sábado, janeiro 15, 2011

GERALDO BARROS

Batalha dos preços relativos pode agravar a inflação

GERALDO BARROS
 FOLHA DE SÃO PAULO - 15/01/11

Em geral, a aceleração da inflação tem origem nos excessos cometidos pelas autoridades monetárias e fiscais.
Esse tipo de inflação provoca altas de preços mais ou menos simétricas nos diversos setores econômicos, não havendo ganhos apreciáveis em alguns deles em prejuízo de outros.
Em outras situações, como atualmente e também nos anos 1970, o aumento da inflação decorre de encarecimento de um grupo de bens -que se torna relativamente escasso nos mercados- em comparação com outros cujos suprimentos não apresentaram alteração importante.
A oferta de bens mais dependentes de recursos naturais (produtos agropecuários, minérios, metais etc.) não vem crescendo no mesmo ritmo da demanda, que acompanha a renda de países emergentes e em desenvolvimento (grandes demandantes daqueles bens).
Esse desequilíbrio fica bem claro nos mercados internacionais, cujos preços constituem parâmetros de paridade para a economia de países individuais.
Por exemplo, os preços das commodities no Brasil refletem seus correspon- dentes internacionais, pos- to que somos grandes exportadores.
Também os preços de bens industriais no Brasil deveriam vincular-se ao mercado externo, caso o país quisesse conquistar novos clientes ou, ao menos, competir com as importações.
Em ambos os casos, a tendência de valorização do câmbio suaviza a trans- missão de preços ao mer- cado interno.
De 2000 a 2010, no mercado externo, os preços relativos em dólares dos alimentos dobraram vis-à-vis os dos industriais. No caso das commodities em geral, os preços relativos quase triplicaram.
Mas, por razões que fogem à lógica econômica, no Brasil foi de apenas 20% o aumento de preço relativo entre agricultura e indústria.
Qual seria a razão dessa discrepância entre os mercados interno e externo? Trata-se de uma batalha travada no mercado interno em que os produtores de commodities seguem a evolução do mercado externo, enquanto a indústria aumenta também seus preços (e salários) sem o lastro do mercado.
À indústria se junta o setor de serviços (financeiro, comunicações, de energia, grande comércio), e ambos, valendo-se do poder de mercado usado em aliança com o dos sindicatos, da legislação indexadora e do poder de influência sobre o governo (fonte de subsídios fiscais, creditícios e tarifários), logram evitar ou minimizar as perdas reais de seus preços.
Com isso, não se dá a mudança necessária nos preços relativos e, enquanto ela não ocorre, a inflação prossegue, podendo se acelerar se as políticas monetária e fiscal não coibirem os repasses de preços descasados do que se passa internacionalmente.
Cabe ao governo ser ágil para reduzir substancialmente o grau de indexação da economia.
Recomenda-se cuidado com o câmbio, que tem cumprido o estratégico papel de suavizar as mudanças havidas no mercado externo.
Perdendo-se esse mecanismo -através de desvalorização artificial-, a batalha interna dos preços relativos vai ficar ainda mais acirrada, aumentando o risco de uma prolongada aceleração inflacionária.
GERALDO BARROS é professor titular da USP/Esalq e coordenador científico do Cepea/Esalq/USP

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