sábado, maio 01, 2010

RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA
RUTH DE AQUINO
Dilma precisa decidir quem ela é de verdade

Revista Época
RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br
Eleitores são seres humanos. e, como tais, sujeitos à sedução e ao carisma dos candidatos. A maioria dos eleitores não é politizada, ao contrário do que se desejaria num pleito consciente. Muitos votam por simpatia ou pelo bolso, e não por ideologia ou plataforma. Como tudo é relativo, na comparação direta entre os sisudos Dilma e Serra, o tucano começou a parecer doce, risonho e autêntico. Sua imagem mudou. Serra é o favorito entre as mulheres, segundo as pesquisas.
A não ser que Lula desenvolva talento de ventríloquo, coloque Dilma no colo e sopre as palavras tocantes do dia a dia, nenhum bruxo marqueteiro poderá fazer com que ela galvanize as massas ou provoque risadas. Parece irônico – e é. Quem tem sido comparado com Lula não é Serra, mas a ministra de ferro. Como criador e criatura não desgrudam, o brasileiro olha para um, olha para a outra, e não acredita que Lula hoje será Dilma amanhã. O eleitor se pergunta: quero ser governado por ela nos próximos quatro anos, depois que Lula sumir para descansar e se divertir?
Sem voto no currículo, sem traquejo de palanque, chamando geladeira de “linha branca” e falando em “tecniquês”, Dilma até agora não tem competido com Serra, mas com o fantasma de seu cabo eleitoral: o presidente onipresente, que não larga de seu pé. E que a repreende por ser pouco objetiva e por “falar difícil”. Lula apregoa que a ministra do pré-sal, transformada em candidata por imposição sua, representa a continuidade de seu governo. Dilma projeta a imagem de uma gerenta que pisa forte, mas carece de flexibilidade, sensibilidade e espírito de equipe. Qualidades associadas ao estilo feminino de liderança, justa ou injustamente.
“Não adianta mudar a Dilma. Tem de deixar a Dilma continuar a ser como ela é”, disse em palestra na Casa do Saber, no Rio, o publicitário Duda Mendonça, o mesmo que recebeu R$ 10,5 milhões do PT numa conta no exterior e foi aclamado no partido como o guru do Lulinha paz e amor de 2002. “Pegá-la e fazer outra pessoa... Vai ficar numa vestimenta desconfortável... Vai fazer com que ela volta e meia dê uma escorregada.” Duda acha que a chance de Dilma, filha instruída de um rico empreiteiro húngaro, é se desvencilhar da armadura populista do PT.
A foto de Norma Bengell deu confusão? Mas por que o PT não usou uma foto de Dilma guerrilheira no blog?
O blog oficial da candidata fez uma lambança ao postar três fotos no painel “Minha Vida”. A primeira foto era da Dilminha bebê, com franja. A última era recente, com cabelos curtos e avermelhados. A foto do meio mostrava passeata nos anos 60 “contra a censura e pela cultura”. E uma mulher em primeiro plano com cabelos curtos. Todos pensaram ser Dilma. Mas era a atriz Norma Bengell, na Passeata dos 100 Mil, no Rio, em 1968. Na época, Dilma militava em dois grupos de luta armada, Colina (Comando de Libertação Nacional) e VAR-Palmares. O efeito de ilusão pegou mal. Mas o blog culpou quem se enganou. Disse que a interpretação foi equivocada e que confundir a candidata com a atriz seria “estapafúrdio”. Mas quem associou não foi o PT, ao compor o painel virtual? Por que não há fotos de Dilma guerrilheira no blog? Afinal, o PT se orgulha ou se envergonha do passado de sua candidata?
Dilma precisa fazer as pazes com a linguagem da internet. Mestrado é mestrado, passeata é passeata, na vida real e na virtual. Não se trata de Second life, aquele mundo de fantasia onde inventamos para nós mesmos um personagem. Blogs de políticos podem ser armas poderosas, se forem honestos e claros. Caso contrário, as redes sociais funcionarão como bumerangues contra os candidatos. Isso vale tanto para Dilma quanto para Serra. “O Serra é um baita governador. Mas acho que Dilma ganha a eleição. (...) Se não fosse o Lula, seria a vez do Serra. (...) Mas Lula é igual a Padre Cícero ou está ali perto”, disse Duda Mendonça.
Dilma terá na televisão 48% mais tempo que Serra, se forem confirmadas as tendências de alianças. Talvez fosse melhor para ela ter menos tempo. Antes que a campanha comece para valer, Dilma precisa decidir quem ela é, na verdade. Ninguém engana todos todo o tempo.

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