quarta-feira, janeiro 20, 2010

VINICIUS TORRES FREIRE

O zum-zum do álcool importado

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10

Parece piada ou pelo menos esquisito, mas voltou a conversa de que há empresas dispostas a importar álcool. Sim, o preço está alto. Mas até hoje se discutem, por exemplo, as restrições americanas à importação do produto brasileiro -o problema é vender, não comprar álcool do exterior. Sim, o preço é assunto de curto prazo; a exportação para o mercado americano é um problema estratégico. Ainda assim, é esquisito. Ainda mais porque o álcool viria dos EUA, famosos por subsidiarem a produção de seu álcool careiro.

De resto, a gasolina é um substituto quase perfeito para o
álcool, pois a frota brasileira é em grande parte "flex".

Foi em outubro do ano passado que o zum-zum sobre a importação de
álcool ficou audível para o público que não vive o cotidiano desse mercado. Na época, o litro do álcool na porta das usinas ameaçava chegar a R$ 1 (preço sem impostos etc.). A história parecia ficção, mas havia chegado aos ouvidos do Ministério do Desenvolvimento e Comércio Exterior.

Foi em outubro também que o governo decretou a cobrança de IOF sobre aplicações financeiras de não residentes ("estrangeiros") a fim de evitar que o real continuasse a se valorizar. Os negociantes que então pensavam em levar adiante o negócio reclamaram do imposto, pois contavam tanto com o aumento de preço do
álcool até meados deste ano como com a alta do real (que baratearia o produto importado).

Segundo o governo, não houve importação, como ainda não haveria pedido de importação. Mas empresas querem redução da tarifa de importação. O governo não comenta. Desde outubro, o real de fato parou de se valorizar. Porém, o preço do
álcool continuou a subir. O preço do litro do álcool hidratado, na porta das usinas, subiu 64% no período (considerada a média semanal dos preços daquele mês comparada à média de janeiro, do Cepea-Esalq).

Um experiente ex-diretor da Unica, associação dos usineiros, diz que o negócio "parece um pouco arriscado". Os preços são voláteis, e se desconhece o tamanho da reação do consumidor à carestia do
álcool. Alguém pode acabar com um estoque importado a preços não convidativos -isso se achar álcool e frete a um preço bom o bastante para trazer o produto para o Brasil.

A história da importação, porém, não é nova. Em 2006, diante de outra onda de alta de preços, o governo baixou temporariamente de 20% para zero o Imposto de Importação de
álcool anidro, misturado à gasolina, e para o hidratado, que vai para o tanque dos carros; também baixou a mistura de álcool à gasolina, como agora. Então, os especialistas emálcool, dentro e fora do governo, consideravam a medida inócua -não haveria álcool barato e em quantidade relevante no mercado mundial.

O
álcool está caro porque a produção baixou. Porque choveu demais, o que atrapalhou a colheita e a qualidade da cana. Porque provavelmente se vendeu mais açúcar, que está com bom preço no mercado mundial, por ora. E o álcool subiu devido ao velho problema dos estoques (piorado neste ano porque no início de 2009 as usinas fizeram jorrar álcool barato no mercado, para fazer caixa). Fazer estoque custa dinheiro, e as empresas estão mal das pernas, incapazes de tomar crédito.

MÔNICA BERGAMO

Enquanto isso, no Suriname...

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10

Continua forte a tensão entre brasileiros e os surinamenses "maroons", descendentes de quilombolas que agrediram a pauladas mais de cem garimpeiros do Brasil em Albina, em dezembro. Na noite de segunda-feira, duas brasileiras foram estupradas durante assalto a um supermercado no interior do país. A embaixada do Brasil no Suriname confirma a informação.

VERSÕES
Rumores de conflitos causados por brasileiros pipocam nos jornais do Suriname, mas o embaixador brasileiro, José Luiz Machado e Costa, diz que as notícias são falsas. "Os jornais publicam reportagens sobre crimes liderados por brasileiros, baseados apenas em relatos de "maroons". Quando procuramos a polícia, descobrimos que aquilo não aconteceu."

BOLSA RETORNO
Entre os garimpeiros agredidos em Albina, cerca de 60 continuam em hotel em Paramaribo pago pelo Itamaraty. E 20 já fizeram uso de uma oferta da embaixada brasileira para que voltem ao país -passagem paga até Belém mais R$ 35 para despesas de viagem (lanche, cartão telefônico etc.).

IMPEDIMENTO 1
A Prefeitura de SP vetou a construção de uma área VIP corintiana no Sambódromo do Anhembi que, batizado de Camarote do Centenário, prometia até a presença do atacante Ronaldo. Em avaliação preliminar, considerou que a exibição de marcas ligadas ao clube poderiam ferir outros contratos, como o da TV Globo.

IMPEDIMENTO 2
A academia de ginástica que promoveria o Camarote do Centenário, entre os setores D e E do complexo, diz que vai reformular o projeto para tentar emplacar a aprovação.

CORDINHA Gilberto Kassab vai agraciar os pescoços do presidente Lula e do governador José Serra com as duas primeiras medalhas 25 de Janeiro, nova distinção inventada pela prefeitura.

EXPRESSO BSB O grupo Fasano chega a Brasília. Abrirá um Gero Caffe no shopping Iguatemi da capital.

MADONNOU
Jesus Luz faz filantropia hoje. Toca no clube Royal em festa com renda destinada ao Haiti, batizada de "Luz para o Haiti".

RATAVA O efeito 3-D sumiu numa sessão do filme "Avatar", no sábado, no Cinemark do shopping Pátio Higienópolis. Espectadores só conseguiam ver o longa em três dimensões se colocassem seus óculos de ponta-cabeça. O cinema diz que uma queda de energia inverteu a polaridade do projetor digital e que a falha foi corrigida.

PARA DEPOIS
Foi adiado o show que reuniria 13 cantoras da MPB, como Sandy e Fafá de Belém, para homenagear Zilda Arns na próxima segunda-feira. Segundo a organização, não havia tempo para os ensaios. O show deve acontecer após o Carnaval ou na Virada Cultural, em abril.

URNA
O promotor Marcio Christino também disputará a eleição para procurador-geral de SP.

NO HALL, COM A FACA
Os convidados do desfile da grife 2nd Floor, que acontece hoje na SPFW, receberam com o convite o jogo "Detetive", da Estrela. A coleção de inverno da marca tem o jogo como uma de suas fontes de inspiração.

"UÓSHITO E GREICE"

Escola de inglês dá bolsa para "nomes estranhos"

A escola de inglês Cultura Inglesa iniciou ontem uma campanha, em sua nova unidade de Sorocaba (SP), focada em pessoas com "nomes estranhos". O anúncio, criado pela agência de publicidade Lew Lara TBWA, diz: "Se você se chama Uóshito, Maico, Bredi, Uélito ou Greice Kelly, o primeiro semestre na Cultura Inglesa é grátis. Afinal, você deveria falar inglês desde que nasceu".

ALEXANDRE SCHWARTSMAN

O sonho de Odisseu


FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10


BCs independentes foram criados para evitar que um bem público fosse ameaçado por conveniências políticas

A CRISE recente na Argentina serviu de pretexto para a abertura da temporada de disparates de 2010. É bem verdade que a criação de bobagens jamais respeitou o calendário gregoriano, mas desta vez seu escopo foi substantivamente alargado: deixamos o domínio da economia para adentrarmos, com tração nas quatro, no pantanoso terreno da democracia.
Recapitulando, o governo argentino ordenou ao banco central (BCRA) que transferisse cerca de US$ 6 bilhões de suas reservas para um fundo destinado ao pagamento da dívida. O presidente do BCRA, Martín Redrado, recusou-se, baseado na legislação vigente, que assegura que as reservas só podem ser utilizadas para pagamento de obrigações do próprio BCRA (aliás, esse argumento -de que os dólares do BCRA pertencem a ele, e não ao Tesouro argentino- é o que impede credores de sequestrarem as reservas para pagamento das dívidas em default).
Devido à recusa de Redrado, o governo o demitiu, embora a lei argentina estabeleça que o presidente do BCRA só possa ser demitido pelo Congresso. Baseado nisso Redrado conseguiu, num mandado de segurança, ordem que o mantém no cargo, deixando o BCRA na curiosa situação de possuir dois presidentes (se cada um pudesse ficar com a responsabilidade por só metade da inflação, até que não seria tão ruim). Esses são os fatos. Passemos às tolices.
Há quem reconheça que as regras existem e foram descumpridas pelo governo argentino, mas argumenta que regras "ilegítimas" não devem ser observadas. Simultaneamente, porém, assegura que "insubordinação se pune", posição esquizofrênica, pois prega a obediência a uma decisão que desobedece à lei.
Leis existem, entre outras coisas, para limitar o poder do soberano. Não é difícil imaginar o que cada governante (ou cada indivíduo) faria se os limites da lei pudessem ser violados com base no que cada um considera "legítimo". Duvido, por exemplo, que o autor do argumento tenha apoiado a decisão do governo Bush de manter prisioneiros em Guantánamo, ainda que os formuladores da "guerra ao terrorismo" achassem seus motivos e, logo, suas ações perfeitamente "legítimas", apesar de sabidamente ilegais. Acredito também que não endosse a ação dos que acham "legítimo" assassinar médicos que praticam o aborto nos EUA.
Outros clamam que a medida não violaria a independência do BC porque esta diria respeito somente à política monetária, quando o caso se refere à política fiscal. Não veem (ou fingem não ver) que essa linha de argumentação limitaria qualquer ação do BCRA que tenha efeitos fiscais. Uma elevação de taxa de juros, por exemplo, poderia ser questionada com base na mesma lógica.
Defendem ainda que o princípio da independência plena dos bancos centrais seria "antidemocrático", embora todas as grandes democracias deste lado da galáxia adotem nada menos que a independência plena dos bancos centrais (e, não, o Federal Reserve não tem uma "independência razoável" como o BC brasileiro: seus diretores têm mandatos fixos e escolhem sua própria meta de inflação).
Esse arranjo não surgiu por acaso. Da mesma forma que a lei limita o poder do soberano, BCs independentes foram criados exatamente para evitar que um bem público, a estabilidade de preços, pudesse ser ameaçado pelas conveniências políticas do príncipe. Democracias descobriram que certas amarras autoimpostas são cruciais para prevenir que o canto das sereias produza resultados que lhes causem danos às vezes irreparáveis, mas parece haver quem ainda não tenha amadurecido o suficiente para compreender isso.

Alexandre Schwartsman, 46, é economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

GILLES LAPOUGE

Ação de Washington expõe lentidão da UE

O ESTADO DE SÃO PAULO - 20/01/10


O desembarque dos EUA no Haiti deixou a Europa estupefata. O que aconteceu com Barack Obama, que há um ano vem sendo descrito como um homem indeciso e hesitante? Em poucas horas, ele encontrou 10 mil soldados, 19 helicópteros, 1 hospital flutuante com 12 salas cirúrgicas e instalou tudo isso no Haiti, tomando, de passagem, o aeroporto de Porto Príncipe.

Aviões humanitários franceses, brasileiros e italianos tiveram de dar meia-volta e pousar em outro país, o que provocou a cólera de Alain Joyandet, secretário de Estado da França. Ele disse que "protestaria", mas, em seguida, o presidente Nicolas Sarkozy o desmentiu.

Entretanto, é verdade que o "golpe" de Obama despertou as desconfianças antiamericanas. As imagens de Porto Príncipe suscitaram lembranças desagradáveis: a exibição de força, a arrogância dos soldados, a mania dos generais americanos de colocar os generais europeus em sua insignificância. A irritação foi tão gritante que Obama divulgou uma espécie de justificativa: "Não viemos para submeter os outros, mas para ajudá-los a se reerguer."

As críticas dos "antiamericanos" seriam mais audíveis se a Europa tivesse tido um bom comportamento. Ocorre que a União Europeia se limitou a dar o espetáculo que ela representa melhor: o de sua impotência e de suas discórdias.

O novo presidente da União Europeia ficou mudo. A nova ministra das Relações Exteriores, a britânica Catherine Ashton, não foi ao Haiti. Ela achou que poderia se esquivar fazendo críticas indiretas a Hillary Clinton, que, no entanto, estava lá. "Catherine Ashton não pretende fazer turismo de desastre", era o que se dizia.

A opinião pública já começa a se cansar. Esses haitianos estão ficando monótonos. Só se fala neles. Todos esses mortos, essas crianças desfiguradas. Nós amamos esses pobres coitados, mas é que o Haiti é um país maldito! Por outro lado, a França mostrou, mais uma vez, que tem coração. O ministro da Imigração, Brice Hortefeux, disse que o país não mandará de volta os haitianos que estão em situação irregular na França. Pelo menos por enquanto.

O público se cansa. Ontem, uma rádio apresentou uma transmissão sobre o Haiti. Com o testemunho do poeta haitiano Metellus, que falava de sua dor, de todos os crimes que a ilha sofreu pela mão de estrangeiros, de Napoleão a Jules Ferry, sem falar nos crimes americanos. E, durante, todo o tempo, não paravam de chegar e-mails dizendo: "Chega de Haiti! Nós, franceses, também temos nossos problemas!"
*Gilles Lapouge é correspondente em Paris

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Crise e alta do ouro elevam a procura por penhor de joias

folha de são paulo - 20/01/10


A procura por penhor de joias cresceu no ano passado. A linha de crédito da Caixa Econômica Federal realizou empréstimos que somaram R$ 5,4 bilhões em 2009, o que representa aumento de 6,3% em relação ao ano anterior.
Em dezembro, o saldo da carteira de penhor (o volume contratado menos as liquidações) era de R$ 758 milhões, 18% acima do de dezembro de 2008.
A procura por esse tipo de crédito aconteceu "em consequência da crise financeira e da valorização do preço do ouro", de acordo com Jorge Pedro de Lima Filho, gerente nacional de aplicação de pessoa física da Caixa. Os números também revelam que houve aumento da permanência do contrato por mais tempo, diz Lima Filho.
Como uma das linhas de financiamento mais tradicionais e populares, o penhor é atrativo graças às facilidades de acesso ao crédito e juros baixos.
O empréstimo corresponde a 85% do valor de avaliação da joia, e o limite máximo de financiamento é de R$ 50 mil. Por ter o bem como garantia, a inadimplência é baixa, de 0,2%.
As taxas de juros cobradas são abaixo da média do mercado. No micropenhor, para empréstimos até R$ 1.500, os juros são de 1,68% ao mês, com prazo máximo para pagamento de 180 dias. Já na modalidade tradicional, acima de R$ 1.500, as taxas são de 2,05% ao mês.
Para o final de 2010, a expectativa da Caixa é que o saldo da carteira atinja R$ 900 milhões. Para facilitar o acesso ao crédito, o banco quer aumentar o número de agências que oferece o serviço, de 438 para 500, e ampliar a base territorial de atendimento. O banco está expandindo o penhor itinerante, que permite que o crédito chegue a microrregiões, por meio de um avaliador que transita entre as agências.
Segundo pesquisa da Caixa, o penhor de joias é usado na maioria das vezes por mulheres, entre 30 e 45 anos, e para o pagamento de dívidas pessoais. A maioria dos empréstimos acorre no primeiro semestre, quando as pessoas enfrentam mais dificuldades financeiras, segundo Lima Filho.

PASSO A PASSO
A Calçados Bibi vai ampliar os investimentos na linha de calçados fisiológicos. Hoje 60% da produção da empresa de calçados infantis é feita com a tecnologia patenteada chamada Fisioflex. Com base em estudos com médicos especialistas em ortopedia e pediatria, a companhia criou uma palmilha que não interfere no desenvolvimento dos pés, ativando pequenos músculos do corpo. Os calçados custam nas lojas, em média, de R$ 60 a R$ 140. A Bibi deve crescer 23% neste ano, puxada, principalmente, pelas vendas dos calçados fisiológicos, segundo Marlin Kohlrausch, presidente da companhia. A expectativa da empresa é comercializar 3,2 milhões de pares neste ano, com faturamento de R$ 115 milhões. Segundo pesquisa realizada nos EUA, pelo grupo NPD, o mercado de calçados fisiológicos está em alta. Eles geram quase 25% do volume do setor calçadista no país.

OTIMISMO 1
Ao contrário do início de 2009, neste ano, o índice de confiança do consumidor, medido pela Fecomercio SP, abriu janeiro com patamar recorde. O indicador alcançou 158,7 pontos, alta de 2,2% em relação ao fechamento de dezembro, quando registrou 155,2 pontos. Acima de cem o índice é considerado otimista.

OTIMISMO 2
Na comparação com janeiro de 2009, quando o comportamento do consumidor foi afetado pela crise, o índice apresentou crescimento de 27,5%.

DETERGENTE
A Abipla (associação das indústrias de produtos de limpeza) espera registrar economia de US$ 38 milhões nos próximos 12 meses, devido à manutenção da redução da alíquota de 10% para 2% do Imposto de Importação de algumas mercadorias usadas como matéria-prima na indústria.


ÁGUA SANITÁRIA
O setor de produtos de limpeza registrou faturamento superior a R$ 12 bilhões em 2009, com crescimento de 7% ante o ano anterior. Para 2010, a previsão é de 10%, segundo a Abipla.

GOTA A GOTA
Neste ano, a AmBev irá investir R$ 20,3 milhões em projetos ambientais. A empresa pretende monitorar todo o volume de água gasto na sua cadeia produtiva, desde a produção de cevada até o ponto de venda.

MACA
Autoridades de vigilância sanitária de todo o mundo se reunirão entre os dias 26 e 29, em SP. Na pauta: a harmonização regulatória global dos produtos para a saúde. Haverá representantes de EUA, Austrália, Argentina, Canadá, México, Japão, Holanda, Bélgica e outros.

DOS PÉS À CABEÇA
O evento anual São Paulo Prêt-à-Porter, que será inaugurado em janeiro de 2011, paralelamente à feira de calçados e acessórios Couromoda, terá como parceiro o grupo italiano responsável pelas feiras Pitti Uomo/Donna, de Florença.

CALENDÁRIO
Francisco Santos, presidente do Grupo Couromoda, quer trazer 1.500 expositores para a primeira edição do evento. O objetivo do grupo, que também é dono de feiras de beleza e saúde, é promover uma semana internacional de moda e negócios.

com JOANA CUNHA e ALESSANDRA KIANEK

FERNANDO RODRIGUES

Nuances entre Chile e Brasil


Folha de S. Paulo - 20/01/2010

Depois de 20 anos, o grupo ocupante do poder no Chile foi derrotado. Venceu a eleição presidencial o conservador Sebastián Piñera. Perdeu Eduardo Frei, apoiado pela atual presidente, Michelle Bachelet -cuja popularidade está na casa dos 80%.
Tucanos e petistas têm propagado analogias entre o processo eleitoral chileno e o brasileiro. No PSDB, o raciocínio hegemônico é só intuitivo. Lula tem aprovação de até 80%. Logo, não é certo que haverá transferência direta de votos do presidente para sua candidata ao Planalto, Dilma Rousseff.
Petistas rebatem. Apontam a possível fadiga de material sofrida pelo grupo de Bachelet após 20 anos contínuos no poder.
São observações políticas. Têm algum valor. Mas o aspecto mais relevante a ser considerado talvez seja outro: o estado da economia. No Chile, o clima geral é ruim.
Conforme relatou Thiago Guimarães para a Folha, o PIB chileno avançou a uma média anual de 6,6% nos anos 90. Caiu a 4,3% na primeira metade desta década. Sob Bachelet, o ritmo recuou a 2,7%. No ano passado, deve ter ocorrido queda de 1,6%. O desemprego em 2008 era de 7%. Agora está em 9%.
Ao votar, certamente o eleitor chileno levou em conta a parte mais sensível do corpo: o bolso.
No Brasil, o cenário é quase antípoda ao chileno. Quando Lula tomou posse, a taxa de desemprego rondava os 13%. Hoje, está perto de 8%. O PIB de 2009 estagnou, mas não é o recuo amargado pelos chilenos. Neste ano, o crescimento deve ficar na redondeza de 5%. Tudo coroado pelo Bolsa Família, distribuição de dinheiro a cerca de 50 milhões de pessoas pobres.
Como se observa, a condição objetiva da economia no Brasil é mais favorável ao governo. No Chile, deu-se o oposto. Essa conjuntura, por óbvio, não torna inexorável uma vitória do PT. Só é um fator não desprezível na comparação do quadro eleitoral dos dois países.

RUY CASTRO

Libido represada


Folha de S. Paulo - 20/01/2010
Na sexta-feira, em São Paulo, num confronto entre gangues na Vila Nova Cachoeirinha (zona norte da cidade), um "soi disant" punk de 15 anos foi agarrado pelo braço por um grupo de skinheads idem dentro de um carro e arrastado por 60 metros pelas ruas. Sofreu traumatismo craniano, corte extenso no rosto, fraturas na fronte e nas costelas e lesões no fígado e nos rins.
Os skinheads alegam que o punk é que saltou na direção do carro para agredi-los com a ajuda de outros 20 punks. Na troca de acusações, os punks dizem que os skinheads não gostam deles, nem de negros, nordestinos e homossexuais. Mas os punks tampouco são famosos pelo convívio em sociedade.
No Rio, na mesma noite, um grupo de jovens, moradores do Grande Méier, marcou pela internet uma briga com a turma do Grajaú, também na zona norte carioca. O cenário seria uma praça no próprio Grajaú. Na hora combinada, a gangue visitante compareceu, armada de rojões, paus com prego na ponta, pedras, soco inglês.
Mas o bando local fez "forfait" -segundo consta, porque começara a chover forte- e isso revoltou os de fora. Os quais, para descarregar a tensão, descontaram em carros e lixeiras da praça e deram um teco em três garotos que passavam por ali. A polícia prendeu 25 dos vândalos, dos quais 16 menores. Em poucas horas, todos já estavam liberados e em casa, de pijama, prontos para tomar sua gemada e dormir.
Há algo meio fora de moda nesses jovens que marcam brigas, mesmo que pela internet. Dá a entender que só são valentes em quadrilha. Se não houver droga no pedaço, a explicação para tanta energia é uma tremenda libido represada. O que, em 1954 ou 1955, ainda era compreensível. Mas, hoje, com a libido de há muito liberada para fins imorais, homem que é homem não briga com homem.

CELSO MING

A população envelhece


O Estado de S. Paulo - 20/01/2010
Nunca na História a população mundial envelheceu tanto. Esse não é um fenômeno circunscrito a países avançados; atinge mais ou menos uniformemente o mundo inteiro. Terá consequências profundas em todas as dimensões da vida humana. E essa não é uma característica episódica da demografia mundial; é tendência duradoura.


São essas as quatro mais importantes conclusões do informe das Nações Unidas sobre a situação etária da população global que acaba de ser divulgado: Envelhecimento da população mundial - 2009 (World Population Ageing - 2009).

Em seguida, você tem outras observações feitas pelos especialistas das Nações Unidas:
Em 2009, seis países tinham mais da metade da população mundial com mais de 80 anos: China, Estados Unidos, Índia, Japão, Alemanha e Rússia. Em 2050, o Brasil será um deles, com 14 milhões de pessoas de 80 anos para cima.

Atualmente, uma pessoa em cada nove tem mais de 60 anos; em 2050, será uma em cada cinco. A população mundial cresce a um ritmo de 1,2% ao ano. Enquanto isso, o número de sexagenários aumenta 2,6%. Ou seja, tem mais gente envelhecendo do que nascendo.

Em 1998, os países ricos já tinham mais gente com 60 anos do que com 14. Em 2045, o mundo inteiro estará nessas condições. Em 1950, apenas 8% da população mundial tinha mais de 60 anos. No ano passado, já eram 11%. Em 2050, serão 22%.

No segmento com 60 anos ou mais, a faixa etária que mais cresce é a dos 80, a um ritmo de 4% ao ano.

A idade média da população mundial é 28 anos. Dentro de 40 anos, esse marco divisório saltará para a faixa dos 38 anos. O campeão em média de idade mais avançada é o Japão, com 44 anos. O país mais jovem é o Níger, com 15 anos.

Em 1950, a expectativa de vida da população mundial era de 48 anos. No ano passado, essa média saltou para 68. Nos países ricos, quem chegou aos 60, tende a avançar aos 80, se for homem; e aos 82, se for mulher. Nos países em desenvolvimento, a média cai para 75 anos para homens e 77 para mulheres.

Como é fato há muito conhecido, na média, as mulheres vivem mais do que os homens. Mas a proporção em que isso acontece hoje é novidade: a população feminina com mais de 80 anos é quase o dobro da população masculina.

O arquiteto Oscar Niemeyer está longe de estar sozinho no clube dos centenários. No ano passado, 454 mil pessoas no mundo já haviam passado dos 100. Em 2050, serão 4 milhões, aumento de 780%. Em relação aos velhinhos centenários, as mulheres são entre quatro e cinco vezes mais numerosas.

Longe de ser apenas uma sopa de estatísticas, essas mudanças nas condições etárias do mundo terão consequências cuja importância será muito maior do que simplesmente o aumento em 2,6% ao ano das vagas preferenciais para idosos em bancos, cinemas e shopping centers. Muita coisa vai mudar na economia, na relação de poder, no planejamento urbano, na saúde pública e na política de lazer. Possivelmente mudará inclusive o próprio conceito de idoso. Mas essas considerações ficarão para outra edição.

Confira
Te cuida, Redrado! - Até mesmo a oposição argentina não se sente à vontade para segurar Martín Redrado no cargo de presidente do Banco Central da República Argentina.


Dois políticos importantes da oposição, o presidente do Partido Radical, senador Ernesto Sanz, e o vice-presidente da Câmara dos Representantes, Ricardo Alfonsín, sugeriram segunda-feira que Redrado entregue o cargo.

"É difícil sustentar essa situação. É preciso que haja uma boa relação entre o Poder Executivo e o presidente do Banco Central", declarou Alfonsín ao diário La Nación.

JANIO DE FREITAS

Lá para cá diferenças há

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10

A máquina e o peso do governo não foram fatores eleitorais no Chile; no Brasil de Lula, são o principal fator

ERA FATAL: se o candidato da direita perdesse a eleição no Chile, consolidaria a tese de que um presidente com alta aprovação transfere votos ao candidato governista; se vencesse, como Sebastián Piñera venceu, seria uma advertência para Lula, que "já está preocupado" enquanto "a oposição se regozija". As deduções se repetem. Mas em nenhum dos casos se justifica qualquer equivalência entre a disputa chilena e a perspectiva eleitoral brasileira.
Duas de várias razões já asseguram a incompatibilidade das situações de lá e de cá. A primeira delas é a atitude mantida por Michelle Bachelet, que cumpriu sem desvio algum o preceito de que aos presidentes cabe presidir as eleições. Permitiu-se no máximo, já no segundo turno, uma palavra de eleitora favorável a Eduardo Frei, de cuja escolha como candidato Bachelet nem participou.
Detentora da melhor avaliação entre todos os presidentes das Américas, com 85% de aprovação pessoal, Bachelet não conseguiu fazer um governo de sucesso. Tal como se dera com seu antecessor, o respeitado Ricardo Lagos. As resistências dos setores influentes projetaram dificuldades políticas que mantiveram o governo, sempre, aquém das expectativas da população. Dois problemas muito sérios no Chile, que são a previdência social e o sistema educacional deformados no tempo de Pinochet, não receberam as esperadas reformas e foram causa permanente de agitação, até com violência. E as camadas de pobreza e miséria não foram satisfeitas pelo chamariz do assistencialismo.
Em resumo, a máquina e o peso do governo não foram fatores eleitorais no Chile. No Brasil de Lula, são o principal fator.

Comprovação
A queixa telefônica feita por Lula a Barack Obama ontem -o Brasil "está sobrecarregado" no Haiti- confirma a mesquinhez das reclamações e insinuações do governo brasileiro, à frente o ministro Celso Amorim, em relação à prevalência brasileira que os Estados Unidos estariam usurpando, com sua presença tão maior por lá.
Reduzir as urgências da tragédia e do sofrimento a questiúncula política, e ainda por cima sem ter condições reais de nem sequer argumentar, faz pensar que essa história de Brasil potência já passa da imaturidade ao patético.

O impostor
É nenhuma, e deveria ser a maior possível, a providência dos Ministérios das Relações Exteriores e da Justiça diante do que disse o cônsul do Haiti em São Paulo, o branco libanês George Samuel Antoine, a respeito de negros em geral. Trata-se de um racista extremado e grosso, cujas palavras, que não posso reproduzir, se ditas por um brasileiro acionariam as penas da Lei Afonso Arinos.
Esse cônsul impostor de um país de negros agrediu também os negros todos deste país de negritude com origem idêntica à dos haitianos. A única atitude responsável e digna por parte dos dois ministros, Celso Amorim e Tarso Genro, é a expulsão sumária desse George Samuel Antoine, que nem insultou só os negros, mas o Brasil como "todo país que tem africano".

JOSÉ NÊUMANNE

O fantasma da vingança espreita a eleição

O ESTADO DE SÃO PAULO - 20/01/10


A polêmica provocada pelo decreto criador do 3º Programa Nacional dos Direitos Humanos (PNDH) mostra que ainda não acabou a cesura que remonta às origens do Partido dos Trabalhadores (PT) sobre a natureza da democracia pretendida por seus militantes. Será a clássica democracia burguesa de controles e contrapesos exigidos pelos Pais Fundadores da Revolução Americana de 1783, com a adoção de três Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) autônomos e soberanos, fórmula do francês Montesquieu? Ou a direta, a ser exercida por consultas permanentes à cidadania por plebiscitos e referendos e por conselhos compostos por delegados (neste debate se tem lembrado que soviet significa conselho em russo)? A diferença entre as duas é que a primeira é obviamente imperfeita e a segunda, impossível de ser praticada, tal como define seu significado semântico, conforme disse o cientista político Leôncio Martins Rodrigues em entrevista a este jornal, domingo.

A dúvida traz outra à baila: será a eleição dos mandatários do Executivo e dos representantes do cidadão no Legislativo o momento crucial do exercício do poder pelo povo, como determina a Constituição (no caso do Brasil, mais do que isso, pois nossa democracia é exclusivamente eleitoral), ou apenas um pretexto para galgar o poder e de lá submeter a Nação às próprias convicções? A resposta a essa pergunta é fundamental neste momento em que o País se prepara para viver a sexta escolha direta do chefe do Poder Executivo desde o fim da vigência do acordo negociado na cúpula para a extinção do regime autoritário e sua substituição por um Estado Democrático de Direito, nos moldes definidos na velha democracia burguesa. Luiz Inácio Lula da Silva subiu a rampa do Palácio do Planalto impulsionado por duas votações que manifestaram a inequívoca vontade da maioria do eleitorado de vê-lo no poder. Seu talento inato para se comunicar com o cidadão comum o tornou o mais popular governante do Brasil desde Tomé de Souza e com parcas chances de vir a ser superado nisso, a julgar pelos quadros atuantes na política e na gestão pública.

Lula fez-se conhecer como dirigente sindical desatrelado do peleguismo no controle da organização dos trabalhadores pelo PTB de Getúlio Vargas e do anarcocomunismo que dirigia o sindicalismo antes das greves do ABC, nos anos 70. Incorporou-se à tradição conciliadora que moldou o estilo de importantes homens públicos brasileiros: dom Pedro II, Bernardo de Vasconcelos, Getúlio Vargas e Tancredo Neves. A primeira conciliação, mercê de seu talento para o ecumenismo, deu-se já na fundação do PT. Antes, dizia-se que a esquerda brasileira só se unia na cadeia. Sob sua égide se reuniram egressos de grupos guerrilheiros de posições inconciliáveis com líderes sindicais apartidários (caso dele próprio) e a esquerda católica, dividida entre políticos "progressistas" da democracia cristã e militantes da Teologia da Libertação, em comunidades eclesiais de base e pastorais.

O tão decantado carisma de Lula e sua habilidade de milagroso domador dos gatos desse incrível saco foram insuficientes para levá-lo ao poder e à glória de agora nas três tentativas que fez antes de chegar à Presidência - a primeira contra Collor e outras duas contra Fernando Henrique Cardoso. O milagre da ascensão ao topo do poder só foi possível com a segunda conciliação, fruto de seu oportunismo e iniciada com o abandono do programa socialista, que unia apenas os três grupos originais do PT, e a adoção de um discurso de austeridade fiscal e combate à inflação da era pós-Palocci. O desgaste dos laços que atavam o saco de gatos, amarrado pelos pretensos social-democratas sob Fernando Henrique, permitiu a Lulinha Paz e Amor promover a segunda e ainda mais bem-sucedida conciliação com a escória da velha política brasileira, que os petistas de antanho chamavam de "isso que está aí". A reverência que o atual presidente fez ao ex Sarney, ao evitar a degola dele na presidência do Senado, teve natureza simbólica, pois a certeza do clã maranhense de que o candidato tucano à sucessão de Fernando Henrique, José Serra, tivera papel decisivo na perseguição à herdeira do chefão, Roseana, no episódio da descoberta de dinheiro vivo em seu comitê eleitoral, foi determinante para a desistência da candidatura por ela. E a senha oportuna para a velha plutocracia mudar de palanque, como agora para beijar a mão da guerrilheira aposentada Dilma Rousseff.

É claro que a fisiologia descarada só se curva hoje à Utopia derrotada na guerra suja, mas vitoriosa no confronto ideológico, seja com a direita que desabou com a ditadura, seja com os liberais da pusilânime aliança PSDB-DEM, porque não quer largar o osso do poder. Nisso, aliás, imita o mais poderoso, Lula, que quer eleger a chefe da Casa Civil na convicção (talvez ilusória) de que será conviva de honra nos banquetes da fortuna e da glória depois da posse de quem lhe suceder.

Há, contudo, entre o criador e a criatura mais diferenças do que pode supor sua débil filosofia. Uma delas é que, por menos que saiba disso, o matreiro Lula ajudou a derrubar o autoritarismo de cima do palanque do Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo, tornando-se, com todas as honras, herói desta democracia que está aí, por mais imperfeita que ela possa ser. E a guerrilheira desalmada e desarmada participou de um processo de enfrentamento militar que só prolongou a longa noite dos porões. E, depois, penetrou no centro das decisões no vácuo do chefe. Isso induz democratas assustados a imaginar que o 3º PNDH seja um projeto de vingança a ser realizado em seu eventual, embora provável, futuro governo. Enquanto ela não esclarecer isso com todas as letras, este fantasma que reabre feridas já cicatrizadas faz tempo continuará a nos espreitar.

José Nêumanne, jornalista e escritor, é editorialista do Jornal da Tarde

EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO

Lula e as centrais

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10


UMA MEDIDA tramada na surdina pelo governo Lula deve garantir, ao menos ao longo do ano eleitoral de 2010, o direito de centrais sindicais nanicas à participação na divisão do bolo do imposto sindical.
Uma portaria do Ministério do Trabalho, de 2008, exigia, a partir deste ano, que uma central representasse ao menos 7% dos trabalhadores sindicalizados no país para ter direito aos recursos repassados pelo governo. Posta em prática, significaria o fim da benesse para três das seis centrais hoje reconhecidas.
Ao mesmo tempo, a lei que legalizou as centrais sindicais, também de 2008, previa um piso de representatividade menor, de 5%, até dois anos depois de sancionada, quando passaria a valer a exigência dos 7%. O prazo vence em março.
A manobra do governo consiste em revogar o trecho da portaria que estipulava o limite maior já em 2010 e, simultaneamente, interpretar que o novo piso só passa a valer em 2011, já que o prazo de 24 meses da lei cai "no meio de um exercício".
Enquanto isso, as centrais nanicas correm para incorporar novos sindicatos às suas siglas. É compreensível o esforço. Não há dados consolidados para 2009, mas, entre janeiro e julho, as entidades embolsaram R$ 74 milhões do imposto sindical.
A dependência de recursos públicos desvirtua o sindicalismo. Em vez de instrumento legítimo para negociações trabalhistas, a máquina sindical passa a servir aos interesses dos dirigentes que nela se encastelam.
Opera nesse campo um dos traços arcaicos da gestão Lula, que busca atrelar ao Estado, com repasses de verba e outros privilégios, vários grupos de interesse. Tal método tem custado caro ao país, tanto por pesar sobre o Orçamento quanto por desvirtuar os objetivos, e por comprometer a independência, de associações típicas da sociedade civil, como as centrais sindicais.

PAINEL DA FOLHA

"O máximo possível"

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10


Para cumprir à risca o discurso de Lula, para quem "é importante inaugurar o máximo de obra possível" antes que Dilma Rousseff troque a Casa Civil pela campanha, o Palácio do Planalto preparou uma agenda com pelo menos 11 inaugurações até o fim de fevereiro. Juntos, o presidente e a ministra-candidata passarão por sete Estados alardeando o PAC.
A lista de eventos vai de um centro de tecnologia em Porto Alegre à "última turbina" da hidrelétrica de Baguari (MG). No caminho, há uma usina de etanol no Pontal de Paranapanema (SP) e uma fábrica de celulose em Três Lagoas (MS). Isso sem contar as escalas em Davos e no Fórum Social Mundial.


Ritmo. Em janeiro do ano passado, Lula fez quatro viagens pelo país, nenhuma a título de inauguração.

2014? Antes de anunciar que pretende voltar ao Vale do Jequitinhonha quando deixar o governo, o presidente já havia comentado com auxiliares que planeja passar seis meses viajando pelo país, numa espécie de nova versão das Caravanas da Cidadania.

Galhos. No discurso em Minas, Lula manifestou preocupação especial com uma árvore dentro de um lago: "Vai que eu venho aqui com meus 70 anos, dou um mergulho e me engancho numa árvore? O presidente morre afogado numa barragem que ele fez".

%#@*&!. Pouco antes de ir às lágrimas ao afirmar ser "mineira de alma", Dilma falou reservadamente cobras e lagartos do tucano Eduardo Azeredo, um dos que tripudiou sobre sua "mineirice".

Origens. Tucanos mineiros voltaram a chiar: "A ministra nasceu no Estado, mas nunca teve vínculos aqui. Não fica bem ela se lembrar de Minas só na hora da campanha", disse Danilo de Castro, secretário de Governo do Estado.

Na rede. A oposição prepara uma nova leva de ações na Justiça acusando o governo de propaganda eleitoral antecipada. O principal alvo é o blog do Planalto, que ontem dizia: "A partir de agora não há espaço para retrocesso".

Vento. Aliado de primeira hora do ex-prefeito Fernando Pimentel (PT), o presidente do PT mineiro, Reginaldo Lopes, defendeu ontem o ministro peemedebista Hélio Costa (Comunicações) para vice de Dilma. Até a semana passada, ele dizia que "as candidaturas do PT e do PMDB no Estado estão em fase de diálogo".

Forcinha. Ao fazer gestos pró-Dilma, o PDT espera, em troca, atenção especial de Lula ao Paraná, onde o pré-candidato Osmar Dias flerta com partidos da oposição.

Tabuleiro. O senador Cristovam Buarque (PDT) e Agnelo Queiroz (PT) voltaram a negociar ontem uma aliança para disputar o governo do Distrito Federal. "Não quero uma aliança só com a cúpula do PT. Quero que a base do partido se envolva na campanha", disse o pedetista, que sonha com um aceno de Lula para se lançar candidato.

Banco. Tão logo o vice Paulo Octávio (DEM) anunciou que não disputará a eleição para o governo do DF, o DEM começou a articular a candidatura do deputado Alberto Fraga, secretário de Transportes de José Roberto Arruda.

Olho vivo. Aliados do governador Jaques Wagner (PT-BA) monitoram o novo blog do peemedebista Geddel Vieira Lima (Integração), seu adversário no Estado. E fazem circular no Palácio do Planalto cada vez que ele "esquece" de elogiar Lula.

Bloco na rua. A Secretaria de Comunicação da Presidência apresenta amanhã na reunião ministerial o "Portal do Brasil", site que reunirá informações sobre todas as áreas do governo.
com LETÍCIA SANDER e MALU DELGADO

Tiroteio

"Agora a Dilma vai ter que comer churrasco com pão de queijo."
Da deputada MARIA DO ROSÁRIO (PT-RS), sobre a declaração da ministra, segundo quem "sua alma é mineira" apesar de ter vivido no Sul.

Contraponto

Eu, Robô


O senador Delcídio Amaral (PT-MS) passava férias em Florianópolis, na virada do ano, quando um grupo de políticos catarinenses comentava a onda de denúncias no final do ano no Estado. Primeiro, foi a vez da árvore de Natal de R$ 3,7 milhões, suspeita de superfaturamento. Depois, denúncias de corrupção contra o vice-governador Leonel Pavan (PSDB).
-É a campeã dos vexames!-, cutucou Delcídio.
Um aliado que ouvia atentamente os relatos lembrou uma história ainda mais intrigante para riso geral:
-Pior foi o robô da feira de engenharia e tecnologia que tossiu em público..

JOSÉ SIMÃO

SPFW! Jesus ressuscitou de jeans!

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/10


E diz que ele vai ser modelo e DJ: ou seja, bicos; profissão mesmo é comer a Madonna


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta!
Grafite em Pouso Alegre: Marx morreu, Freud morreu, Cristo morreu, e eu não passo muito bem! Rarará! E vocês já viram uma pessoa com colesterol fazendo supermercado? Gosto, mas não posso, gosto, mas não posso, gosto, mas não posso e posso, mas não gosto. Rarará!
E, na Bahia, tem o Centro Cultural Rolinha Preguiçosa. Se fosse em São Paulo seria Rolinha Estressada! E a terra treme! Acho que o mundo tá com o motor vazando. Precisamos de um mundo zero bala. América Central treme, Argentina treme, Taiwan treme! A Madonna esqueceu o vibrador ligado!? Rarará! A Lady Gaga soltou um pum?! E a pergunta dum amigo: se der terremoto na Argentina, o mundo vai fazer vaquinha como pro Haiti? Rarará!
E socuerro! Eu vi Jesus. No Fashion Week, mas vi. O Faxion Bixa tá bombando! Jesus ressuscitou no Faxion Bixa. De jeans! A mídia diz que ele vai exercer suas duas profissões: modelo e DJ. Ou seja, bicos. Profissão mesmo é comer a Madonna! Rarará! E chega com um esquema de segurança igual ao da Madonna! Se o Jesus original tivesse tido essa segurança, o rumo da história teria sido outro. Taria vivo até agora!
E já tem até boneco do Jesus Luz. Com aquela camiseta "Jesus te ama"! Sim, Jesus me ama, mas eu prefiro a Madonna. Jesus me ama, mas eu prefiro a Mulher Melancia! Rarará! E top model ganha por passo! Cada passo uns dez mil dólares. Se eu ganhasse por passo, eu ia e voltava da padaria mil vezes por dia.
E eu vou abrir o Ministério das Perguntas Cretinas. Olha o discurso do Lula: "Quando os rios enchem, a água vai pro mar. E aí eu fico pensando: e se o mar encher, a água vai pra onde?". Rarará! O Lula não tá mais falando de improviso. Tá pensando de improviso!
E eu falei que a Portuguesa não tem torcida? Tem sim. Torcida organizada com o prosaico nome Grêmio Esportivo Recreativo Cultural Leões da Fabulosa! É mole? É mole, mas sobe! Ou como disse o outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece!
Antitucanês Reloaded, a Missão. Continuo com a minha heroica e mesopotâmica campanha Morte ao Tucanês. É que em Ubatuba tem uma placa Cruzamento Perigoso. E aí picharam embaixo: então usa camisinha. Ueba! Mais direto impossível. Viva o antitucanês. E atenção! Cartilha do Lula. O Orélio do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Encerrar": levar o Serra de volta pro caixão! Rarará! O lulês é mais fácil que o ingrêis. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno.

MERVAL PEREIRA

Forjando a união

O GLOBO - 20/01/10


O governador de Minas, Aécio Neves, deu mais um passo na construção de uma imagem de liderança nacional ao definir claramente sua participação na campanha presidencial como sendo, sem tergiversações, no campo da oposição. A partir da definição de que seu projeto pessoal está intimamente ligado ao projeto nacional do PSDB, e que a unidade da oposição é o pressuposto para a vitória na sucessão de Lula, o governador mineiro deu consequência ao discurso político que vem desenvolvendo desde que decidiu desistir da précandidatura à Presidência

Considerar Aécio Neves um ingênuo ou um político afoito e irresponsável é cometer um grave erro, e os petistas parece que caíram nessa esparrela. Passaram a difundir que o governador mineiro estaria magoado com seu partido e que faria corpo mole na campanha presidencial para não dar apoio à candidatura do governador paulista, José Serra.

Esse raciocínio político tosco não leva em conta que Aécio retirou-se da disputa para se tornar protagonista da decisão tucana. Fez um movimento estratégico que o colocou como um líder com visão de futuro, e não como aquele que provoca uma divisão partidária por interesses imediatistas.

O que o torna o fiel da balança para uma decisão tucana é que seu peso político em Minas e em outras regiões do país, como o Rio, pode não ser suficiente para colocá-lo na liderança das pesquisas, mas é grande o bastante para definir uma eleição nacional.

E esse apetite pela política nacional ele tem demonstrado nas conversas dos últimos dias, com informações atualizadas sobre a situação de diversos estados.

Mas a cada dia que passa Aécio demonstra que sabe que não pode ter dimensão nacional se não cuidar de sua seara política local, e por isso não basta a ele se eleger senador, ou mesmo eleger Antonio Anastasia o governador de Minas.

Por um desses golpes do destino, a candidata adversária Dilma Rousseff é mineira de nascença, embora tenha feito sua vida profissional e política fora do estado.

Minas tornou-se então um ponto fundamental da disputa eleitoral. Juntandose a isso o fato de que o PT mineiro tem uma estrutura forte no estado, e dois candidatos importantes, o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, “o pai” da Bolsa Família, e o exprefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, temos aí um desafio e tanto para a liderança de Aécio Neves.

Mesmo tendo a eleição para o Senado garantida, de nada servirá a Aécio ser um senador de uma bancada minoritária e fraca, com o PT governando o país e seu estado ao mesmo tempo.

Mesmo elegendo o governador, se a candidata oficial vencer a eleição, com votação forte em Minas, o senador Aécio ficará enfraquecido em Brasília, e o Senado deverá continuar sendo presidido pelo PMDB.

Ao evitar receber o presidente Lula em Minas para a inauguração da barragem em Jenipapo de Minas, no Vale do Jequitinhonha, a região mais pobre do estado, o governador mineiro deixou claro que não alimentará a campanha de Dilma com posições ambíguas.

Como vem acontecendo com frequência alarmante nesses últimos meses, a inauguração transformou-se em campanha eleitoral aberta, com a candidata travestida de ministra fazendo terrorismo eleitoral contra a oposição. As críticas à inoperância do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) transformaram-se, no palanque governista, em ameaça de acabar com o programa em si, como se a barragem que acabava de ser inaugurada pudesse não existir se a oposição estivesse no governo.

Uma amostra de que a disputa será mais que vigorosa, e que o governador mineiro, assim como o paulista, terão que competir com obras com o governo federal antes de se desincompatibilizarem no final de março.

O presidente Lula já anunciou que pretende inaugurar, com Dilma a seu lado, “o máximo de obras possível” até o último prazo legal.

A postura mais engajada do governador mineiro no projeto nacional do PSDB dispensaria até mesmo a alternativa de ele vir a ser o vice numa chapa tucana purosangue. Mas, na entrevista que deu esta semana, o governador Aécio Neves abriu uma brecha na até então irremovível barreira que colocava a essa possibilidade, embora continue negando-a.

Mais importante do que ter dito que “irreversível é só a morte”, foi o governador colocar a questão em termos de ajudar a vitória de Serra à Presidência, no mesmo plano da eleição de governador do estado: “Não acho que eu possa ajudar mais a candidatura do PSDB do que estando em Minas Gerais, eventualmente como candidato ao Senado, ajudando a dar a vitória ao nosso candidato ao governo em Minas Gerais e ao nosso candidato à Presidência da República”.

Nesses termos, se a continuidade da campanha eleitoral demonstrar que a presença de Aécio Neves na chapa do PSDB é mais interessante para o projeto nacional do partido do que sua candidatura ao Senado, ele terá condições de rever sua posição.

Mais uma vez, como na renúncia à pré-candidatura, ele será o senhor da decisão, em uma estratégia de convergência de interesses, e não de divisão.

Ao contrário do que escrevi aqui ontem, o ex-presidente do Chile Eduardo Frei Montalva, pai do candidato derrotado da Concertação Eduardo Frei — também ex-presidente chileno — morreu em um hospital e não na prisão.

Tendo se transformado em opositor do golpe militar que colocou o general Pinochet no poder, Eduardo Frei Montalva foi envenenado, e a prisão dos acusados pelo crime foi decretada na reta final da eleição, dez anos depois de iniciado o processo.

ANDRÉ MELONI NASSAR

Um funeral para o agronegócio

O ESTADO DE SÃO PAULO - 20/01/10


Lendo o decreto do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) e os esclarecimentos sobre como o processo de consulta à sociedade foi feito, sou induzido a chegar à seguinte conclusão: o agronegócio não interessa à sociedade e ao governo brasileiros, pelo menos sob a perspectiva de garantia de direitos humanos. Diria, portanto, que conceitualmente o PNDH-3 enterra o agronegócio e atesta seu óbito no Decreto 7.037, datado de 21 de dezembro de 2009.

Os argumentos para o funeral do agronegócio, extraídos do atestado de óbito: o agronegócio contribui para, potencialmente, violar o direito de pequenos e médios agricultores e populações tradicionais; seus componentes, as monoculturas da cana-de-açúcar, do eucalipto, da soja e a grande pecuária (não sabia que havia a pequena pecuária), fazem mal ao meio ambiente e à cultura dos povos e comunidades tradicionais. Ainda estou meio fora de prumo com o julgamento do agronegócio que é apresentado no PNDH-3.

Por mais que tente colocar-me no lugar das pessoas que participaram da elaboração do PNDH, tenho dificuldades em enxergar esse "agronegócio do mal" refletido no programa. Posso entender que exista uma corrente neste governo que acredite em outro modelo de produção agropecuária e florestal. Vá lá. Mas daí a afirmar que o agronegócio vai contra os interesses do Brasil em direitos humanos me parece algo fora de propósito e baseado numa hipótese heroica - ou seja, impossível de ser provada -, a de que a produção agropecuária não baseada no agronegócio (seja lá o que isso for) respeita os direitos humanos e o meio ambiente. Difícil de acreditar.

As manifestações passionais sobre o agronegócio que aparecem no PNDH não são fato isolado. A contestação do modelo que o Brasil seguiu na produção de alimentos, fibras, biocombustíveis e matérias-primas industriais de base agrícola e florestal tem se repetido em outros fóruns e ocasiões. O PNDH, a meu ver, foi o canal encontrado para tentar (espero que sem êxito) criar instituições que viabilizem a implantação de um novo modelo. Se, de fato, a sociedade brasileira fosse capaz de se imaginar com um modelo de produção agropecuária e florestal do tipo do da Índia, que é o que os contra-agronegócio, no fundo, defendem, ela barraria qualquer tentativa de enterrar o agronegócio como o conhecemos hoje.

O interessante é que o agronegócio nem sempre foi visto como vilão. É uma espécie de moda: daqui a algumas estações, muda a tendência de novo. Se o funeral do agronegócio foi em 2009, seu surgimento ocorreu em 1990, tudo registrado no livro Complexo Agroindustrial: o Agribusiness Brasileiro. Foi uma morte precoce, não? À época, os autores do livro nem poderiam imaginar que definir as cadeias produtivas de base agrícola e florestal como agronegócio produziria seu próprio calvário 20 anos depois. Deve haver alguma explicação no inconsciente coletivo dos "esclarecidos brasileiros". Colocada a designação agronegócio, já se ganha a pecha de algo ruim, que a sociedade brasileira não merece.

A despeito da nossa memória curta, o agronegócio brasileiro já teve seus dias de glória. Há dez anos era ovacionado mundo afora. Ninguém conseguia entender como um agronegócio tão jovem pôde ter crescido tão rápido. Foi nessa época que um sem-número de estrangeiros passou a conhecer o Brasil mais de perto. Mas não era apenas fora do Brasil que havia essa admiração. Aqui dentro, também. Dizia-se que o agronegócio era responsável por gerar divisas para o balanço de pagamentos brasileiro. Reconhecia-se que o setor havia trazido desenvolvimento para o interior do País, financiando as atividades econômicas que permitiram o nascimento de diversas cidades. E se via o agronegócio como uma solução para parte dos problemas dos agricultores familiares, porque, por meio das cadeias agroindustriais organizadas, estes tinham acesso ao mercado.

Ao longo dos anos 2000 as coisas foram mudando. Ganharam força no governo as linhas de pensamento que acham que um modelo de produção agropecuária baseado em milhões de pequenos produtores seria ambiental e socialmente melhor. Eu não acredito nisso. Os resultados do Censo Agropecuário de 2006 ilustram bem a situação. Até para poder reafirmar as classificações de tipos de produtores definidas no passado, o censo de 2006 trouxe dados de agricultores familiares e assentados em separado. Na grande maioria dos produtos, o censo indica que a produtividade (quantidade de produto por unidade de área) dos agricultores assentados é menor que a da média dos agricultores familiares e comerciais. Isso indica que uma agricultura estruturada em pequenos agricultores pode até ser boa para segurar o homem no campo, mas não será boa para o consumidor urbano.

Os casos da China e da Índia, que têm um modelo de agricultura parecido com o ideal do grupo antiagronegócio, são ilustrativos. A pobreza no campo é muito maior que no Brasil, os problemas ambientais são muito mais profundos, porque os produtores utilizam tecnologias rudimentares de produção. O consumidor urbano tem problemas de segurança alimentar porque o setor agrícola produz menos do que o país consome. O governo é obrigado a gastar enormes quantidades de dinheiro subsidiando o produtor e o consumidor, perpetuando uma agricultura de baixa produtividade, e não consegue fazer políticas de renda no campo porque o contingente de pessoas vivendo na pobreza no meio rural é muito grande.

Cobrar as responsabilidades sociais e ambientais do agronegócio faz sentido. Carrear grande parte dos subsídios agrícolas para fortalecer os agricultores familiares, também. Criar instituições baseadas na hipótese de que o modelo de agronegócio é ruim para a sociedade brasileira é um erro. Já devíamos saber disso aqui, no Brasil.

André Meloni Nassar é diretor-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações
Internacionais (Icone) E-mail: amnassar@iconebrasil.org.br)