domingo, setembro 30, 2012

O jeito Dilma de ser Keyne - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 30/09


Engana-se quem pensa que a presidente Dilma Rousseff passa as horas dentro do avião presidencial em suas viagens internacionais lendo revista de moda, tomando um drink ou simplesmente tirando uma soneca. É ali, sem telefones ou interrupções por parte de terceiros, que a presidente aproveita para “teorizar” o governo, comparar as medidas adotadas com as teorias existentes, especialmente, na área econômica, tratar das estratégias para o futuro e organizar as ideias — um “brainstorm” nas alturas.
Essa mesa redonda em cabine pressurizada é tão exclusiva quanto a primeira classe das companhias aéreas. Estão convocados de forma quase que permanente nesse grupo apenas dois ministros, o de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Fernando Pimentel; e o da Educação, Aloizio Mercadante. O assessor internacional, Marco Aurélio Garcia, hoje muito mais reservado e discreto do que no governo Lula, também participa. Em algumas rodas, ela inclui os ministros de Relações Exteriores, Antonio Patriota, e a de Comunicação Social, Helena Chagas. Mas é com Pimentel, Mercadante e Marco Aurélio que Dilma vive mais essa tarefa de “pensar” o governo.

Uma das últimas conclusões do grupo, ao analisar esses quase dois anos de governo sob a ótica da economia, foi a de que Dilma pegou a Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, escrita em 1936 pelo britânico John Maynard Keynes, e colocou um tempero brasileiro, promovendo uma mudança geral na política econômica nesse período. Primeiro, veio a queda na taxa básica de juros. Depois, o processo de baratear os financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em seguida, foi a hora de dar incentivos a setores estratégicos, inclusive no que se refere a um alívio sobre a folha de pagamentos, o que, na visão do governo, ajuda a preservar empregos e aumenta a competitividade.

Coentro, cebolinha, cominho
Agora, o governo está na fase de organizar a infraestrutura e baratear custos não só para o empresariado como também para o consumidor. Daí, a redução de tarifas de energia e a pressão governamental pela queda nos juros dos cartões de crédito e dos financiamentos como um todo. “O que o governo não fez foi desemprego e redução de salário. Temos aí um jeito Dilma de ser Keynes”, define Mercadante.

A teoria keynesiana propõe a intervenção estatal na vida econômica com o objetivo de garantir empregos. Com a recessão em parte da Europa e a crise nos Estados Unidos, Keynes ressurgiu com força e muitos caem nos ciclos a que a teoria dele se refere, quando trata de períodos de desemprego. O Brasil, apesar do baixo crescimento, não vive essa fase de desemprego. “Vivemos hoje no Brasil um Keynes anticíclico”, acredita Mercadante.

No encontro sobre educação, do qual o ministro participou na ONU, e que eu tive a oportunidade de acompanhar, o primeiro-ministro croata, Zoran Milanovic, falou em corte de salário de professores, em decorrência da crise. Na Espanha, houve demissões de professores. No Brasil, não houve demissões. “Não se sai da crise com menos educação e sim com mais educação”, disse Mercadante em seu pronunciamento, numa resposta indireta ao croata.

No forno
Embora o crescimento econômico do Brasil esteja abaixo dos 2%, a expectativa do governo é a de que no ano que vem, as medidas comecem a ser mais sentidas pela população. Outros países têm acompanhado muito de perto o que acontece por aqui. Se a resposta for positiva como espera o governo, “o jeito Dilma de ser Keynes”, como diz Mercadante, será objeto de estudo acadêmico pelo mundo afora.

Vale registrar ainda que, em 2013, estaremos na antessala da sucessão presidencial. Dada a popularidade de Dilma detectada na semana passada, a população está gostando do tempero brasileiro que ela coloca em Keynes e no próprio PT, ao promover as concessões de serviços públicos à iniciativa privada. Ou seja, se a oposição quiser fazer bonito em 2014, é bom se reinventar já. Porque, embora os petistas não estejam com a bola toda nesta eleição municipal, nada indica que Dilma terá esse mesmo fim daqui a dois anos.

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