quarta-feira, agosto 25, 2010

RUY CASTRO

O 'globish' entre nós

RUY CASTRO


FOLHA DE SÃO PAULO - 25/08/10


Há uma nova língua no ar: o 'globish', a língua global – ou, se o vernáculo não falha, 'globês'. (Nada a ver com a TV Globo, mas com um globo bem maior: o próprio.) O conceito foi inventado pelo executivo francês Jean-Paul Nerrière, ex-funcionário da IBM, e é uma fusão entre 'globe' e 'english'. Mas não quer dizer que o inglês se impôs de vez e que o mundo inteiro aprendeu a falá-lo. Na verdade, é o contrário. 
O 'globish' é um inglês básico, reduzido a um vocabulário estritamente utilitário e a uma gramática elementar, permitindo que nativos de qualquer parte do mundo se comuniquem por essa língua comum. Seus usuários são empresários, agentes do mercado de capitais e executivos vários, além de artistas de cinema, cantores, modelos, esportistas e quem quer que circule internacionalmente, mesmo que dentro de um círculo limitado. 
Isso significa que o 'globish' pode ter variantes: um dialeto para as Bolsas de Valores, outro para as passarelas, outro para o futebol etc. O que não o impede de ser entendido pelas facções, mais até do que pelos nativos da língua inglesa. Seria como, na antiga Roma, o latim vulgar, da plebe, em oposição ao falado pelos cidadãos. 
Quanto a mim, acho que o Brasil está não apenas praticando o 'globish' faz tempo como já o vem adaptando para o português. É o que explica um slogan recente do McDonald's, 'Amo muito tudo isso'. Ou o de uma empresa que oferece 'personal services para customizar suas facilities'. Ou o título daquele seriado da Globo, 'Nossa Nada Mole Vida'. Ou chamar teste de 'audição', plateia de 'audiência' e aleatório de 'randômico'. 
Isso é português ou um código para iniciados? Dá a impressão de que estamos sendo dublados por nós mesmos. A culpa pode ser do 'globish', insinuando-se insidiosamente na nossa acolhedora e nada esperta língua – epa!

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