terça-feira, novembro 30, 2010

CELSO MING

Cláusula de calote 
Celso Ming 

O Estado de S.Paulo - 30/11/2010

Por mais paradoxal que pareça, esquerda e direita ou, rotulando de outra forma, populistas ou durões, dos Estados Unidos e da Europa, convergem na proposta de tratamento a ser dado aos credores.

As esquerdas e os populistas avisam que o povo sofrido não pode ser chamado a pagar com perda de salários, desemprego e mais impostos pelas lambanças dos bancos. E os durões e conservadores, tanto nos Estados Unidos como na Alemanha, entendem que os bancos têm de ser chamados a pagar uma boa parte da conta do ajuste.

Nesse fim de semana foi aprovado o socorro de ? 85 bilhões à Irlanda. A contrapartida foi a distribuição do pão que o diabo amassou à população do país: redução de salários, adiamento da aposentadoria e aumento de impostos.

O Prêmio Nobel de Economia de 2008, Paul Krugman, vem escrevendo que o povo da Irlanda não pode ser convocado a pagar pelos desmandos do setor financeiro. A chanceler da Alemanha, a durona Angela Merkel, sugeriu que a dívida dos países quebrados devesse ser submetida a uma reestruturação (renegociação) pela qual os bancos assumiriam um pedaço da conta. O presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, foi contra. Avisou que essa proposta acentuaria a rejeição dos títulos da dívida dos países a perigo e puxaria para cima os juros, aumentando o tamanho do rombo futuro.

Ficou definido que, apenas a partir de 2013, a utilização do Mecanismo de Estabilidade Financeira, o sistema que vai herdar regras e recursos do Fundo de Estabilidade criado em maio para resgatar países em dificuldades da área do euro, só pode ocorrer depois que a dívida já tiver sido reestruturada com os bancos, sob monitoramento do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas o presidente da França, Nicolas Sarkozy, conseguiu barrar outra exigência da chanceler Merkel, a de que a reestruturação fosse automática.

O problema de base não foi eliminado. A partir do momento em que os títulos de dívida incluírem cláusulas de calote será inevitável uma mais forte diferenciação entre os juros a serem pagos pelos membros da área do euro. E essa diferença, por sua vez, será a nova razão para ampliação das disparidades entre índices de competitividade dos países do centro (especialmente Alemanha, Holanda e França) e os da periferia (hoje, Grécia, Portugal e Espanha). A derrubada das bolsas europeias ocorrida ontem é reflexo disso.

A longo prazo, ou a área do euro tratará de montar um sistema de governança que unifique a política fiscal e tudo o que a ela está ligado (impostos, despesas públicas, administração da dívida, etc.) ou, então, o próprio euro será refém de forças desintegradoras.

Afora isso, por mais abutres que pareçam os credores diante do sofrimento do povo, não faz sentido culpá-los pelas agruras pelas quais vêm passando tantos países europeus. Quem se atirou ao endividamento até além do admissível foram os governos, seja para gastar mais (caso da Grécia e Portugal), seja para socorrer os bancos (caso da Irlanda). Foram eles que fabricaram a arapuca em que estão metidos. Não podem agora responsabilizar os credores pelos males dos quais os governantes são responsáveis.

Isso não é nem jogo da direita nem da esquerda. É consequência das decisões tomadas ou das omissões cometidas.

O gráfico mostra como cresce o crédito dos bancos em relação ao PIB.

Armínio no FMI?
O New York Times de sábado avisa que o próximo gerente-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI) poderá vir de um país emergente. Aponta como candidato forte o atual presidente da Bolsa, Armínio Fraga.

Questão de qualidade
Em entrevista ao diário Buenos Aires Económico, o ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira disse que a economia da Argentina é mais sólida do que a brasileira.

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