quinta-feira, agosto 05, 2010

DORA KRAMER

Nem gregos nem troianos 
Dora Kramer 

O Estado de S.Paulo - 05/08/2010

Definitivamente, o governo do presidente Luiz Inácio da Silva caminha para um final melancólico em matéria de política externa.


Foi chamado de ingênuo pelo governo dos Estados Unidos por cair na conversa de Mahmoud Ahmadinejad; admoestado pela oposição cubana por causa de suas ironias e indiferença em relação aos dissidentes da ditadura castrista; condenado pelo presidente da Colômbia que considerou "deplorável" sua posição sobre o conflito com a Venezuela; menosprezado pelo amigo iraniano para quem os apelos de Lula em favor da mulher condenada à morte por adultério são frutos de falta de informação.

Isso em pouquíssimo tempo, convenhamos, representa uma conjunção de repreensões públicas bastante significativas e contrastantes com a quase unanimidade de 80% de aprovação no âmbito interno.

Dirão os que se indignam com o fato haver no Brasil quem se manifeste em oposição a tão adorado presidente, que o mundo conspira, exercita o preconceito das elites, ou quem sabe, é tucano?

Não, o mundo apenas está tomando contato com o Lula real, em contraposição ao herói da resistência que nunca existiu a não ser na fantasia romântica alimentada por falta de informação e açodamento na expiação de culpas ancestrais.

Como o senso crítico mundo afora e os critérios para avaliação de governantes são mais rígidos que os vigentes no Brasil, Lula foi perdendo o charme na proporção que iam crescendo suas impropriedades em âmbito internacional.

Entrou errado numa seara delicada, a dos direitos humanos. Sem capacidade pessoal para avaliar conexões mais elaboradas e sem disciplina nem paciência de ouvir quem poderia lhe ensinar, achando que da mesma maneira que as coisas dão certo aqui podem dar certo de toda parte, o presidente pôs os pés pelas mãos.

Agora propõe à ONU que evite censurar países violadores dos direitos humanos, argumentando que a denúncia pública e dura de atrocidades não é eficaz.

Como se a política de boa vizinhança do Brasil com ditaduras tivesse rendido algum avanço ou benefício para as populações desses países.

Como se alguma ditadura entendesse a linguagem do diálogo e da negociação. Opressor que se preze - e os amigos do governo Lula são convictos no ramo - não dialoga, oprime.

Só afrouxa o torniquete quando é da conveniência do próprio regime opressor fazer alguma concessão.

Essa proposta encaminhada pelo Itamaraty à ONU pretende que o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas mude seus critérios de funcionamento e passe a adotar os parâmetros do governo Lula.

Se a ONU aceitasse, de uma hora para outra o governo brasileiro teria "lavado" seus procedimento que não seria mais condenado nem condenável. Passaria a ser o modelo de correção.

Se essa hipótese já soaria fora de cogitação em outros tempos, hoje que Lula perde o glamour e a credibilidade no exterior, soa absurda.

Revisão. José Serra não sossegou - fez de tudo e mais um pouco enquanto não conseguiu que Fernando Gabeira fosse candidato ao governo do Rio em aliança com a candidatura presidencial do PSDB.

Hoje o partido - com a concordância do próprio - avalia que foi um erro. A começar pela candidatura de Marina Silva a presidente até as rusgas internas provocadas pela resistência do PV à companhia do DEM, a coligação rendeu m ais problemas que soluções.

Na interpretação dos tucanos paulistas, quem escolheu um candidato a vice no Rio em outro partido saberia escolher um candidato ao governo no PSDB.

Fundamento. O que é mais importante, o nome das coisas ou o que as coisas realmente são? Partindo do princípio de que a designação não altera o significado de nada, o sentido é o que importa.

Por tanto, não interessa se o nome é dossiê, banco de dados ou carta anônima. A boçalidade da intenção é a mesma: pressionar alguém a curvar-se à vontade de outrem mediante ameaça de exposição da intimidade seja ela lícita ou ilícita, falsa ou verdadeira, tanto faz.

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