terça-feira, setembro 13, 2011

ALON FEUERWERKER - O jogo a jogar



O jogo a jogar
ALON FEUERWERKER
CORREIO BRAZILIENSE - 13/09/11



Importa menos o que a presidente vai dizer quando perguntada. "Tem faxina ou não tem?" O povo vai estar de olho mesmo é no que a chefe do governo vai fazer. Doravante, perderá viabilidade o recurso ao "eu não sabia" e ao "todo mundo é inocente até ser considerado culpado em última instância"

Há certa comoção quando a presidente da República afirma não promover a decantada faxina no governo. Estranho seria se dissesse o contrário. Abriria uma conflagração intramuros em ampla escala, uma guerra sem limites e sem quartel. 
Previsivelmente, prefere oferecer à base o eventual colo carinhoso da mãe habitualmente severa, algo sempre operacional nas relações entre uma base e um governo. Como é também entre mães e filhos. 
Mas o que mudou de fato desde que as ondas começaram a balançar o barco governamental? Dilma livrou-se de alguns indesejados, mas não aceitou tocar fogo no paiol para assar o milho. 
No fim, ficou com o melhor de dois mundos. Reconcentrou um poder que recebera diluído e emplacou uma marquetagem favorável. 
A oposição diz que não, que o povo se frustrará por Dilma não levar a tal faxina até o fim. Mas é provável que a oposição esteja errada. É maior a probabilidade de as pessoas concluírem que a presidente não está tolhida pelos desejos dela, mas por circunstâncias. 
Se Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu tomar o papel de embaixador do povo no governo para promover justiça social " e essa persona rendeu-lhe e ao partido mais dois mandatos além do inicial ", Dilma Rousseff vai ocupando o espaço de representante do povo no governo para combater os malfeitos. 
O que conseguir fazer será mérito dela. O que não, será culpa das limitações colocadas por outros. 
Foi sintomático que as manifestações do 7 de setembro contra a corrupção tenham deixado Dilma completamente fora do alvo. A presidente passou batida. 
É um belo ativo, especialmente quando ela consegue afastar a marca da leniência. Armadilha na qual Lula, mesmo com toda a esperteza política, acabou deixando um pedaço do ativo político. 
Agora não tem volta. No terreno da chamada ética, Dilma logrou estabelecer um traço distintivo. 
O ônus? A bicicleta precisa ser pedalada. Importa menos o que a presidente vai dizer quando perguntada. "Tem faxina ou não tem?" O povo vai estar de olho mesmo é no que a chefe do governo vai fazer. 
Doravante, perderá viabilidade o recurso ao "eu não sabia" e ao "todo mundo é inocente até ser considerado culpado em última instância". Essa é a regra do jogo proposto por Dilma. Inclusive para ela própria. 
A Esplanada sabe, e vive uma paz armada. Um armistício. 
A calmaria no olho do furacão. Com todo mundo preparado para a guerra enquanto juram amar a paz. 

Atestado finalE o dólar sobe a ladeira, o que é ótima notícia para quem exporta. E portanto para o crescimento e o emprego. 
Os especialistas dividem-se sobre qual o novo patamar de equilíbrio do câmbio, mas isso é de menos. Importante é o país rasgar a fantasia. 
Não é razoável o brasileiro desfilar por aí como o povo mais próspero e perdulário do planeta. Não tem a ver com a vida real. 
A inflação? O Banco Central aposta que vai ser naturalmente contida pela desaceleração da demanda. A monitorar, mas existe mesmo a possibilidade. Só sair à rua e ver o ritmo declinante dos negócios. 
Da política do BC de hoje fica também o elemento que faltava para a definitiva condenação do BC de ontem. 
Se é possível reduzir hoje os juros em relativa segurança, teria sido facílimo fazê-lo três anos atrás, quando a demanda mais que desacelerou, caiu a zero. 
Fomos então vítimas de uma barbeiragem como nunca antes no Brasil. Juro alto para evitar supostas pressões inflacionárias, quando a demanda simplesmente desaparecera e o mundo passara a praticar juro negativo. 
Ao deixar o cargo, o presidente anterior do BC ofereceu palavras depreciativas a quem o criticava por ter perdido a maior chance da história recente de levar os juros brasileiros a patamar civilizado. 
Foi uma segunda infelicidade. Errou e reconheceu firma. Passou recibo. E o atestado final do erro virá exatamente do sucessor. 

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