terça-feira, março 30, 2010

MÍRIAM LEITÃO

Peça de marketing 

O Globo - 30/03/2010

O presidente Lula governa o Brasil há 87 meses.

Faltam nove para acabar seus dois mandatos. Por que ele lança, assim no finalzinho, um programa para os próximos quatro anos e além? Para fazer campanha política, óbvio. O presidente alega que é para que o próximo governante não perca um ano sem saber o que fazer, mas para isso existe o Plano Plurianual, que vai até 2011.

Do PAC-1, anunciado em 2007, não se concluiu uma única obra de logística. Foram inaugurados alguns trechos de rodovias, mas de ferrovia não adianta inaugurar trechos.

— A Ferrovia Norte-Sul andou, mas não ficará concluída.

A Ferrovia OesteLeste é só uma ideia na cabeça, que liga um porto sem estudo de mercado, sem projeto, sem licença, em Ilhéus, à Norte-Sul. A Transnordestina está parada pelas enormes complicações das desapropriações de minifundios no nordeste.

Os portos não foram dragados. O trem-bala precisará de mais dois anos para concluir o projeto. Começou custando US$ 11 bilhôes, hoje custa US$ 20 bilhões, e o governo diz que fará mais três trens-balas — diz o professor de logística Paulo Fernando Fleury.

O truque dos números gigantes é somar o que pode vir a ser orçado com o que pode vir a ser investido pelo setor privado e com os futuros orçamentos das estatais.

Assim foi construído o número de R$ 503 bilhões anunciado em 2007. Depois, virou R$ 638 bilhões.

— Destes, o governo considerou ações concluídas de R$ 256 bilhões, mas do Orçamento foram R$ 35 bilhões — disse o economista Gil Castelo Branco, do site Contas Abertas.

Mas como 35 viram 256? — Do total, mais da metade são empréstimos habitacionais de pessoa física com dinheiro do FGTS. Até reforma na sua casa se for com dinheiro da Caixa entra como ação do PAC — diz Gil No balanço do PAC-1, o governo disse que R$ 88,8 bilhões foram investimentos do setor privado. O site Contas Abertas já perguntou insistentemente ao Planalto que empresas são estas.

Ainda não obteve resposta.

O governo alega que completou 40% do que se propôs a fazer nestes quatro anos, mas só concluiu 11%, segundo o site.

Para os próximos quatro anos, o governo Lula anuncia investimentos de cerca de R$ 1 trilhão. O número é outro ilusionismo, e o anúncio, feito agora, é truque eleitoral. De novo, reempacotase dinheiro que já está aí, como o do FGTS, com investimento que pode estar no orçamento dependendo do próximo governo e possíveis investimentos privados e de estatais a serem feitos no futuro.

É uma forma de dizer, em linguagem de palanque: se o governismo vencer, é isso que o país terá. É também uma armadilha para o próximo governante, se não for eleita a candidata oficial. O próximo será cobrado em cada cidade, cada estado, cada região por não ter feito aquilo que Lula faria. E todas as ideias que são levadas ao governo são incluídas nessa verdadeira sacola de papainoel.

A mensagem é clara: tudo isso só acontecerá se o governo continuar. Como disse o presidente da CUT, “não podemos retroceder”.

Ou como disse a ministra Dilma Rousseff: — O neoliberalismo que nos antecedeu não tinha planejamento.

Antes, nós tínhamos o Estado que dizia “não”.

Era o Estado omisso.

Lula admitiu que não lançou o PAC-1 em 2006 “para não confundir com as eleições”.

A ministra fala do que acontecerá em 2011 como se não houvesse uma eleição no meio.

— Tenho a felicidade de anunciar que haverá a democratização da água — prometeu.

Os números mostram que, apesar dos sete anos e três meses do governo Lula e um PAC, os problemas de água e esgoto continuam enormes.

Segundo o presidente da Abcon (Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto), Yves Besse: 14,5 milhões de pessoas não têm acesso à água potável; 40 milhões sofrem com abastecimento descontínuo de água; 70 milhões não são atendidos por coleta de esgoto; 100 milhões não têm esgoto tratado.

Besse diz que o PAC-1 prometeu R$ 40 bilhões para quatro anos, pouco mais de 15% do necessário, mas não trouxe recursos novos, apenas reorganizou orçamentos como o do FAT (Fundo de Amparo do Trabalhador), sob controle da BNDES, e o do FGTS, sob comando da Caixa Econômica.

— No ritmo atual de investimentos, o serviço de água e esgoto só vai ser acessado pelo total da população em 2070 — afirmou.

Planejamento é necessário, mas isso que foi exibido ontem não foi planejamento.

A Constituição estabelece que seja feito, e passe pelo Congresso, o Plano Plurianual, e determina que ele não coincida com o período de mandato, exatamente para que não haja a paralisia que Lula teme que ocorra no ano que vem. O Plano atual vai até 2011. Claro que existem obras que não podem ser concluídas no período de quatro anos — ou oito —, mas não é razoável apresentar uma lista gigante de projetos que tomariam o próximo governo inteiro, a menos que fosse um programa de governo de candidato.

O empenho para pagar parte da festa saiu ontem no Diário Oficial. A empresa Swot, serviços de festas e eventos, receberá R$ 170 mil.

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