domingo, outubro 30, 2011

DORA KRAMER - Consertar é possível



Consertar é possível
DORA KRAMER
 O Estado de S.Paulo - 30/10/11

Reza a lenda entre políticos, analistas e especialistas em geral - que tratam de difundi-la ao ponto de contar hoje com aceitação mais ou menos geral -, que não há outra maneira de se fazer política em governos de coalizão partidária sem entregar a máquina pública ao manejo muitas vezes transgressor dos sócios do condomínio.

Por essa ótica, chega-se à conclusão de que a corrupção é um mal necessário à sobrevivência da democracia, pelo menos tal como ela se apresenta no Brasil com partidos de ideologia difusa e profusão de legendas, cujo apoio majoritário é imprescindível para o êxito de qualquer governo.

É uma linha de raciocínio. Torta, porque fundada no falso pressuposto de que um sistema institucionalmente saudável possa permanecer assim durante muito tempo quando a regra do jogo é a da ilegalidade consentida. Assim como a tese não corresponde aos fatos, não é verdade também que a maioria da população não liga para questões dessa natureza se a economia vai bem e provoca uma sensação de bem-estar.

Está aí a última pesquisa do instituto Latinobarómetro para confirmar: no Brasil, a corrupção aparece como a principal preocupação quando a pergunta é "o que falta à democracia?". Ou seja, as pessoas podem até se sentir bem, mas conectam a epidemia de transgressões à saúde democrática.

José Álvaro Moisés, diretor do núcleo de pesquisas de políticas públicas da Universidade de São Paulo, diz que todos os estudos recentes apontam para o aumento da desconfiança em relação aos partidos e ao Congresso e mostram uma rejeição acachapante (mais de 80%) às práticas que os "especialistas" consideram inerentes à política.

"Elas afetam a qualidade da democracia. Se houver um acúmulo de episódios de corrupção, de escândalos sem punição, de banalização de infrações durante um longo tempo, o resultado será o questionamento da legitimidade dessas instituições", diz. A perda de referência legal e moral, segundo José Álvaro Moisés, gera desconfiança, descrédito, cinismo e conformismo.

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