segunda-feira, abril 12, 2010

NAS ENTRELINHAS

Reflexos imediatos

 Denise Rothenburg
Correio Braziliense - 12/04/2010
 
Se Lula quiser, como disse, ´´matar a coisa no primeiro turno´´, tem que começar tirando Ciro Gomes do páreo. E ele se debate tanto que pode terminar arranhando quem tentar tirá-lo da piscina eleitoral
 
Surgiu no sábado um ponto de convergência entre PT e PSDB: a vontade de escolher o sucessor de Lula no primeiro turno da eleição, em 3 de outubro. O presidente deixou isso claro no evento que soou mais como um ´´olha eu aqui´´ — o tal encontro com sindicalistas no ABC paulista. Foi tudo montado às pressas para não deixar Dilma fora do noticiário no dia em que o PSDB apresentou José Serra como seu candidato a presidente da República, mas Lula conseguiu o que queria: produzir um fato. Conclamou a todos a ´´matar a coisa logo no primeiro turno´´. Os tucanos pensam a mesma coisa. Em conversas reservadas durante o pré-lançamento da candidatura de Serra, a análise era a de que seja em favor deles ou do PT, a eleição se dará no primeiro turno.

Em conversas ontem com os políticos foi possível tirar várias premissas com as quais tucanos e petistas trabalham separadamente, mas com o mesmo objetivo. Uma delas é a de que Ciro Gomes não será candidato. Da parte do PT, a ordem é fazer de tudo para tirar a candidatura de Ciro do ar. A primeira delas é a ida de Dilma Rousseff hoje a Fortaleza, onde receberá o título de cidadã da capital administrada pela petista Luizianne Lins e dará entrevista para rádios. A segunda premissa é a de que Marina Silva não terá 10% dos votos e restringirá o grosso de sua votação ao Acre, insuficiente para levar a disputa a um segundo turno.

Dentro dessa perspectiva, como a transferência de votos de Lula ainda é uma incógnita na cabeça de petistas e tucanos, ambos consideram que vencerá a eleição o candidato que errar menos nesse período. Dilma começou sua pré-campanha por Minas Gerais com o pé esquerdo. Chegou defendendo um parceria com o PSDB de Aécio Neves e Antônio Anastasia. O resultado foi desastroso: quase perde o PMDB e ainda empurrou Aécio mais para perto de seu partido, com um forte discurso em favor de Serra. O ex-governador foi tão incisivo que alguns pensaram que ele abriu a porta para ser o candidato a vice na chapa presidencial de seu partido.

A viagem ao Ceará prevista para hoje também está no rol dos possíveis desastres antes mesmo de ocorrer. A agenda foi alterada cinco vezes. A cidade de Juazeiro do Norte, onde o prefeito Manoel Santana (PT) passa por denúncias de superfaturamento já divulgadas na imprensa local, foi cortada da programação para evitar colocar a imagem de Dilma relacionada a uma prefeitura petista com problemas desse tipo. Para completar, ainda seria considerado uma provocação a Ciro Gomes, que sempre fala de Padre Cícero.

O Ceará é onde Ciro concentra maior votação e transfere hoje grande parte para José Serra, caso fique fora do páreo. É por isso que o estado entrou na agenda de Dilma nessa primeira fase. O PT quer, desde já, tentar agarrar mais uns votos de Ciro e, assim, tornar mais fácil a pressão sobre o aliado PSB contra a candidatura própria à Presidência da República. Ciro reagiu. Na última Sexta-feira, disse a uma TV local, na Bienal do Livro de Fortaleza, que ´´o comportamento de certos setores do PT chega à beira do criminoso´´.

Ontem, o site Ceará Agora trouxe uma resposta dos petistas. O líder de Luizianne na Assembléia, vereador Acrísio Sena, disse que os ataques de Ciro “passaram dos limites da responsabilidade política. Essa forma de agir, cheira à inconsequência no trato das divergências e na delicadeza das relações. Só confirma: a cada dia o deputado se enforca com a própria língua".

É nesse clima tenso entre o PT e Ciro que Dilma chega ao Ceará. Um passo em falso e pode deixar Ciro tão ou mais irritado do que ficou o ex-ministro das Comunicações Hélio Costa, há uma semana. E hoje, o governador do Rio Sérgio Cabral só não entrou nesse grupo porque a viagem ao Rio foi trocada por São Paulo de última hora a pedido do PMDB que não queria ver Dilma no lançamento da pré-candidatura de Garotinho.

Essas confusões indicam que, à primeira vista, Dilma está mais exposta a erros políticos do que o tucano José Serra — até porque ela tem mais palanques do que ele, portanto, mais problemas para administrar. No caso de Ciro Gomes, a tensão está tão grande que o PT começa a sair arranhado nessa operação para tirar o socialista da piscina eleitoral. Para completar esse imbróglio político, vem por aí o confronto de currículos: Dilma nunca participou de uma eleição, nem proporcional, nem majoritária. Também nunca exerceu o comando de estado, nem de prefeitura. É por aí que Serra vai entrar na avenida nos próximos dias, quando for a Minas Gerais levantar louros à gestão do governo Aécio Neves. Até o momento, nesse jogo dos erros, os tucanos levam uma ligeira vantagem. Se vai continuar assim, o tempo dirá. Pelo visto, essa campanha será, como diria Roberto Carlos, repleta de emoções…

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