis conservar meus sonhos, não perder minhas ilusões, mas tive que escolher entre viver em um mundo idealizado ou botar o pé na real.

Nem foi exatamente uma escolha; afinal, as coisas estavam ali na minha frente, e eu só não as veria se não quisesse -e eu vi.

Eu poderia perfeitamente ter feito algumas compras, o que faz parte de qualquer viagem (minha); mas não fiz, porque não tive vontade de ter nada do que as lojas ofereciam. Nada, e o pouquíssimo que comprei, era tudo made in China (aliás, algumas poucas lojas estão colocando na vitrine um cartaz informando que toda sua mercadoria é de fabricação francesa).

E voltando à gastronomia, não tive uma decepção, tive várias. Meu hotel é em St. Germain, e sempre foi uma dificuldade escolher onde ir jantar, tantas (e tão boas) eram as opções. Pois até agora, só as ostras não me decepcionaram. Os restaurantes estão servindo comida congelada, põem em cima um pouco de molho e umas folhinhas verdes para dar um ar de ter sido feita naquele dia, et voilà.

Ainda existem, é claro, bons bistrots -mas é preciso procurar bem-, e eu reencontrei o meu, que se chama Vins et Terroirs, na rue St. André des Arts. Se você for lá, entre e diga que é meu amigo (mesmo não sendo) e será tratado como um rei. É barato, a cozinha, típica de bistrô, você vai ser superbem acolhido e comer bem.

Ontem à noite, depois do jantar, sentei num café, num lugar bem turístico, para tomar um chá. Era uma rua de pedestres muito animada, pois em volta existem outros cafés e alguns restaurantes. Como a temperatura neste inverno está entre 10º e 16º C, fiquei numa mesa do lado de fora.

Enquanto estava lá, vi um mendigo tentando roubar outro mendigo que dormia em cima de um colchão na porta de um prédio (o que dormia foi salvo por seu cachorro, que começou a latir alto e o outro teve que sair correndo). Mendigo roubando mendigo? Em Paris? Detalhe: o mendigo em questão usava um celular -todos usam.

Meu hotel era ao lado, numa ruazinha calma, e fiquei com medo de voltar para casa.

Mas não era em Paris que as mulheres podiam usar joias, sair à noite sem problema de violência? Era. E passear na avenida mais bonita do mundo, a Champs Elysées, está tão perigoso quanto na avenida Atlântica, no Rio.

As duas ruas conhecidas como as mais chiques da cidade, talvez do mundo -a av. Montaigne e o Faubourg St. Honoré-, estão uma desolação, e a moda francesa, sei lá.

É a crise? Não sei, mas as duas únicas lojas razoavelmente interessantes são a do costureiro belga Dries Van Noten e a do americano Ralph Lauren; dá para acreditar?

Tenho o hábito -e a sorte- de poder viajar todo fim de cada ano, e meu destino sempre foi Paris; apesar de tudo, com um A a mais ou a menos, e apesar da globalização, Paris será sempre Paris, e sempre haverá cafés como os de antes, bons bistrôs -mas cuidado com os lugares muito turísticos; em viagem sempre acontecem erros, a gente procura, erra mas também acerta, e deve se lembrar sempre de Humphrey Bogart se despedindo de Ingrid Bergman, no final de "Casablanca", quando ele disse a ela "we will always have Paris".

Nós também sempre teremos Paris. Será?

Fora da curva - DORA KRAMER -

 O Estado de S.Paulo - 22/01/12


Celebrada por cientistas, recebida em silêncio pelos partidos governistas aliados e vista com desconfiança queixosa no PT, a nomeação do físico Marco Antonio Raupp para o Ministério da Ciência e Tecnologia suscita dúvida sobre seu significado.

A chamada "indicação técnica", principalmente em pasta ocupada há nove anos por critério político-partidário, não deixa de ter sido uma surpresa. Em princípio alentadora.

Não porque o técnico represente garantia de lisura e eficiência ou a opção política seja necessariamente deletéria.

Há técnicos corruptos e ineficientes como há políticos de boa conduta e capacidade de fazer o que Fernando Henrique Cardoso em seu recente livro-depoimento, A soma e o resto, define como "a arte de reunir condições para tornar possível o necessário".

A razão do alento como pressuposto é que Raupp foi escolhido por mérito específico na área.

É presidente licenciado da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC), foi diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, criou o Centro de Previsão de Assuntos Climáticos e atualmente ocupa a presidência da Agência Espacial Brasileira.

Ou seja, não irá para o Ministério da Ciência e Tecnologia para acomodar conveniências partidárias.

E qual é a dúvida que suscita sua indicação?

Discute-se se ela pode ou não ser vista como um aviso da presidente Dilma Rousseff de que daqui em diante tudo poderá começar a ser diferente no estabelecimento de parâmetros para a escolha de pessoas encarregadas de comandar a execução das políticas públicas de cada setor.

A boa notícia é que Dilma fez o gesto. Mas a constatação realista é que não se sabe se o fez para dar início a uma mudança gradual e permanente no conceito da coalizão ou se buscou apenas resolver um problema político-partidário.

Como PT e PSB disputavam a vaga, com a indicação - vá lá - de um técnico, evitou o conflito, pois a opção por atender à demanda de qualquer um dos dois criaria uma área de contrariedade séria com o preterido.

Se nenhum deles é premiado, o atrito não se impõe e o prejuízo diluído.

Por isso é cedo para dizer se há ou não significado perene na solução dada para a pasta onde havia de fato uma complicação. Por enquanto, a nomeação de Marco Antonio Raupp com todos os méritos que a comunidade científica lhe confere, não é a regra. Ainda é o ponto fora da curva.

Luz no túnel. O vice-presidente Michel Temer e o deputado Miro Teixeira iniciam uma empreitada que pode realmente criar um horizonte de reforma política à vista.

Miro apresentou projeto propondo a realização de um plebiscito na eleição de 2014 sobre sistema eleitoral e financiamento público de campanha. Temer não só apoia como defende a proposta com argumentos consistentes.

Em artigo sobre o tema escrito em novembro de 2011, ele destrincha a raiz do problema: "As dificuldades da reforma se dão porque o assunto se relaciona à maneira como cada parlamentar avalia a própria experiência no processo eleitoral segundo as leis em vigor e os interesses pessoais se sobrepõem ao aperfeiçoamento das regras eleitorais".

Portanto, "se há dificuldade de a reforma política ser executada pelos representantes do povo a solução é caminhar para a democracia direta usando os instrumentos da Constituição de 1988". Ou seja, o plebiscito.

É o tipo da ação de política alta que vai pôr a teste a sinceridade de propósitos dos defensores da reforma política e a capacidade das forças engajadas no projeto, de esclarecer ao público significados e implicações de cada tema proposto para votação.

Imprescindível não repetir a experiência do plebiscito sobre sistema de governo, em 1993. Campanha malfeita, discussão rasteira, o Parlamentarismo não teve chance alguma porque, diante do desconhecido, a população preferiu não arriscar e preferiu permanecer no Presidencialismo.

Sem saber exatamente por quê. Se for para reproduzir o modelo, o povo estará sendo chamado a referendar uma embromação e justificar a persistência no imobilismo.