sábado, dezembro 31, 2011

Causalidade sem causa - HÉLIO SCWARTSMAN


FOLHA DE SP - 31/12/11
SÃO PAULO - Aproveito o último dia do ano e as indefectíveis retrospectivas de 2011 para discutir a história. Se os economistas já têm problemas para ver seus vaticínios corroborados pela realidade, a situação do historiador é ainda pior.

Além da imprevisibilidade inerente às ciências sociais, o profissional da história é vítima do viés retrospectivo -a inclinação que temos para qualificar eventos que já aconteceram como mais evidentes do que eram antes de ter ocorrido.

Em qualquer cadeia complexa de acontecimentos, na qual cada evento se desdobra com alguma incerteza, há uma assimetria fundamental entre passado e futuro. Um bom exemplo é a previsão climática. Depois do temporal, meteorologistas explicam que ele ocorreu porque a frente fria se moveu da maneira X e a massa de ar quente fez o trajeto Y.

Eles têm bem menos sucesso quando precisam dizer como as frentes vão se comportar daqui em diante.
A diferença está no fato de que, no presente, as massas de ar estão sujeitas a um número quase ilimitado de interações com outros elementos, o que torna proibitivo o número de equações necessárias para determinar seu movimento. Quando olhamos para o passado, as interações que não ocorreram perdem o sentido, o que limpa o terreno e torna a sucessão de eventos óbvia.

A diferença entre o meteorologista e o historiador é que o primeiro testa suas suposições todos os dias e, com isso, produz modelos que são constantemente melhorados. Já o pobre historiador lida com eventos mais abertos e raramente testáveis.

Nossos cérebros, porém, não se acanham e recorrem a fabulações do senso comum para gerar uma ilusão de causalidade onde não há nenhuma. Quando damos uma explicação histórica, estamos ignorando uma enormidade de possibilidades para caprichosamente destacar um fator. É um prato cheio para nossos pendores ideológicos atacarem.

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