quarta-feira, setembro 14, 2011

MIRIAM LEITÃO - Aço e dívidas


Aço e dívidas
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 14/09/11

Era domingo, dia 14 de setembro de 2008, quando os mercados souberam que na segunda-feira, 15, o Lehman Brothers não abriria mais. O que não se sabia é que três anos depois a economia mundial ainda estaria chacoalhando na mesma crise. As dívidas de vários países subiram fortemente, e o temor é que tenham ficado impagáveis em alguns casos.

O PIB do Brasil estava crescendo a 6% e despencou. Teve uma pequena recessão em 2009. Hoje, fazendo uma conta mais ampla, o que se vê é que mesmo passando bem pela crise e tendo uma forte recuperação em 2010, o País perdeu um pouco do ritmo. O crescimento do PIB do Brasil nos 11 trimestres anteriores à crise foi de 13,1%, em relação ao mesmo período anterior. Nos 11 trimestres seguintes, até o segundo de 2011, que o IBGE acaba de divulgar, dá um crescimento de 9,6%.

Um dos setores mais diretamente atingidos no Brasil foi a siderurgia. Com a forte queda do crescimento mundial, aumentou muito o excedente de produção, e o Brasil chegou a fechar temporariamente seis altos-fornos. O presidente da Usiminas, Wilson Brumer, acha que o setor está vivendo outro momento da crise:

"Desde 2008 tivemos em vários países do mundo momentos diferenciados de crise. Hoje, isso está acontecendo de novo. Na siderurgia mundial temos excesso de capacidade de aço de cerca de 500 milhões de toneladas. Toda a capacidade instalada no Brasil é de 40 milhões. Antes de 2008, a ociosidade era menos da metade disso."

Brumer acha que mesmo quando saiu da fase aguda a economia continuou andando de lado:

"Crescimento econômico e aço caminham muito próximos. Depois da crise, ficou caracterizada a importância da China em vários setores da economia. O aço é um deles. A China tem quase 800 milhões de toneladas de capacidade instalada de produção. Ela não quer ser grande exportadora de aço, mas de produtos que têm aço. É uma estratégia do governo."

Por isso é que se aprofundou o descompasso entre preço de minério de ferro, em alta; e preço baixo do aço. A China usou parte do aço para investir pesadamente dentro do país e assim manter o ritmo de crescimento, quando o mundo, por causa da crise que estourou em setembro de 2008, reduziu drasticamente o ritmo, principalmente nos Estados Unidos, Europa e Japão.

Outros setores sentiram o baque, mas certas commodities, como grãos, minério de ferro, petróleo, receberam o impulso de outros fatores e voltaram a ter preços altos. O Brasil se aproveitou disso na sua recuperação. Ainda está se aproveitando, porque tem tido superávits comerciais altos mesmo quando o real se valoriza.

Uma grande sequela da quebra do Lehman pode ser observada em relação a quanto era a dívida pública bruta dos países como proporção do PIB e quanto é agora. O Brasil chegou a subir de 65% para 70% e depois voltou a 65%. Normalmente, aqui se usa outra medida, que é a dívida líquida, que desconta as reservas cambiais. Mas neste quadro, com dados do FMI, está sendo analisada a estatística mais usada no mundo.

Como se pode ver, alguns países pagaram um preço alto. A Irlanda, por exemplo, saiu de 25% para 114%. O país perdeu na crise bancária todo o esforço de duas décadas para reduzir o endividamento. A Grécia já tinha uma dívida alta, e ela continuará crescendo porque o país não tem conseguido reduzir o déficit. A Itália também sempre foi país de alto endividamento. Ficava em torno de 100% do PIB, mas com a crise o déficit cresceu, o que permite projetar uma dívida crescente. Os juros começam a ficar mais caros, e os financiadores, mais raros.

Se a indústria em diversos países do mundo - o aço como exemplo mais concreto - não recuperou o ritmo de antes, o grande problema criado pela quebra do Lehman Brothers e a sucessão de choques que se seguiu foi nas dívidas dos países da Zona do Euro, dos EUA e Japão.

Como os Estados Unidos conseguem se financiar sem maiores problemas - mesmo quando é rebaixado - a pior sequela do país foi o desemprego, que saltou para 9%. A Europa na sua longa crise agora olha para a grande emergente à espera de que a China aceite, quando nada, comprar alguns títulos italianos.

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