quarta-feira, março 21, 2012

Espuma & ouriços - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 21/03/12


A CPI dos Correios, que desaguou no mensalão, começou por uma cobrança de propina de R$ 3 mil nos Correios pelo então diretor de Material, Maurício Marinho. Há quem acredite que algo semelhante pode ocorrer via escândalo na saúde

Nas pedras, sempre se faz espuma quando a onda se quebra. O perigo é o sujeito, em meio à espuma, andar pelos recifes de coral e acabar pisando num ouriço. No meio da confusão da base aliada hoje, há muito mais espuma do que ouriço. E, por enquanto, os ouriços são mais perigosos para o PT e para os próprios parlamentares do que propriamente para a presidente Dilma Rousseff.

No caso dos políticos, um ouriço já entrou no pé: o projeto que extingue o 14º e o 15º salários das excelências é um exemplo. Chegou-se ao ponto de que, ou eles votam a proposta que a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, apresentou quando era senadora, ou vão passar maus bocados perante o eleitorado. Afinal, pelo que se conhece, a situação dos congressistas hoje perante a população não é das melhores.

Por falar em salários extras…
Para você que não acompanhou o dia a dia dessa novela, o Correio Braziliense fez dezenas de reportagens nos últimos dias mostrando que o Senado paga esses dois salários no início e no fim de cada ano Legislativo e não pagam imposto sobre esses valores. A Receita Federal foi atrás do que lhe é devido. Espera a resposta até 2 de abril — logo depois do dia da mentira!

O projeto que extingue a mordomia estava nas gavetas da Casa desde fevereiro de 2011. Só saiu da gaveta quando o Correio jogou um pouco de luz sobre o problema. Agora, com o pedido de vistas coletivo sobre o projeto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) — feito pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP) como forma de evitar que seus pares adiassem indefinidamente a votação —, a proposta tem tudo para ir a votos na semana que vem. Agora, em meio à balbúrdia na base aliada e declarações do próprio líder do governo, senador Eduardo Braga (PMDB-AM), insinuando que o Congresso só funcionava na base do toma lá dá cá, eis uma boa oportunidade para os senadores mostrarem que se preocupam em economizar o dinheiro do contribuinte.

Por falar em base aliada…
Sob a ótica do governo federal, há dois grandes ouriços que podem machucar: um deles é o Código Florestal. Como já dissemos aqui no último domingo, Dilma dificilmente conseguirá cumprir o plano de deixar o texto para votar depois da Rio+20. E, se a proposta for votada, como fechado por 14 partidos, o desgaste para o governo virá tanto em relação aos congressistas — que prometem derrotar o governo — quanto na Rio+20, onde passará pelo constrangimento de ter de explicar por que não conseguiu passar uma proposta mais palatável aos ambientalistas. Portanto, se quiser escapar do troféu motosserra que mencionamos aqui recentemente, só mesmo o veto ao projeto do deputado Paulo Piau (PMDB-MG), que, até aqui, tem o aval de uma grande parte dos colegas.

O outro ouriço são as CPIs. A que pretende investigar as atividades do banqueiro do bicho Carlinhos Cachoeira pretende abalroar não só o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) por suas ligações com o empresário, como também o PT. A CPI da Saúde também é outro tema que preocupa o governo pelo poder de paralisia congressual que uma comissão dessa natureza pode causar. Afinal, na base do governo, ninguém se esquece que a CPI dos Correios, que desaguou no mensalão, começou por uma cobrança de propina de R$ 3 mil nos Correios pelo então diretor de Material, Maurício Marinho. Algo semelhante pode vir via escândalo na saúde.

E a espuma…
Vale lembrar que, no início do mensalão, o PT acreditava que a crise na base do governo Lula era só espuma e que nada afetaria a popularidade presidencial. É bem verdade que insatisfações por parte do PMDB, do PTB e do PR — ou mesmo a tentativa de tirar Ideli Salvatti do governo por parte do próprio PT — são mais espuma do que crise séria. Mas, na hora em que os desacertos políticos se juntam a escândalos de corrupção, cria-se um nó cego, no qual o governo sempre paga o pato. Ou melhor, os cargos. O governo Dilma ainda não chegou a esse ponto, mas o risco existe. Embora a população acredite na honestidade de Dilma como acreditava na de Lula ao ponto de reelegê-lo, ele precisou ser hábil na política. Com a presidente não será muito diferente se chegar a essa situação. Mas, por enquanto, essa habilidade ela ainda não mostrou. Está no ponto que o mercado de ações chama de “wait and see” — esperar e aguardar. Afinal, muita água ainda vai passar sob essa ponte. 

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