segunda-feira, outubro 18, 2010

HÉLIO ZYLBERSTAJ

Nobel de Economia e lições para o Brasil

Hélio Zylberstaj
O Estado de S. Paulo - 18/10/2010
O Prêmio Nobel de Economia 2010 concedido a Peter Diamond, Dale Mortensen e Christopher Pissarides é um reconhecimento merecido pela sua contribuição para o entendimento da persistência do desemprego nas economias desenvolvidas. Pretendo, a seguir, fazer uma breve síntese dessa mensagem para, em seguida, extrair uma conclusão aplicável ao caso brasileiro.
Para começar, os trabalhos de Diamond, Mortensen e Pissarides reforçaram o reconhecimento da relevância do ambiente macroeconômico para explicar a taxa de desemprego, mas levaram também à percepção de que mudanças na macroeconomia podem ter diferentes impactos no desemprego, dependendo dos detalhes microeconômicos do mercado de trabalho.
O desemprego não decorre simplesmente da falta de vagas. Os trabalhos dos laureados reconhecem que, mesmo quando existem vagas de emprego, pode haver gente sem trabalho. Acontece que o mercado está sempre em movimento. Simultaneamente, empregos são destruídos e criados. Trabalhadores são demitidos, outros pedem demissão. Alguns saem do mercado, outros entram. Todos esses fluxos contribuem para a taxa de desemprego, cada um à sua maneira.
Tomemos, por exemplo, o fluxo de trabalhadores que pedem demissão. Esse fluxo não aumenta a taxa de desemprego porque, em geral, quando alguém se demite, já tem outro emprego acertado. Muitas vezes começa a trabalhar já no dia seguinte. Por outro lado, quando as empresas demitem, criam um fluxo que engrossa o grupo dos desempregados, porque os demitidos precisarão de algum tempo para encontrar o novo emprego.
A forma como se dá a procura de emprego pode afetar a taxa de desemprego também. Desempregados que se esforçam e procuram intensamente novas oportunidades as acabam encontrando mais rapidamente. Já os que procuram com menos esforço ficam mais tempo desempregados. Da mesma forma, as empresas podem anunciar suas vagas para um público maior e encontrar candidatos rapidamente, ou podem ser menos eficientes na procura por candidatos e demorar a preencher suas vagas.
O tempo da procura de emprego depende do que os desempregados esperam ganhar no novo posto de trabalho. Cada um tem um salário desejado na cabeça e interrompe a procura quando encontra uma empresa que oferece aquele salário. O salário desejado é uma variável crítica para a taxa de desemprego. Quanto maior, mais tempo leva a procura, mais desempregados permanecem nessa condição e maior a taxa de desemprego.
Pesquisadores comprovaram empiricamente que a generosidade do seguro-desemprego pode aumentar o tempo de procura de emprego. O valor e a duração do seguro-desemprego aumentam o salário desejado pelos desempregados e provocam dois efeitos. Um, ruim, seria o aumento da taxa de desemprego. Outro, bom, seria a qualidade do "casamento" do desempregado com a nova vaga. Como o seguro-desemprego permite uma procura mais calma e cuidadosa, o encontro candidato-vaga é de melhor qualidade e o desligamento será menos provável. Um custo maior para um benefício também maior.
A partir do trabalho dos laureados com o Nobel se reconheceu a importância dos contatos pessoais na procura de emprego. Pessoas bem relacionadas socialmente encontram empregos mais rapidamente. Não é à toa que muitas empresas anunciam as novas vagas para seus próprios empregados, pois o boca a boca é uma arma importante e barata para encontrar as pessoas certas.
Essa teoria toda serviria para o Brasil? Afinal, nos anos recentes, a taxa de desemprego caiu muito e as perspectivas para o mercado de trabalho são favoráveis. Será que precisamos nos preocupar com esses detalhes microeconômicos, quando os aspectos macroeconômicos são tão exuberantes? Na verdade, sim. Temos de nos preocupar porque o crescimento por si só não está conseguindo trazer todos para o emprego.
Há pelo menos dois grupos de brasileiros que ainda sofrem muito com o desemprego: os jovens e os pobres. De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego, a taxa de desemprego entre 15 e 24 anos é de 16% (três vezes maior do que entre 25 e 39 anos). De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a taxa de desemprego entre os 20% mais pobres é de 42% (sete vezes maior do que entre os 20% mais ricos!). Os trabalhadores pobres e os jovens continuam vulneráveis ao desemprego, apesar do bom desempenho macroeconômico recente.
À luz dos ensinamentos de Diamond, Mortensen e Pissarides, pode-se concluir que apenas mais crescimento econômico não garantiria emprego para os pobres e os jovens, porque algo diferente acontece com a sua inserção no mercado de trabalho. Seus empregos têm curta duração, sofrem muita rotatividade. Ficam mais tempo procurando emprego do que empregados. Pode até haver empregos para eles, mas são de curta duração. E, como os jovens e os pobres nessa condição são muitos, a taxa de desemprego permanecerá alta, enquanto não encontrarmos uma solução.
Nos últimos anos, o governo tem procurado adequar o perfil desses trabalhadores às vagas existentes por meio de programas de treinamento. O insucesso dessa política sugere que talvez devêssemos inverter o jogo e simplesmente criar empregos adequados para o seu perfil.

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