terça-feira, fevereiro 01, 2011

AUGUSTO NUNES

O neurônio indomável lançou na visita à Argentina o besteirol em conta-gotas
AUGUSTO NUNES
VEJA ONLINE

Na visita de menos de 7 horas à Argentina, Dilma Rousseff achou pouco emocionar-se apenas na conversa com Cristina Kirchner e no encontro com as Mães da Praça de Maio. Para provar que no peito da mulher mandona bate um coração hipersensível, emocionou-se também ao descobrir que a declaração conjunta das duas presidentes fora lida no Salão dos Pensadores Argentinos. Aquilo merecia um falatório de improviso, resolveu. Primeiro, julgou necessário explicar que o salão da Casa Rosada “é dedicado a escritores e cientistas”. Em seguida, entrou em cena a especialista em não dizer coisa com coisa: “Acho uma simbiose estar aqui. Este é o sentimento da nossa cooperação”.

“Simbiose é uma relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes”, avisam todos os dicionários. O que fez o neurônio solitário associar a palavra ao Salão dos Pensadores? E desde quando cooperação é sentimento? Os argentinos afundaram no silêncio dos perplexos. Os brasileiros fingiram ter entendido tudo. Nenhum jornalista da comitiva solicitou à declarante que traduzisse o palavrório impenetrável em língua de gente.

A estreia internacional mostrou que Dilma tem-se esforçado para assimilar a lição ministrada por João Santana. “Para ocupar o espaço de uma rainha”, vive dizendo o marqueteiro do rei, a presidente deve falar de vez em quando, e só abrir a boca para recitar platitudes ou perfumarias decoradas com bastante antecedência. Em Buenos Aires, a candidata que produziu o colossal Discurso sobre o Nada falou pouco mais de seis horas o que Lula fala em menos de cinco minutos. O neurônio solitário reduziu o ritmo, mas continua indomável.

Os jornalistas da comitiva oficial enxergaram na Argentina a estreia do que qualificaram de “estilo contido e discreto”. Se não lhes faltasse coragem para ver as coisas como as coisas são, teriam testemunhado o lançamento internacional do besteirol em conta-gotas.

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